Ascensão meteórica e tombo. História dos 544 dias de Bruno Lage no Benfica
01-07-2020 - 15:25

Um reinado de menos de ano e meio, coroado com a conquista do campeonato e muitos recordes, positivos e negativos.

Bruno Lage deixou de ser, na terça-feira, treinador do Benfica. Um reinado que durou menos de um ano e meio, mas que foi coroado com a conquista do campeonato e muitos recordes - positivos e negativos.

Tudo começou após a goleada (5-1) sofrida em Munique, frente ao Bayern, na Liga dos Campeões. Rui Vitória esteve por um fio, o treinador da equipa B do Benfica foi badalado para o lugar, no entanto, no final de contas, "deu uma luz" a Luís Filipe Vieira, que decidiu que preferia manter o técnico principal até ao final dessa temporada.

A aposta começou por correr bem, contudo, pouco mais de um mês depois, o Benfica caiu com estrondo (2-0) em Portimão e ficou a sete pontos do FC Porto na classificação. À segunda foi de vez: Rui Vitória deixou o Benfica e rumou ao Al Nassr, da Arábia Saudita, e o treinador da equipa B substituiu-o interinamente. O nome? Bruno Lage.

Aos 42 anos, Lage tinha a oportunidade de uma vida. Antigo adjunto de Carlos Carvalhal no Sheffield Wednesday e no Swansea, entre 2015 e 2018, o técnico decidira regressar a Portugal para assumir o comando da equipa B do Benfica. O trabalho feito granjeou-lhe a subida à equipa principal como treinador interino. Contudo, o trabalho foi tal que o Benfica o promoveu a efetivo.

Desde o jogo do Portimonense, o último com Rui Vitória, e a partir da receção ao Rio Ave, o primeiro com Bruno Lage, o Benfica não mais perdeu para o campeonato, na época 2018/19.

Com João Félix, aposta firme do técnico, como figura de proa, foram 18 vitórias e um empate (que valeram a melhor segunda volta de sempre, com 16 vitórias e um empate, para um total de 49 pontos), incluindo triunfos em Alvalade e no Dragão, que permitiram recuperar a vantagem para o FC Porto e reconquistar o título de campeão nacional.

Além dos resultados, destacaram-se, por exemplo, o discurso discreto e cortês, com atribuição de louros aos jogadores ("Estão a fazer de mim treinador", disse após a vitória no Dragão), o lançamento de jovens da formação - além de João Félix, vendido por valor recorde de 120 milhões de euros, apostou em Florentino, Ferro, Jota e, já esta época, Nuno e Tomás Tavares - ou a recuperação de Adel Taarabt, agora protagonista.

Aposta segura ou repetição do risco?


Os méritos valeram renovação e aposta para a época seguinte, que começou com uma estrondosa goleada ao Sporting, por 5-0, na Supertaça. Apesar da euforia, Bruno Lage pediu reforços, que não chegaram.

Mattia Perin, guarda-redes escolhido para competir com Vlachodimos, era, afinal, crónico lesionado e foi devolvido à Juventus. Também não chegaram rivais para Grimaldo e André Almeida e Lage teve de recorrer à formação. Raúl de Tomás, super-reforço de 20 milhões de euros, foi "flop" (o Benfica conseguiu, no entanto, recuperar o investimento).

A queda da Liga dos Campeões, na fase de grupos, foi um dissabor inesperado, ainda que atenuado pela continuidade na Liga Europa.

A eliminação precoce da Taça da Liga, troféu menor no panorama nacional, foi camuflada pelo rendimento no campeonato. Apesar da derrota na Luz frente ao FC Porto, logo na terceira jornada, até à 20.ª ronda o registo era impecável: 18 vitórias em 17 jogos e vantagem de sete pontos sobre o rival.

O mercado de transferências de inverno trouxe o internacional português Dyego Sousa da China e mais um reforço de 20 milhões de euros: o alemão Julian Weigl, contratado ao Borussia Dortmund. Todavia, não mascararam os problemas da equipa, que ainda assim parecia ter tudo para ser bicampeã.

A visita ao Dragão mudou tudo. O Benfica tinha a possibilidade de alargar a vantagem sobre o FC Porto para 10 pontos, porém, cedeu na hora da verdade e perdeu por 3-2. A partir daí, nada foi igual para Lage.

Três dias depois, o Benfica cedeu um empate sensaborão em Famalicão, que ainda assim permitiu o apuramento para a final da Taça de Portugal. Logo a seguir, perdeu na Luz com o Braga, o que permitiu ao FC Porto recortar a distância, no campeonato, para apenas um ponto. Em dois jogos, o Benfica tinha deitado fora uma margem de seis pontos.

Ainda em fevereiro, no espaço de sete dias, o Benfica empatou na Ucrânia e perdeu em casa, caindo da Liga Europa aos pés do Shakhtar Donetsk, de Luís Castro.

Quatro empates consecutivos para o campeonato estragaram o trabalho feito até então e o Benfica deixou de depender de si próprio para vencer o campeonato - quando passava a depender, frustrava a oportunidade, como quando foi incapaz de bater o Tondela após a derrota do FC Porto em Famalicão.

A série de maus resultados - apenas duas vitórias em 13 jogos oficiais, pior registo de sempre a par da época do sexto lugar (2000/01), e cinco jogos sem vencer em casa, algo que não se via há quase 90 anos (1930/31), primeira derrota da história frente ao Santa Clara, e logo na Luz - culminou na queda (2-0) do Benfica no terreno do Marítimo, na jornada 29. Foi a machadada final na carreira de 544 dias de Bruno Lage na equipa principal do Benfica.

Números de Bruno Lage no Benfica

  • 544 dias (3 de janeiro de 2019 a 30 de junho de 2020)
  • 76 jogos
  • 51 vitórias (67%)
  • 12 empates
  • 13 derrotas

Recordes positivos de Bruno Lage no Benfica

  • 103 golos marcados na I Liga 2018/19 (igualou recorde de 1963/64)
  • 100% vitórias fora no campeonato em 2019
  • Melhor segunda volta de sempre: 16 vitórias e um empate (49 pontos)
  • Maior goleada dos últimos 50 anos (10-0 ao Nacional)
  • Mais rápido de sempre a chegar às 30 vitórias (32 jogos)
  • Mais rápido a chegar aos 100 pontos na I Liga (35 jornadas)
  • 18 vitórias consecutivas fora de portas
  • 16 vitórias consecutivas para o campeonato

Recordes negativos de Bruno Lage no Benfica

  • Cinco empates consecutivos
  • Cinco jogos sem vencer em casa (pior só em 1930/31 - sete)
  • Duas vitórias em 13 jogos (igual só em 2000/01)
  • Só em 1997 tinha sofrido quatro golos em casa para o campeonato