​Mattos Chaves. O candidato sem “tropas, exército ou generais” que quer liderar o CDS
07-03-2022 - 18:00
 • Tomás Anjinho Chagas

É um dos dois candidatos à liderança do CDS. Miguel Mattos Chaves critica o adversário Nuno Melo e garante que meio milhão de euros de passivo do partido não o assusta.

Miguel Mattos Chaves é vogal da comissão política nacional do CDS, foi candidato à Câmara Municipal da Figueira da Foz por duas vezes e agora quer ser candidato à presidência do partido.

Para isso, já tem as 300 assinaturas necessárias. O pré-candidato recebeu a Renascença no Caldas, a sede nacional do CDS, em Lisboa, onde, na próxima semana, irá apresentar oficialmente a candidatura.

Nesta entrevista explica que quer uma clarificação de ideias, acredita que o partido deve tentar recuperar o eleitorado que já foi seu e não deve virar-se para novas causas. Mattos Chaves critica ainda a oposição de Nuno Melo durante o mandato de Francisco Rodrigues dos Santos e fala num antigo líder que tem “mexido os cordelinhos” na “sombra”, referindo-se a Paulo Portas.

Mattos Chaves defende ainda que, financeiramente, o partido deve ser gerido como uma empresa e exclui a hipótese de o CDS sair da sede do Caldas.


É agora candidato à liderança do CDS, imagino que não se reveja na candidatura de Nuno Melo?

[Risos] Se me revisse não era candidato, portanto, não. Acho que tem de haver uma alternativa porque a candidatura que refere passou dois anos a denegrir a imagem do partido, mais do que da própria direção. Tem de haver uma clarificação das águas e tem de haver uma clarificação de políticas e propostas para os conservadores e democratas-cristãos, que neste momento estão órfãos.


O que é que critica mais nesta candidatura de Nuno Melo? A forma como fez oposição durante o mandato de Francisco Rodrigues dos Santos ou o facto de ter defendido que o partido tem de abraçar novas causas como o ambiente ou a igualdade de género para conseguir o voto dos mais novos?

Um partido conservador e democrata-cristão não vive de ‘soundbites’. Os ‘soundbites’ são bons em campanha para despertar a atenção, sobretudo dos media, porque muitos dos eleitores não gostam deles.

Eu não ando aqui em ‘soundbites’. Estou aqui para refundar o partido. O que temos de fazer para o refundar?

Temos de dizer muito claramente aos portugueses, de direita, de esquerda ou de centro, o que é que nós defendemos. Que valores, que referências, que programa e que medidas concretas de alternativa ao poder instituído, podemos apresentar aos portugueses. Para que os portugueses tenham realmente uma escolha.

Portanto, esses ‘soundbites’ do ambiente e das ideologias de género, isso é tudo muito engraçado. Mas nós temos de ver em que é que isso corresponde aos valores dos conservadores e democratas-cristãos e adequar essas mensagens aos novos tempos. Mas tendo em atenção que nos dirigimos ao nosso eleitorado, não nos dirigimos à esquerda, não queremos fazer jeitos à esquerda, nem concordar com a esquerda.

Se começarmos a querer concordar com todos, que é o que essa candidatura [Nuno Melo] faz, o CDS não tem razão de existir. Porque para isso, há outras alternativas mais instituídas e mais claras.

Nós temos de ser muito claros e pragmáticos, de forma a que, sem nenhum desprimor para nenhuma mulher-a-dias, até a mulher-a-dias entenda o que é que nós defendemos. Depois as pessoas optam. Ou por nós ou pelos outros.


Como é que pretende refundar este partido, agora sem representação parlamentar e com maiores dificuldades de chamar a atenção da comunicação social?

O partido, por erros próprios, perdeu a sua representação parlamentar. Mas o CDS não é um partido qualquer, é um partido fundador da democracia portuguesa. Estivemos na [Assembleia] Constituinte, estivemos nas Assembleias da República até agora. Eu chamo a isto um interregno de refundação.

A culpa é nossa porque andámos a transmitir mensagens erradas ao eleitorado. Quisemos agradar a todos, e quando assim é, não se agrada a ninguém.

Não só alienámos o nosso eleitorado tradicional, como não fomos buscar mais nenhum. Há que clarificar as ideias, assentá-las muito bem. Quem gosta, gosta, vota em nós. Quem não gosta, vota noutros.

Acredita que isso foi uma estratégia do partido em geral ou aponta diretamente a Francisco Rodrigues dos Santos? Ou ao portismo no partido? Ou a fatores externos, como a ascensão do Chega e da Iniciativa Liberal?

Não gosto de pessoalizar as questões. Houve erros cometidos desde 2011, muitos. Digamos que esta última direção talvez tenha sido a menos culpada nesta matéria.

Para fazer passar a mensagem, nós temos consciência que a comunicação social liga mais aos partidos que estão no Parlamento do que àqueles que não estão. Faço um apelo à comunicação social, porque vivemos num país democrático e o CDS não é um partido qualquer.

Mas sobretudo aquilo que vamos ter de fazer é falar com cada um dos portugueses. Vamos ter de percorrer Portugal de lés a lés, falar com as pessoas, explicar-lhes o que pensamos e qual o nosso posicionamento muito claro.

O posicionamento, claro, começa por um chavão, que se não for traduzido em medidas concretas não vale nada, que é: nós somos um partido de direita. Não há partidos do centro. Isso é uma mentira que foi inculcada na população, veiculada por órgãos de informação. O centro político não existe, é uma inexistência na Ciência Política. O PSD nunca foi de direita, só em Portugal é que um partido social-democrata é apelidado de direita.

Isto é um dos principais erros de transmissão de mensagem do CDS. Boa parte do eleitorado do PSD intitula-se de direita, mas os dirigentes nunca foram de direita, aliás o Dr. Rui Rio ainda há pouco tempo o clarificou.

Os sociais-democratas e a social-democracia, por definição, é de esquerda.


André Ventura tem-se encontrado várias vezes com o líder do Vox Santiago Abascal. Sente que era o CDS que devia estar a fazer esse papel ou o CDS deve manter-se para Portugal como o PP está para Espanha?

Eu não falo de outros partidos. Quais são os nossos interlocutores internacionais? O PP espanhol, o Partido Conservador inglês, o Partido Republicano americano, o Partido Republicano francês. Portanto, são esses os partidos da nossa área política com quem nós temos de trabalhar e estreitar relações, o que também, estranhamente, nunca foi feito. Também tenciono fazê-lo.

Uma aliança do CDS com o Chega é um cenário que admitiria?

[Ri-se] Eu neste momento estou preocupado em recuperar a representação parlamentar do CDS.

Sou contra coligações partidárias, sou favorável, quando muito, a acordos de incidência parlamentar. Os partidos mantêm a sua autonomia política, fazem acordos de incidência parlamentar e deixam governar quem ganhou as eleições.

Quando nós estamos a prometer coligações pré-eleitorais, o que é que estamos a dizer ao eleitorado? Ah, nós e eles, mais ou menos, é a mesma coisa. Tanto faz votarem em nós ou votarem neles, e isso prejudica os partidos mais pequenos.

Recuando um pouco, nós entrámos para a AD [Aliança Democrática], com Sá Carneiro, Freitas do Amaral, Ribeiro Telles, com 42 deputados. Saímos da AD com nove deputados. Isso deveria ter dito qualquer coisa.

Ninguém gosta de votar no Cova da Piedade se pode votar no Benfica, no Porto ou no Sporting. Ninguém vai para os pequeninos. Ou nós temos ideias concretas e autónomas, ou não temos razão de existir.

Existir para fazer coligações pré-eleitorais é dizer ao eleitorado: nós somos iguais aos outros, negociámos aqui umas coisas, mas sobretudo, negociámos uns lugares de ministros e secretários de Estado, para falar verdade. Porque eu não tenho paciência para andar com hipocrisias.

Miguel Mattos Chaves, olhando outra vez para a sua candidatura, que nomes do CDS tem a seu lado? Que figuras do partido é que tem para estarem a seu lado se vencer as eleições?

Neste momento não tenho nem tropas, nem exército, nem generais. Tenho-me a mim próprio. E tenho sobretudo militantes anónimos, que alguns deles nem tenho o prazer de conhecer pessoalmente.

Alguns deles têm escrito em mensagens privadas, emails e em telefonemas, que me têm incentivado a avançar. Já houve um ou outro que quis vir apoiar-me publicamente. Quem quiser apoiar a minha candidatura será muito bem-vindo, porque eu vou precisar de todos.

Nesta reconciliação e nesta fase do partido, onde gostaria de ver antigos líderes como Paulo Portas e Manuel Monteiro?

O Manuel Monteiro será uma pessoa a quem pedirei bastante ajuda e conselho. Também ao Dr. Ribeiro e Castro. Quanto aos outros não sei, porque afastaram-se. Um [Paulo Portas) na sombra tem mexido os cordelinhos das coisas. Vocês sabem melhor do que eu, escusamos estar aqui a fingir que não sabemos.

A outra senhora, afastou-se pura e simplesmente. Não sei se está ativa nos corredores da sombra. Não sei nem quero saber. Serão todos bem-vindos aqueles que vierem honestamente e lealmente batalhar pelo CDS, não é pelos seus postos. Não é para serem ministros, secretários de Estado, conselheiros nacionais ou coisa que o valha. É para trabalhar para restaurar e refundar o partido. Todos eles serão bem-vindos, mas que venham sem jogadas de bastidores e corredores. Mas que venham honesta e lealmente trabalhar em prol do partido.

Já fez as contas à dívida financeira total do CDS? Como é que pretende inverter a situação? Como é se pagam salários? Tem alguma visão para resolver o assunto?

Eu faço política nas horas vagas. A minha profissão é gestor de empresas. Se eu já tive passivos de 15 milhões de euros em empresas para resolver, não é um passivo de meio milhão de euros que me assusta, como deve calcular. Já as outras candidaturas não sei se têm saber para isso, porque sempre viveram da política, nunca estiveram nas empresas.

Eu tenho uma equipa de técnicos. Já estamos debruçados sobre isso, sabemos como havemos de restaurar as finanças do partido. Havemos de pagar à banca e aos fornecedores e manter os postos de trabalho que forem necessários. Não estou a dizer que vou despedir as pessoas todas, nem pensar. Vou ver caso a caso, segundo o organigrama de funções que for necessário para pôr o partido a funcionar, todos esses ficarão. Os que estiverem a mais, terá de ser negociada a sua saída, como em qualquer empresa.

No caso da gestão financeira, isto não é mais do que uma empresa: tem receitas, tem despesas e há que alocar cada verba à sua rubrica.

E nesse corte de custos, sair do Caldas, onde estamos neste momento, era uma das opções?

Para mim, a Sede do Caldas é um símbolo do partido tal como a bandeira ou como o hino. Como o programa ou os valores e as referências.

Isso é uma coisa que surgiu na comunicação social por causa de um colega nosso do partido, ainda por cima. Eu acho que isso é lamentável. No dia em que nós fechássemos esta sede, era um dos símbolos do CDS que desaparecia.

Não podemos cometer erros desses. Em troca de quê? Uma renda de 1.200 euros, que não dá para alugar uma sala aí num prédio moderno? Só pode ser brincadeira, ou lá está, pessoas que nunca trabalharam na vida ativa, que estiveram sempre ligadas à política, e que depois dizem essas coisas da boca para fora. Coisas que a comunicação social gosta muito, porque são ‘soundbites’, mas que é um disparate completo, perdoem-me a franqueza.

Vai fazer campanha para a repetição do voto dos emigrantes da Europa? Vai andar no terreno? Acha que há hipóteses para eleger a candidata do CDS?

Vou-lhe fazer uma confidência: eu fui convidado para cabeça de lista do círculo da Europa. Pedi escusa ao presidente do partido para recusar esse convite porque achei que não tinha condições para o fazer.

Um candidato ao círculo da Europa o que é que tem de fazer? Tem de ir a Inglaterra às associações de emigrantes. À Suíça, ao Luxemburgo, a França, à Alemanha. Tem de ir ao sítio onde os nossos emigrantes estão, para que eles possam sentir-se, primeiro, tentados a irem ao consulado votar, alguns deles têm de fazer 200 ou 300 quilómetros para o fazer. Segundo, dizer-lhes muito concretamente que podem acreditar em nós.

Nós aqui no partido nunca fizemos esse tipo de campanhas. Eu não tinha condições para o fazer porque isso implica muito dinheiro. Sabendo eles, os emigrantes, que o PS já tem maioria absoluta. Sabendo que o PSD, mais um ou outro deputado... bem. Sabendo que nós perdemos a representação parlamentar.

Estar a fazer uma campanha que não seja a custo zero, através das redes sociais ou pelos orgãos de informação, estar a gastar dinheiro nisso seria uma irresponsabilidade. Mais a mais com a nossa situação.