A diocese de Setúbal garante que o seu adminsitrador diocesano, padre José Lobato, “nunca recebeu, para a realização de uma entrevista, qualquer contacto da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa”.
Em comunicado, a diocese reage, assim, às “notícias que têm sido veiculadas, referindo-se à ausência ou recusa de resposta do Administrador Diocesano de Setúbal à Comissão Independente”.
O Relatório Final divulgado pela Comissão indica que foram endereçados dois convites para uma reunião, o primeiro a 25 de fevereiro de 2022 e o segundo a 17 de março de 2022, mas as datas coincidiram com a mudança de D. José Ornelas para a Diocese de Leiria-Fátima, para a qual foi nomeado a 28 de janeiro.
Até à tomada de posse, a 13 de março, D. José “governou interinamente a Diocese de Setúbal, tendo recebido os dois convites da Comissão Independente: um na qualidade de Administrador Diocesano de Setúbal (em fevereiro) e outro na qualidade de Bispo de Leiria-Fátima (em março)”. Já o padre José Lobato só foi nomeado administrador diocesano de Setúbal a 14 de março, mas nunca recebeu um pedido para ser entrevistado.
Segundo a diocese sadina, a Comissão Independente já reconheceu que não se tratou se uma recusa formal, mas de um problema na forma como a informação circulou. "Falando com Ana Nunes de Almeida, membro da Comissão Independente, concluiu-se que houve certamente uma falha de comunicação neste tempo de transição, afirmando a socióloga não ter havido qualquer indício de recusa do padre José Lobato em ser entrevistado”, assegura o comunicado da diocese divulgado esta quinta-feira.
Situação diferente foi a do acesso aos Arquivos Diocesanos. Nesse caso, “os contactos do Grupo de Investigação” foram já feitos com o padre José Lobato, que “recebeu o grupo de historiadores em Setúbal por duas vezes, abrindo totalmente os arquivos para que pudessem levar a cabo o seu trabalho”.
Já o bispo de Beja assegura à RTP que respondeu às perguntas da Comissão Independente por escrito, no passado mês de outubro.
De acordo com a televisão pública, D. João Marcos garante que até acrescentou mais casos suspeitos aos que tinham sido enviados pela própria comissão.
Igreja não fala a “uma só voz”
O Relatório Final da Comissão Independente critica a atuação de vários bispos na forma como receberam e contactaram com os investigadores, identificando duas dioceses onde não obtiveram respostas: a de Beja, e a de Setúbal, mas ambos os casos foram agora desmentidos: Setúbal diz que o administrador diocesano não recebeu qualquer convite para a entrevista, o bispo de Beja garante que respondeu por escrito.
No documento divulkgado esta semana, os membros da Comissão Independente explicam que quiseram ouvir “os atuais líderes” da Igreja (bispos no ativo e superiores ou superioras gerais de Institutos Religiosos), para entenderem “o modo como exercem e como pensam, e o seu papel” na Igreja. Mas, sublinham, rapidamente se aperceberam de que esta “não falava, implícita ou explicitamente, a uma só voz”.
As entrevistas foram realizadas, à exceção de uma, por dois membros da Comissão, a maioria por Zoom, e foram registadas reações diversas. Houve casos em que sentiram uma relativização do problema dos abusos, e mais preocupação com os danos na instituição e nos sacerdotes do que com as vítimas. Alguns bispos chegaram a censurar as iniciativas da Comissão, e houve um que não aceitou bem o pedido para que divulgasse o apelo ao testemunho no site da respetiva diocese.
O relatório refere, ainda, a “desorganização” em que foram encontrados muitos dos arquivos históricos das dioceses, com indícios de que em alguns a informação poderá ter sido “expurgada”.
A contrastar com o panorama encontrado ao nível dos responsáveis da CEP, a Comissão Independente diz que algumas congregações religiosas pertencentes à Conferência dos Institutos Religiosos de Portugal (CIRP) “foram claramente mais responsivas” ao pedido de divulgação do apelo ao testemunho das vítimas.
O Serviço de Escuta dos Jesuítas é elogiado como “caso único”, já que “antes de ser contactado pela Comissão Independente, felicitou-nos e declarou, nos primeiros dias da nossa existência, a sua disponibilidade total para colaborar”.
[notícia atualizada às 14h15]
Se foi vítima de abuso ou conhece quem possa ter sido, não está sozinho e há vários organismos de apoio às vítimas a que pode recorrer:
- Serviço de Escuta dos Jesuítas, um “espaço seguro destinado a acolher, escutar e apoiar pessoas que possam ter sido vítimas de abusos sexuais nas instituições da Companhia de Jesus.
Telefone: 217 543 085 (2ª a 6ª, das 9h30 às 18h) | E-mail: escutar@jesuitas.pt | Morada: Estrada da Torre, 26, 1750-296 Lisboa
- Rede Care, projeto da APAV, Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, que “apoia crianças e jovens vítimas de violência sexual de forma especializada, bem como as suas famílias e amigos/as”.
Com presença em Lisboa, Porto, Coimbra, Braga, Setúbal, Santarém, Algarve, Alentejo, Madeira e Açores.
Telefone: 22 550 29 57 | Linha gratuita de Apoio à Vítima: 116 006 | E-mail: care@apav.pt
- Comissões Diocesanas para a Protecção de Menores. São 21 e foram criadas pela Conferência Episcopal Portuguesa.
São constituídas por especialistas de várias áreas, recolhem denúncias e dão “orientações no campo da prevenção de abusos”.
Podem ser contactadas por telefone, correio ou email.
Para apoiar organizações católicas que trabalham com crianças:
- Projeto Cuidar, do CEPCEP, Centro de Estudos da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica
Se pretende partilhar o seu caso com a Renascença, pode contactar-nos de forma sigilosa, através do email: partilha@rr.pt