O presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) considera que “não faz sentido” alargar a prescrição dos crimes de abuso sexual de menores para 30 anos, como defende a presidente do Instituto de Apoio à Criança (IAC), Dulce Rocha, em entrevista à Renascença.
Na reação, Adão Carvalho considera que é demasiado tempo, com todas as consequências, certamente, para a própria justiça.
“É muito tempo, não sei se até para a própria vítima, estar a fazer uma investigação 30 anos depois, se terá algum efeito positivo ou útil para a própria”, afirma.
Do ponto de vista de quem cometeu o crime, considera igualmente “muito tempo.
“Evidentemente que é muito tempo. Se a pessoa, entretanto, não cometeu outros factos da mesma natureza, e dentro do nosso princípio que existe da ressocialização, da pena ter aqui algum efeito útil, entendemos que não faz sentido ao fim de 30 anos sem que tenha existido qualquer ação sobre essa pessoa”, argumenta.
O presidente do SMMP vai mais longe e alude à dificuldade de fazer prova, bem como à reparação do dano.
“Quanto maior o tempo decorrido dos factos mais difícil é a prova, mais difícil também aquela valoração da credibilidade dos depoimentos, 30 anos após os factos, é muito difícil. Até em termos de prova seria difícil uma investigação começar 30 anos após os factos com algum resultado útil”, acrescenta Adão Carvalho.
O magistrado lembra ainda a necessidade de existir um código penal equilibrado em relação a outros crimes previstos.
“Tem de existir um equilíbrio nos prazos de prescrição entre os crimes que estão em causa, em totalidade dos crimes. Não podemos ter um prazo de 30 anos para os crimes sexuais e depois temos um crime de homicídio que tem um prazo máximo de 20 anos”, recorda.
Também do ponto de vista constitucional, menciona, “não sei se esse alargamento do prazo de prescrição para os crimes sexuais, eventualmente, em termos de proporcionalidade não colidiria com princípios constitucionais”.
Adão Carvalho alerta para a existência de uma linha que não pode ser ultrapassada, já que vítimas e agressores têm garantias.
“O nosso sistema tem de ter em atenção a vítima, claro que sim, isso nunca pode ser esquecido, mas tem de ver que efeito útil tem em relação ao agressor, não é? Qual o sentido de estar a persistir, em 30 anos após os factos”, sublinha.
Apesar de tudo, o presidente do SMMP admite a possibilidade de aumentar a idade até à qual não prescrevem os crimes de natureza sexual contra menores, atualmente, fixado nos 23 anos.
“O que nós podemos falar e discutir é, eventualmente, se este prazo dos 23 anos que o legislador assim o entendeu, possa eventualmente ser alargado, dar qui mais algum tempo. São cinco anos após a maioridade e a pessoa depois poderá já ter mais discernimento e capacidade para avaliar esse direito de exercer a ação penal”, conclui o magistrado.