CDS. Moção de confiança vai ser decidida "voto a voto"
05-02-2021 - 23:53
 • Paula Caeiro Varela , Susana Madureira Martins

Apoiantes de Adolfo Mesquita Nunes "a dar tudo apesar da vantagem da Casa” no Conselho Nacional que se reúne este sábado para discutir e votar a moção de confiança a Francisco Rodrigues dos Santos.

O jogo das moções de confiança nas lideranças partidárias está sempre feito para “a Casa ganhar”.

Os apoiantes de Adolfo Mesquita Nunes reconhecem isso, os apoiantes de Rodrigues dos Santos também. É assim e todos conhecem as regras, desde logo porque quem manda controla as estruturas partidárias, que têm inerência no Conselho Nacional.

Quem quer mudar, tem de correr mais. Quem quer Adolfo Mesquita Nunes à frente do CDS, garante que é o que está a ser feito nos últimos dias.

Estão "a dar tudo para ganhar” este sábado na reunião do Conselho Nacional do CDS, que vai discutir a moção de confiança à direção de Francisco Rodrigues dos Santos.

Mesmo com as hipóteses desfavoráveis, de um lado e de outro, são vários os protagonistas do CDS que garantem à Renascença que a previsível vitória de Francisco Rodrigues dos Santos será por pouco: "nunca poderia ser menos de 75-80, mas dificilmente será acima de 60-40, ou até menos", garante fonte próxima da direção do partido.

Um destacado dirigente centrista diz à Renascença que, mesmo sem falar com os mediadores, que por estes dias tentam convencer os conselheiros nacionais, o resultado pode ser "surpreendentemente equilibrado”. “Ainda que o conselho nacional seja, sobretudo pelas inerências, um órgão de confiança do presidente, em política o incontornável tem muita força", acrescenta o mesmo dirigente.

Francisco Rodrigues dos Santos procura controlar como pode a vantagem. Garantir que o voto é nominal e não secreto, como quer Adolfo Mesquita Nunes, é uma das formas.

Do lado de Mesquita Nunes, ainda há quem arrisque que é possível vencer; se por vontade ou convicção, este sábado se verá, mas o que dizem para já é que vai ser decidido "voto a voto", que há votos com os quais a direção está a contar e que podem não existir, dada a "extraordinária evolução" dos últimos dias. Prometem que até sábado de manhã não desistem de convencer os conselheiros nacionais, mesmo os que não são "fãs do Adolfo".

A batalha não acaba aqui, mas o congresso fica mais difícil

Mesmo que a moção de confiança a Francisco Rodrigues dos Santos seja aprovada, a questão do congresso extraordinário não fica totalmente fechada. Pode, por exemplo, ser pedido outro conselho nacional, lembram alguns, ou é possível avançar para a recolha de assinaturas (cerca de quatro mil), mas todos admitem que essa hipótese não será muito fácil neste momento, dadas as restrições impostas pela situação pandémica.

O tempo que todo esse processo demoraria, entre a recolha e a validação, poderia arrastar decisões até às vésperas das autárquicas, o que não seria sensato.

Depende em grande medida das contas da moção de confiança e - como sublinham outros - da vontade de Adolfo Mesquita Nunes. Do lado da liderança de Francisco Rodrigues dos Santos, há “tranquilidade” quanto ao resultado da moção de confiança e a convicção é que será aprovada.

Seja como for, ainda que ganhe a batalha deste sábado, Francisco Rodrigues dos Santos pode "ficar mais fragilizado", na leitura de alguns centristas. Porque há quem defenda que o congresso é inevitável, ainda que não declare apoio ao contendor.

No CDS-Madeira, por exemplo, o antigo deputado José Manuel Rodrigues defende que é indispensável um congresso extraordinário e que a maioria dos militantes está desiludida com a situação a que o partido chegou. E o líder parlamentar, Telmo Correia, escreveu esta sexta-feira um artigo no “Público” em que considera inevitável a realização de um congresso o quanto antes.

“Contra factos não há argumentos e os factos justificam o congresso para que esse amplo debate possa ocorrer e a partir dele o toque a rebate seja possível. Independentemente dos já anunciados putativos candidatos, da recandidatura do atual presidente, ou de outros que ainda possam estar a pensar nisso. Mas depois das eleições, das demissões e das discussões, se não se devolver a palavra a todos os militantes, qualquer solução ficará coxa. Não significa isto nenhum menor respeito, pelo atual presidente do partido ou pela sua legitimidade, mas tão só a ideia de que, nestas circunstâncias, o congresso é inevitável”, escreve Telmo Correia, que apoiou João Almeida no congresso de janeiro de 2020.

Como é que se vota?

Uma das questões que já está a gerar discussão ainda antes de começar a reunião do Conselho Nacional é a decisão sobre a forma de votação num encontro que será feito por via digital.

Adolfo Mesquita Nunes tem querido forçar o voto secreto na tentativa de anular uma eventual vantagem de Francisco Rodrigues dos Santos. De acordo com as regras do CDS cabe ao presidente do Conselho Nacional decidir a modalidade de votação.

Nos estatutos do partido há uma norma que prevê que o escrutínio secreto se faz apenas quando houver uma de quatro situações: processos disciplinares, pedidos de recurso, eleições para órgãos internos do partido (da comissão organizativa do congresso, por exemplo) e nomeações.

Ora, nenhuma destas exceções se aplica neste caso, estando em causa a votação de uma moção de confiança à direção apresentada pelo líder do partido. De resto, a todas as votações políticas e que não impliquem diretamente pessoas exige-se que sejam assumidas. É essa a regra que vigora.

Cabe ao presidente do Conselho Nacional tomar a decisão sobre a modalidade de votação, tratando-se, contudo de uma decisão recorrível para o plenário deste órgão de direção nacional, que é soberano e em última instância é quem decide.

A Renascença sabe que o presidente do Conselho Nacional, Filipe Anacoreta Correia, pediu à Secretaria Geral do partido (dirigida por Francisco Tavares) que se pronunciasse sobre a viabilidade de se recorrer ao voto eletrónico, com ambas as modalidades, secreto e não secreto.

Sendo este Conselho Nacional realizado por videoconferência devido à pandemia, a votação à distância é vista pelos dirigentes nacionais do CDS como um verdadeiro desafio, colocando-se a questão de como é que se assegura o voto secreto nestas condições, para além de que é preciso prever eventuais ações de piratas informáticos, avisa um dos conselheiros.

Cabe a Filipe Anacoreta Correia apresentar este sábado as diversas modalidades de votação e anunciar a modalidade escolhida e depois logo se vê. No caso de alguém recorrer, o Conselho Nacional é soberano.

Um dirigente nacional do partido numa bicada a Adolfo e aos portistas salienta que "quem definiu estas regras é quem está a contestá-las, as regras vêm do tempo de Paulo Portas".

Moção de confiança vs. Moção de censura

Outra forma que Adolfo Mesquita Nunes tentou usar para forçar a decisão sobre um congresso antecipado foi pedir que esse assunto fosse incluído na ordem de trabalhos da reunião deste sábado. Isto porque a convocatória só tem a moção de confiança na ordem de trabalhos e, formalmente, só se pode discutir o que está na convocatória.

Por isso, Mesquita Nunes reuniu as assinaturas de vários apoiantes e apresentou ao presidente do Conselho Nacional um requerimento a pedir a convocação do órgão máximo do partido entre congressos para a marcação de um congresso eletivo.

A Renascença sabe que o entendimento de Filipe Anacoreta Correia é que a possibilidade de um Conselho Nacional convocar um congresso eletivo requer uma moção de censura, sendo que o mandato da comissão política do partido é de dois anos.

Terá sido pedido, de resto, a Adolfo Mesquita Nunes que esclarecesse se o requerimento apresentado devia ser considerado uma moção de censura.

Ora, a moção de censura (a existir) para ser aprovada tem de ter 2/3 dos votos dos conselheiros nacionais, ao passo que a moção de confiança - já anunciada por Francisco Rodrigues dos Santos - carece apenas de maioria simples.

No caso de a moção de confiança ser chumbada este sábado então aí convoca-se o congresso, mas primeiro é necessário marcar um novo Conselho Nacional, já que pela ordem de trabalhos este que não serve.

Se for aprovada a moção de confiança o entendimento é que não há razão para que o Conselho Nacional convoque um Congresso antecipado, que, em condições normais, só está previsto para o início do próximo ano.

Bom, há sempre a possibilidade de realizar um congresso extraordinário e se os conselheiros nacionais quiserem os estatutos preveem duas modalidades.

Uma delas é a que foi usada agora por Adolfo Mesquita Nunes, que é a de forçar a realização de um Conselho Nacional reunindo a vontade de 1/5 dos conselheiros.

A outra modalidade é a que permite que 10% dos militantes convoquem o congresso, o que equivale a 4 ou 5 mil assinaturas, sendo neste momento avaliado em 40 a 50 mil o universo de militantes do CDS. “Duvido que as consigam, quatro mil é muita coisa”, diz um apoiante de Francisco Rodrigues dos Santos.

Mais uma vez, a competência para convocar o congresso cabe ao Conselho Nacional, e um dirigente nacional refere à Renascença que "em última análise pode ser convocado para janeiro ou mais à frente". Ora, janeiro de 2022 já é a data em que deveria realizar-se o congresso ordinário.

É também defendido que "o Congresso nunca poderia ser em março ou abril" deste ano, tendo em conta a preparação das autárquicas, e "antes disso não dá para convocar o Congresso", com o mesmo dirigente a rematar que "há uma pandemia".

Tratando-se praticamente da sobrevivência futura do CDS, é sustentado que "não se trata apenas de disputar uma liderança, mas dos desafios que o partido tem pela frente, inclusive as autárquicas".

O mesmo dirigente nacional lembra que houve uma oposição pública do partido em relação ao congresso do PCP e que "os congressos do CDS têm mobilizado cerca de mil pessoas", deixando a pergunta no ar "como é que o Congresso nestas condições poderia manter a democraticidade?"