"Aquilo é só logística, foi só logística. Não, aquilo não foi só logística, não foi só uma folha de Excel e não era qualquer militar que fazia aquilo", afirmou esta manhã o almirante Gouveia e Melo, nas IV Jornadas de Defesa + Saúde Militar. Perante uma plateia de participantes na Fundação Gulbenkian, o almirante acrescentou que a "task force" que comandou, criada para a vacinação, tinha "mais dois ou três indivíduos no planeamento do processo de vacinação".
Um planeamento feito ao detalhe, "desde o início de novembro", e que por ter sido seguido á risca levou ao "sucesso no processo de vacinação". O almirante recordou mesmo que na primeira apresentação ao governo, logo depois de ser o coordenador da "task force", "de ter abordado quatro grandes tópicos, e um deles era a moldagem psicológica do campo de batalha. E a sensação que tive é que ninguém estava a perceber o que estava a dizer".
Com o tempo, diz, "e logo que apareci fardado, de camuflado", perceberam qual era o significado de moldar o campo de batalha, "que foi essencial para a vitória".
"Eu hoje, quando às vezes vejo certos comentadores falarem sobre o processo de vacinação passado este tempo, dá a sensação de que há uma tentativa ou uma vontade de menorizar o papel que as Forças Armadas tiveram nesse processo. Essa menorização é muito injusta, muito injusta. As Forças Armadas foram essenciais nesse processo. Nós somos os mentores e os criadores de uma célula de coordenação de emergência dentro do próprio Ministério da Saúde", acrescentou.
Não dá mais entrevistas até pendurar o uniforme
Farda ajudou no processo de vacinação
Voltando ao tema do processo de vacinação que liderou, lamenta o que diz ser a "incapacidade de se aprender" com o que se passou.
"Incapacidade de nós, no futuro, se tivermos outra vez nessa situação, começarmos de um patamar melhor do que daquele que começámos quando este processo aconteceu. E, portanto, minha última mensagem para a discussão é o que é que nós temos que fazer para que, no próximo processo, em que todas estas componentes da nossa sociedade tenham que ser envolvidas, ele seja mais rápido e mais fácil de organizar".
Gouveia e Melo garantiu também que os militares chegaram a ter de combater interesses instalados durante o processo de vacinação, referindo-se a "muitas capoeiras com muitos galos". Mas o então coordenador da "task force” também sublinhou que a autoridade da farda ajudou.
Gouveia e Melo, que tinha começado por considerar que não concordava com a separação entre militares e sociedades, porque "a sociedade civil militar não existe".
"Nós somos parte da sociedade e uma componente que foi útil e sendo útil, foi usada, e com sucesso. E graças a Deus, hoje podemos estar todos aqui sem nenhuma vergonha e dizer que fomos uteis quando o país precisou de nós".
Aqui, sublinha "alguma ingratidão" para com atores "muito importantes do processo". Sem os autarcas "o processo de vacinação não tinha tido o sucesso que teve".
Para muito contribuiu também a noção da responsabilidade e poder sobre a vacinação.
"Quando falei com a Ministra da Saúde da altura para liderar o processo de vacinação, perguntei de forma muito clara quem era o responsável pelo processo de vacinação. Disse-me que seria eu. Perguntei depois quem teria o poder sobre o processo de vacinação, e ficou um bocadinho confusa. Expliquei depois que para os militares, responsabilidade é igual a poder e poder igual a responsabilidade. Se quiser reter qualquer das responsabilidades, tem o poder respetivo. Se quiser o poder tem de ter responsabilidades. Não pode é passar responsabilidades e ficar com o poder, porque isso vai correr mal. E nós (militares) não vamos à televisão responsabilizarmo-nos, quando o poder de decisão não é nosso", revelou Gouveia e Melo, que recorda outro episódio, passado uma semana.
"Liga-me a assessora de imprensa da Sra. Ministra, a perguntar se podia dar dez pontos defensivos para poderem usar na comunicação social. Eu disse que não sabia do que estava a falar, porque era submarinista e só sabia atacar. Mas já agora, como nós estamos com as mãos no volante, não ponha as suas mãos no volante porque atrapalha a condução".
Gouveia e Melo tem sido apontado como possível candidato à Presidência da República, mas o próprio ainda não o confirmou. Mas já comunicou ao Conselho do Almirantado que está indisponível para continuar mais dois anos na chefia do Estado-Maior da Armada, cujo mandato termina este mês. Até que saia das Forças Armadas não dará mais entrevistas, como esta manhã anunciou.
[Notícia atualizada às 12h31 de 5 de dezembro de 2024 para acrescentar mais detalhes]