O chamado caso Cambridge Analytica alterou a forma como muitos de nós interagem com as redes sociais. As reações variam, naturalmente, entre o afastamento completo e um mais despreocupado ‘quero lá saber’, mas todas elas incorporam já, de alguma forma, a perceção de que se trata de um território em que a disputa pela nossa atenção agita interesses e altera enquadramentos de leitura sobre uma certa realidade.
A custo, empresas como o Facebook iniciaram um caminho de aumento da transparência dos seus processos e do seu modelo de negócio, abrindo-se (de forma ainda muito controlada) a investigações académicas e disponibilizando ferramentas que nos deixam ‘espreitar’ um pouco para dentro da enorme caixa negra.
O espaço Facebook Ad Library permite-nos escrever o nome de uma página e saber se os seus responsáveis gastaram dinheiro na promoção de publicações (o que lhes garante maior visibilidade junto de um grupo selecionado de utilizadores).
Quem se der ao trabalho de verificar os nomes dos partidos constantes no boletim de voto que vamos usar no dia 6 de outubro (há diferenças entre os círculos eleitorais mas para efeitos deste texto usei uma combinação entre os do Porto e Lisboa) cedo percebe que, entre março e setembro deste ano, o Bloco de Esquerda gastou mais de 14 mil euros em anúncios, quase o triplo da segunda força política mais gastadora, o Partido Socialista, com cerca de 4.800 euros. Em terceiro lugar nesta curiosa lista aparece a Iniciativa Liberal, com 2.745 euros gastos, seguido pela CDU, com 1.149. Antes do PSD – com um investimento de 350 euros nos últimos seis meses – ainda surge o Livre, com 420 euros. O CDS/PP é o oitavo partido, com 100 euros certos, atrás do Movimento Nós Cidadãos, com 102 euros gastos.
O que salta à vista, para além do investimento mais veemente do BE, será o quase descrédito nas virtudes deste mecanismo por parte de PSD e CDS (por contraponto à Iniciativa Liberal, por exemplo) e a ‘falta de comparência’ de forças como o PAN, Aliança, PCTP/MRPP e PNR, por exemplo.
Importará dizer que estes dados dizem apenas respeito às compras efetuadas pelos gestores das páginas oficiais e em nome delas; quase todos os partidos alimentam, naturalmente, uma rede muito mais alargada de páginas, através de grupos de militantes regionais ou locais ou através de estruturas de juventude. Há ainda, para além disso, a possibilidade de indivíduos (reais ou criados) promoverem publicações específicas de terceiros.
Nesse sentido, seria errado interpretá-los com representativos dos gastos reais de todas estas forças políticas com a ativação de ações em plataformas digitais. São, em todo o caso, informação adicional a que agora podemos ter acesso e dizem-nos, por exemplo, que – pelo menos através das suas páginas oficiais – os partidos portugueses ainda estão muito longe da postura determinada já comum noutras geografias e que pela primeira vez se identificou na campanha que levou ao poder Barack Obama, em 2009.