O escultor Rui Chafes venceu o Prémio Pessoa 2015, anunciou o júri do galardão, esta sexta-feira, no Palácio de Seteais, em Sintra. É a primeira vez que um escultor é premiado com o Prémio
Pessoa.
“Rui Chafes consegue o feito raro de produzir uma obra simultaneamente sem tempo e do seu tempo”, disse o presidente do júri do Prémio Pessoa, Francisco Pinto Balsemão.
Com um valor monetário de 60 mil euros, o Prémio Pessoa, uma iniciativa do jornal "Expresso", reconhece a intervenção de uma personalidade portuguesa na vida cultural e científica do país.
Rui Chafes formou-se em Escultura pela Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, em 1989, seguindo depois para Dusseldorf, onde frequentou a Kunstakademie, sob a direcção do artista alemão Gerhard Merz. O interesse de Chafes pela cultura alemã tem sido, aliás, uma constante.
As suas primeiras exposições individuais na Galeria Leo,
1986 e 1987, e no Espaço Poligrupo Renascença, em 1988, “definem um período
inicial marcado pela criação de instalações nas quais usava materiais variados,
como troncos, canas, fitas de platex, ripas de madeira e plástico, que viria a
abandonar, mais tarde, a favor do uso exclusivo do ferro pintado de preto,
convocando, assim, para o seu trabalho a experiência física da sua configuração,
alquímica e industrial”, dizia o texto do Centro de Arte Moderna (CAM) da Fundação Calouste Gulbenkian,
aquando da exposição antológica do artista plástico que apresentou em 2014.
Durante o Sono, 2012
A propósito da exposição no CAM, Bárbara Valentina escreveu: “Há uma procura de transcendência na obra de Rui Chafes a que a utilização do ferro como matéria-prima não é alheia. O ferro vem das profundezas da terra e é um dos elementos mais abundantes no universo; dentro do corpo humano é o responsável pelo transporte de oxigénio no sangue. É desta forma que Chafes trabalha este material: como algo que vem do âmago e ao mesmo tempo permite uma tal leveza e delicadeza que consegue conter o ar”.
Entre 1990 e 1992, Chafes estudou com Gerhard Merz, na Kunstakademie, em Dusseldorf, na Alemanha. É durante a sua estadia na Alemanha que traduziu “Fragmentos de Novalis” (1992), que ilustrou com desenhos seus.
Durante a cerimónia de anúncio do prémio, Francisco Pinto Balsemão recordou que as primeiras exposições de Chafes, em 1986 e 1987, “são marcadas pela criação de instalações com materiais precários, que, de pronto, foram substituídos por ferro pintado de preto; um meio mais eficaz de ocupar e desenhar o espaço, que subverte as condicionantes normais do museu e da galeria”, como se viu na sua exposição na Gulbenkian.
Chafes expõe regularmente desde os anos 80. Na sua carreira expôs em espaços como Museu de Serralves e o Museu Colecção Berardo e em diversas instituições internacionais. Foi representante português na Bienal de Veneza (1995, com José Pedro Croft e Pedro Cabrita Reis) e na Bienal de São Paulo (2004, com o projecto conjunto com Vera Mantero).
Burning in the forbidden sea, 2011 (com Orla Barry)
Onde ver Chafes
Uma exposição de Chafes “Desenhar” está actualmente patente no Atelier-Museu Júlio Pomar, em Lisboa, onde “a sua obra entra em contraponto com o desenho de Pomar, flutuando no espaço central do ateliê”, disse Balsemão.
O escultor está também representado na exposição “Anozero – Família de Rui Chafes e Pedro Costa com Jean-Marie Straub & Danièle Huillet”, patente no Museu Nacional Machado de Castro, em Coimbra.
Em Vila Nova de Famalicão, na Galeria de Arte Contemporânea Ala da Frente, estão patentes três peças de Chafes na exposição "Exúvia”. O escultor assina as peças de grande dimensão “Inferno XXXV”, “Escurecer e arrefecer” e “Confiai nos Sonhos”.
“Inferno XXXV”, “Escurecer e Arrefecer” e “Confiai nos Sonhos” são as três obras de Rui Chafes que podem ser apreciadas na Galeria de Arte Contemporânea “Ala da Frente”, em Vila Nova de Famalicão, até ao dia 23 de Janeiro.
Excesso
de imagens
A sua obra tem sido editada em sucessivos volumes, referiu Balsemão, entre eles, “Würzburg Bolton Landing”, com as peças de 1987 e 1994, “Harmonia”, com esculturas de 1995 a 1998, “Durante o fim” para a exposição antológica realizada em Sintra, no Parque da Pena e no Museu da Coleção Berardo, em 2000, e “Um Sopro” e “Entre o Céu e a Terra (A história da minha vida)”, 2012, que “é, fundamentalmente, um mergulho nas suas próprias raízes, que vai até ao coração da Idade Média, 1266”.
É neste volume, editado pela Documenta, que Rui Chafes escreve: "Vivemos
numa época sem estética. Não temos falta de imagens, bem pelo contrário,
sofremos a excessiva e invasora proliferação de imagens. O problema é a falta
de conhecimento sério e de imagens credíveis, cuja ética de construção seja o
seu valor mais intrínseco (...). É impossível viver só com imagens
vazias".O júri do Prémio Pessoa é presidido por Francisco Pinto Balsemão e integra Álvaro Nascimento, António Barreto, Clara Ferreira Alves, Diogo Lucena, Eduardo Souto de Moura, João Lobo Antunes, José Luís Porfírio, Maria Manuel Mota, Maria de Sousa, Mário Soares, Miguel Veiga, Pedro Norton, Rui Magalhães Baião, Rui Vieira Nery e Viriato Soromenho-Marques.
Atribuído pela primeira vez em 1987 ao historiador José Mattoso, o Prémio Pessoa já distinguiu personalidades como a pianista Maria João Pires, os cientistas António e Hanna Damásio, o poeta Herberto Hélder (que recusou o galardão), o arquitecto Eduardo Souto Moura, o compositor Emanuel Nunes, o constitucionalista José Gomes Canotilho, o actor Luís Miguel Cintra, a historiadora Irene Flunser Pimentel e Manuel Clemente, actual cardeal patriarca de Lisboa.