Sondar todos os dias cansa
23-09-2015 - 07:54
 • João Taborda da Gama

Os tempos mudaram e sonda-se todos os dias, mais do que uma vez por dia até. Sonda-se por tudo e por nada, sem compromisso, só pelo prazer de sondar. Não há fome que não dê em fartura.

Houve um tempo, não muito longínquo, em que as sondagens eram uma coisa solene. Sabia-se que ia haver uma sondagem, todos se preparavam e, uns dias antes, começavam as fugas de informação.

Por fim, lá saiam os resultados. Os partidos comentavam comedidamente, os perdedores disfarçavam a cara de pau e diziam não ligar, os ganhadores disfarçavam a cara de festa e diziam não ligar. Depois vinham os especialistas explicar tudo tintim por tintim, dias a fio, demoradamente, como faz Passos com as velhinhas.

Agora não. Os tempos mudaram e sonda-se todos os dias, mais do que uma vez por dia até. Sonda-se por tudo e por nada, sem compromisso, só pelo prazer de sondar. Não há fome que não dê em fartura.

As sondagens diárias tornaram a política numa bolsa. Qualquer dia, na edição da manhã das televisões teremos uns jovens cheios de juventude - e de sono - a ler no teleponto:

“Hoje os principais partidos abriram em alta, e seguem a ganhar 0.4%, em linha com a tendência verificada nas principais praças mundiais. A extrema-esquerda saiu do vermelho a recuperar até aos 5,31 % em meia hora depois, de uma queda de 3,54 % na segunda-feira.”

A banalização dos palpites, com sondagens de manhã à noite, tem animado a Coligação, que anda consistentemente na frente.

Tivemos o volta atrás de Passos com o cheque para o FMI, que não era para o FMI, e Costa a quadrar o círculo, cortando as portagens que iam pagar os cortes que ia fazer na Segurança Social.

Mas as melhores notícias para a Coligação, e as piores para os Socialistas, chegam de um país onde um governo, que se comprometeu a adoptar medidas de austeridade, foi reeleito: a Grécia de Tsipras, um Tsipras 2.0 libertado das cangas do extremismo, rendido ao pragmatismo e pronto para continuar a social-democracia em Atenas - depois da breve interrupção do último ano.