A presidente do BCE, Christine Lagarde, disse esta terça-feira que a natureza da inflação na zona euro está a mudar e é improvável que, no futuro próximo, o banco central possa declarar que as taxas diretoras máximas foram atingidas.
Em Sintra, no segundo dia do encontro anual do Fórum do Banco Central (BCE), Christine Lagarde reafirmou que a inflação na zona euro é demasiado elevada e continuará a sê-lo durante demasiado tempo, sendo que o compromisso do banco central em atingir a meta de inflação de 2% se mantém.
"Ainda não assistimos ao impacto total dos aumentos acumulados das taxas de juro decididos desde julho passado – que ascendem a 400 pontos base. Porém, o nosso trabalhoainda não terminou. Exceto se ocorrer uma alteração substancial das perspetivas de inflação, continuaremos a aumentar as taxas em julho", afirmou.
Christine Lagarde explica que estamos perante uma inflação persistente, que ainda se vai manter algum tempo e que existem duas fontes de incerteza que afetam o "nível" e a "duração" das taxas diretoras.
"A inflação na área do euro é demasiado elevada e continuará a sê‑lo durante demasiado tempo. A persistência advém do facto de a inflação estar a repercutir‑se na economia por fases, com os diferentes agentes económicos a tentar transmitir os custos uns aos outros", justifica.
"Dependerá de como a economia e várias das forças que descrevi evolvem com o tempo. Além disso, terá de ser continuamente reavaliado ao longo do tempo".
Lagarde recordou ainda que parte desta incerteza reside no facto da zona euro não ter atravessado uma fase sustentada de aumentos das taxas de juro desde meados da década de 2000 e as taxas nunca terem subido tão rapidamente.
"Precisamos que as taxas atinjam níveis 'suficientemente restritivos' para fixar a restritividade da nossa política monetária", salientou, acrescentando que é necessário comunicar claramente que permanecerão "nesses níveis enquanto for necessário".
"Tal assegurará que os aumentos das taxas não suscitam expectativas de uma inversão demasiado rápida da política monetária e permitirá a concretização do impacto total das nossas medidas anteriores", disse.
As empresas tiveram um papel importante, ao tentarem garantir margens de lucro com a inflação.
"Os lucros unitários contribuíram cerca de dois terços para a inflação interna em 2022, ao passo que, nos 20 anos anteriores, o seu contributo médio foi cerca de um terço. Tal levou, por sua vez, os choques a repercutirem‑se na inflação muito mais rapidamente e de forma mais forte do que no passado. Esta primeira fase começa, contudo, a dissipar-se".
Do outro lado estão os trabalhadores e consumidores, que têm perdido poder de compra. Segundo o BCE, a recuperação dos salários só deverá estar concluída no final de 2025.
"Os trabalhadores, que também são consumidores, ficaram, até à data, a perder com o choque inflacionista, sofreram grandes decréscimos dos salários reais, o que está a desencadear um processo sustentado de 'convergência em alta' dos salários, com os trabalhadores a tentar recuperar perdas. Como as negociações salariais em muitos países europeus são plurianuais e inertes, este processo irá obviamente desenrolar‑se ao longo de vários anos. As nossas projeções mais recentes indicam que os salários crescerão mais 14% em termos reais, entre agora e o final de 2025", explicou.
A presidente do BCE sublinhou ainda dois riscos que merecem toda a atenção dos supervisores: uma espiral salários preços, não se observa atualmente mas “quanto mais a inflação se mantiver acima do objetivo, maiores serão esses riscos”; por outro lado, “se a política monetária for suficientemente restritiva, a economia pode alcançar uma desinflação geral”.