O Tribunal de S. João Novo, no Porto, começou esta segunda-feira a julgar a cabeleireira Inês Pereira pelos crimes de fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais com os quais terá lesado o Estado em 1.8 milhões de euros.
Segundo acredita o Ministério Público, Inês Pereira, juntamente com o marido, a filha e o filho, que também estão a ser julgados, é suspeita de se ter organizado "ao longo de anos de atividade de forma a concretizarem esquemas para a não declaração de rendimentos, que visaram unicamente a omissão contabilística e fiscal de parte substancial dos rendimentos obtidos nas diferentes lojas do grupo".
Ao todo, o processo tem 16 arguidos, entre funcionários do grupo, ex-funcionários, sociedades empresariais e pessoas ligadas à família da cabeleireira.
Nesta primeira sessão do julgamento, Inês Pereira, o agora ex-marido, Fernando Pereira, a filha, Inês Catarina Pereira e o filho, Ricardo Pereira, não quiseram prestar declarações, ao contrário dos restantes arguidos que optaram por prestar depoimento.
Ao Tribunal, uma das arguidas e ex-rececionista numa das lojas de Inês Pereira, explicou como funcionava o registo a e apuramento do trabalho diário dos cabeleireiros: "Em 2014 quando regressei à loja da Boavista foi-me explicado que tinha que colocar num envelope uma ficha de caixa com tudo o que fosse pago por multibanco e com tudo pelo qual pedissem faturas, e num outro envelope uma ficha com tudo o que fosse pago em dinheiro e não tivesse sido pedida fatura ", explicou Vera Lúcia, ex-funcionaria do grupo entre 2001 e 2019.
Outra ex-rececionista, Cátia Vieira, que trabalhou para Inês Pereira entre 2007 e 2021, explicou que também ela seguia aquele esquema: "No início não era assim, depois começou a ser. Antigamente registávamos tudo, depois tudo o que fosse pago em dinheiro e sem número de contribuinte era para ser separado", disse.
As duas arguidas referiram igualmente que os envelopes com as folhas de caixa e o dinheiro eram "entregues a membros da família que iam buscar os envelopes às lojas ou a alguém dos escritórios".
Questionadas sobre se lhes era pedido que desligassem os terminais de pagamento por multibanco, Vera Lúcia respondeu que a ela nunca lho foi pedido, enquanto Cátia Vieira afirmou que sim e com alguma regularidade.
"Acho que seria para que os serviços fossem pagos em dinheiro", disse.
A sessão desta tarde ficou ainda marcada pelo testemunho de um casal, de cujo filho Inês e Fernando Pereira são padrinhos: "O Fernando pediu-me para abrir uma conta (...) eu assinei tudo sem pensar. Eu não tinha acesso à conta, assinei mesmo cheques em branco e abri atividade a pedido do Fernando", relatou Florinda Vieira.
No entanto, referiu, cerca de cinco meses depois de ter aberto aquela conta, foi contactada pelas Finanças para esclarecer a discrepância entre os valores declarada em sede de IRC e os valores que circulavam pela conta, valores esse que chegaram perto dos 200 mil euros.
"Fui às Finanças e fiquei a saber que tinha uma dívida de 60 mil euros", disse a arguida, que explicou que o valor não foi pago, embora tenha havido planos prestacionais e pagamentos por conta, feitos com montantes que "alguém no escritório" ou a própria Inês Pereira entregava à arguida e ao marido para o efeito.
Inês Pereira abriu o primeiro salão em 1982, tendo agora vários salões no Porto (Foz, Boavista, Rua da Firmeza, Arrábida Shopping, Norte Shopping, Parque Nascente, El Corte Inglês) e ainda em Guimarães.
A próxima sessão do julgamento está marcada para dia 11 de outubro, sessão na qual serão ouvidos os restantes arguidos e as testemunhas.