A Provedora de Justiça pede a inconstitucionalidade da lei da eutanásia, por considerar que o diploma é contrário à lei fundamental.
Com que argumentos?
Vários, desde logo, a inviolabilidade da vida humana. Maria Lúcia Amaral entende que o diploma da eutanásia põe em causa esse princípio
Por outro lado, a Provedora entende que a lei põe - entre outros valores - a identidade pessoal, a capacidade civil, o bom nome e reputação, a imagem, e a reserva da intimidade da vida privada e familiar.
Finalmente, Maria Lúcia Amaral identifica um problema de discriminação. A lei da eutanásia indica que, caso assim o pretenda, o doente tem sempre garantido o acesso a cuidados paliativos.
Só que a Provedora de Justiça considera que a lei não dá garantias de que sejam apresentadas todas as alternativas a quem pede a morte medicamente assistida.
E, neste ponto, há um dado que não deve ser ignorado: mais de 70% da população com necessidades de cuidados paliativos não tem acesso a esses tratamentos.
Mas por que razão surge agora este pedido da Provedora de Justiça?
Esta posição da Provedora de Justiça é a resposta a um pedido do CDS que, em junho do ano passado, pediu à Provedora de Justiça que solicitasse junto do Tribunal Constitucional a fiscalização sucessiva do decreto.
Nesta fase falamos, ainda, de decreto, uma vez que a lei da eutanásia foi promulgada em maio do ano passado por Marcelo Rebelo de Sousa, mas ainda aguarda a regulamentação, depois de o Governo cessante tenha remetido este assunto para o dossier de transição para o próximo executivo.
E agora, o que acontece à lei da eutanásia?
Agora, terá a palavra o Tribunal Constitucional que, perante a mais recente redação do decreto terá de dizer se têm fundamento ou não os argumentos apresentados pela Provedora de Justiça. Se considerar que as observações da Provedora são atendíveis, pode declarar a inconstitucionalidade.
Nesse caso, o processo pode ter de recomeçar do zero e toda a lei ser redesenhada.
Se o Tribunal Constitucional entender que a Provedora não tem razão nos seus argumentos fica tudo como está.
Há ainda um terceiro plano: os juízes do Constitucional podem dar razão parcialmente a alguns dos argumentos da Provedora de Justiça e fazer recomendações aos políticos para que façam alterações à redação do decreto.
Mas, afinal, o que diz o diploma da eutanásia?
Diz que essa prática só poderá ocorrer nos casos em que o suicídio medicamente assistido seja impossível por incapacidade física do doente.
Portanto, há que fazer essa distinção entre suicídio medicamente assistido e eutanásia, ou morte medicamente assistida.
No suicídio medicamente assistido, é o próprio doente que administra a si próprio medicação letal, com supervisão médica.
No caso da eutanásia, é o próprio médico ou profissional de saúde habilitado para esse efeito quem administra a medicação letal ao doente.
O que o diploma diz é que a morte medicamente assistida não é punida se ocorrer por decisão da própria pessoa, maior de idade, cuja vontade seja atual e reiterada, séria, livre e esclarecida, em situação de sofrimento de grande intensidade, com lesão definitiva de gravidade extrema ou doença grave e incurável, quando praticada ou apoiada por profissionais de saúde.