O discurso do Estado da União foi, segundo vários analistas, uma eficaz rampa de lançamento para a campanha de reeleição do Presidente dos EUA, Joe Biden, pela forma assertiva como promoveu o seu projeto político.
Na quinta-feira à noite (madrugada de sexta-feira em Portugal), em Washington, Biden fez o discurso do Estado da União, com uma mensagem de aviso sobre os riscos que correm a liberdade e a democracia, ameaçadas dentro e fora de fronteiras dos Estados Unidos, aproveitando o evento para atacar o seu putativo adversário republicano, Donald Trump.
Muitos analistas elogiaram a forma como Biden não teve receio em abordar o tema da sua idade, 81 anos, no momento em que muitos eleitores receiam que o líder democrata seja demasiado velho para encarar um segundo mandato. Em vários momentos do discurso do Estado da União, Biden falou do assunto e aproveitou-o para salientar a sua experiência política de várias décadas, assinalando que também o seu adversário - que ele nunca mencionou pelo nome, mas apenas e por 13 vezes como seu "antecessor" - pertence à mesma geração, mas tem características substancialmente diferentes.
Ana Isabel Xavier, professora e investigadora de Política Internacional, considera que Biden passou também no teste de mostrar vitalidade e energia na forma como proferiu o discurso, procurando contrariar a ideia de que é um político em fim de linha.
"O discurso, de forma unânime, foi considerado muito enérgico e ativo, em que Biden disse que o problema não é a idade dos candidatos, mas a idade das ideias, numa alusão a Donald Trump e às suas ideias antiquadas", explicou Ana Isabel Xavier.
Os analistas também destacaram a forma como Biden conseguiu tirar proveito de alguns dos temas que deverão marcar a campanha para as eleições presidenciais de 5 de novembro, nomeadamente a imigração, a inflação e o acesso à interrupção voluntária da gravidez.
"Num discurso com vários momentos de 'cuspidor de fogo', fiquei impressionado com o tom equilibrado de Biden ao declarar que aqueles que lutaram para derrubar Roe v. Wade iriam aprender uma lição sobre o poder das mulheres", disse o analista e cientista político norte-americano Binyamin Appelbaum, referindo-se à jurisprudência que foi quebrada recentemente pelo Supremo Tribunal, que determinou atribuiu aos governos estaduais o controlo da legislação sobre o acesso ao aborto.
Também Michelle Cottle, analista política do jornal The New York Times, elogiou a forma como Biden conseguiu vitimizar-se, em vários pontos do discurso, deixando nas mãos dos republicanos - e na forma como seguem as teses mais radicais e conservadoras de Trump - a responsabilidade pelo bloqueio das soluções para vários problemas que preocupam os norte-americanos.
"Biden colocou pressão, atingindo repetidamente os republicanos por seguirem Trump por um caminho desaconselhável. O meu momento favorito foi quando conseguiu repreendê-los por terem destruído o acordo bipartidário de segurança fronteiriça", escreveu Cottle, lembrando o episódio em que um telefonema do ex-presidente para o Capitólio foi o suficiente para demolir a tentativa de encontrar um plano bipartidário.
Também o analista Tyler Pager destacou a forma como Biden usou o discurso como arma de ataque contra os republicanos mais conservadores, acusando-os de serem "uma ameaça aos direitos individuais, à liberdade e à democracia", ao mesmo tempo que lembrou a forma como Trump está a desguarnecer a relação com os aliados externos.
"Ao contrário de um discurso tradicional sobre o Estado da União que consiste numa longa lista de objetivos políticos, Biden começou a atacar Trump menos de quatro minutos após o início do seu discurso, criticando-o por sugerir que encorajaria a Rússia a 'fazer o que quiser' dos aliados da NATO'", defendeu Pager.
Deirdre Walsh, vice-presidente executiva para assuntos estratégicos e de governação do movimento Arca, considera que o grande trunfo de Biden neste discurso foi a forma como conseguiu identificar os pontos essenciais de campanha, com que tenciona procurar voltar a derrotar Trump.
"O presidente debruçou-se sobre as questões que motivam a sua base eleitoral, como o aborto e o controlo de armas, bem como os aumentos de impostos sobre os ricos. Mas também tentou desafiar os republicanos na Câmara de Representantes - e Trump fora desta - em questões como as fronteiras e o crime, áreas onde enfrenta o ceticismo de muitos eleitores independentes e eleitores suburbanos", argumentou Walsh.