A Câmara do Porto nega ter mantido “fechada nos gabinetes” informações relativas a uma parcela que alegadamente é municipal e que integra o terreno onde a Selminho, empresa ligada à família do autarca Rui Moreira, pretende construir.
“Tal não é verdade”, refere a autarquia num curto comunicado, a propósito de uma informação dos serviços da Câmara que teria estado fechada nos gabinetes durante seis meses e que se reportava a terrenos associados à Selminho, empresa na qual Rui Moreira também detém uma participação.
Na sua edição desta quinta-feira, o “Público” escreve que um técnico superior da autarquia andou a estudar os direitos de propriedade dos terrenos onde a Selminho quer construir o empreendimento Calçada da Arrábida e chegou à conclusão de que uma parcela de 1.621 metros quadrados que integra a área apresentada para construção é, afinal, municipal, informação que “durante os seis meses que passaram desde a produção deste documento, a Câmara do Porto manteve reservada ao gabinete da Presidência e aos serviços jurídicos”.
Segundo o “Público”, a informação dos serviços da Câmara do Porto assinala que “a inclusão destas áreas em operação urbanística carece de prévio procedimento de desafectação do domínio público para registo na Conservatória do Registo Predial e cedência de ambas”.
Em resposta, a Câmara do Porto afirma que decidiu entregar no Ministério Público uma queixa-crime contra o jornal.
Reacções políticas
O caso tem motivado uma série de reacções por parte dos partidos políticos, com o movimento de apoio a Rui Moreira a sair em sua defesa.
O PSD exige que o presidente da Câmara do Porto clarifique a questão do terreno da Selminho, defendendo o património municipal ou demitindo-se, “por não reunir condições éticas e políticas para exercer o cargo”.
“Rui Moreira foi incapaz de defender os interesses patrimoniais do município como é a sua obrigação legal, ética e política. Ao contrário, Rui Moreira colocou à frente destes interesses os seus e da sua família, ao esconder da opinião pública que os terrenos supostamente da Selminho são, afinal, do domínio municipal, situação que era do seu conhecimento pelo menos desde Dezembro de 2016”, afirmou esta quinta-feira, em conferência de imprensa, o líder da concelhia do Porto do PSD, Miguel Seabra.
Manuel Pizarro, o vereador do PS que apoiava, até há poucos dias, Moreira, tinha dito que não existia nenhum “caso Selminho”, mas alega, agora, que com a informação que veio a público a situação é “muito diferente”.
“Neste momento, há uma dúvida sobre se a forma como o terreno foi adquirido [pela Selminho] é, ou não, legitima. Isto, que eu desconhecia, é uma situação diferente da anterior. Antes, o que havia era um conflito, como tantos outros, entre a Câmara e um privado relativamente aos direitos de construção num determinado terreno”, afirmou Pizarro à agência Lusa.
Questionado sobre se a informação lhe foi ocultada pela maioria liderada por Rui Moreira, a quem recentemente entregou o pelouro da Habitação, Pizarro disse não querer “fazer essa qualificação”, admitindo “que o processo estivesse a tramitar nos serviços competentes e que haja para isso uma explicação”.
Para além disso, Pizarro acredita “que os serviços [da autarquia] vão ser capazes de tratar deste assunto garantindo a defesa intransigente dos interesses da cidade” no caso da Selminho.
O Bloco de Esquerda também se manifestou, com Rui Semedo a criticar Moreira. “Não resta à autarquia e ao seu presidente outra alternativa que não seja declarar nulos e sem efeito todos os actos e decisões tomadas no processo Selminho durante o mandato de Rui Moreira, designadamente, o acordo de indemnização estabelecido entre os advogados da família de Rui Moreira e os advogados da Câmara por ele presidida”.
Em defesa de Rui Moreira saiu o seu movimento de apoio Rui Moreira: Porto, o Nosso Partido. O movimento nota que “durante 16 anos, e ao longo dos três mandatos camarários anteriores, a Câmara não deu conta da existência de um duplo registo de um terreno, dando como certo que a propriedade não era sua em várias instâncias”.
“Nesses 16 anos, a Câmara apreciou vários processos urbanísticos e litigou sobre o terreno em causa, no assunto conhecido como ‘Selminho’, sem nunca ter alegado a sua propriedade ou indagado sobre qualquer registo”, descreve o movimento.
Para os independentes, “a história que o ‘Público’ de hoje conta e elabora no seu editorial fundamenta-se em pressupostos errados, graves e porventura difamatórios”.
Os independentes destacam que foi “agora, na vigência do actual mandato” que “os funcionários camarários, actuando como lhes compete, terão identificado um erro, o que aconteceu há meio ano”, tendo “desde então decorrido várias diligências no sentido de salvaguardar os interesses patrimoniais da câmara”.
“Fizeram-no, naturalmente, sem nenhuma interferência do presidente”, refere o comunicado.
O movimento garante que Moreira “de nada beneficiou” e “será mais prejudicado se, porventura, ficar comprovado que o terreno é, afinal, propriedade do município”.
“A sua família comprou, há 16 anos, um terreno que tinha capacidade construtiva e hoje não tem. E Rui Moreira nunca usou a sua posição para reverter a situação, tanto mais que, repita-se, está prejudicado e não beneficiado”, vinca o movimento.