Estará a Igreja Católica em risco de entrar em cisma? A questão foi posta diretamente ao Papa Francisco no regresso a Roma, depois da sua última viagem apostólica a África, e este respondeu que existe sempre essa possibilidade, afirmando que não teme um cisma mas que aceita de bom grado as críticas que lhe são feitas, desde que sejam feitas de forma aberta e não pelas costas.
A questão foi provocada por um livro, escrito por um jornalista do “La Croix”, sobre a reação de setores conservadores, sobretudo nos Estados Unidos, ao pontificado de Francisco.
Para o padre José Maria Brito, diretor do site Ponto SJ, a tensão existente na Igreja não é muito diferente da que existe na sociedade em geral, onde a polarização se tem tornado mais notória nos últimos anos e tem de ser vista ainda à luz das chamadas “guerras culturais” americanas.
“Estas críticas vêm muitas vezes de fora da Igreja mais institucional e são avançadas por grupos muito conservadores, na lógica das guerras culturais, em que eu divirjo da outra pessoa agarrando-me muito ao que são as minhas posições e a minha ideologia, não procuro contacto, mas defino-me por oposição ao outro. Há uma dinâmica própria destas guerras culturais e muitas destas correntes são apoiadas por americanos ligados a estes grupos, ficam muito muito incomodados quando o Papa coloca o dedo na ferida nestas questões”, diz, dando como exemplo a questão das migrações ou da preocupação de Francisco com a ecologia.
Como se vive com esta tensão? “Sem perder a comunhão e sem perder a consciência de que fazemos parte da mesma igreja e somos irmãos”, diz José Maria Brito.
Aura Miguel, vaticanista que já acompanhou mais de 100 viagens papais, recorda que a oposição ao Papa não vem só de setores conservadores, apontando para o exemplo da Igreja alemã, que anunciou um processo sinodal que já mereceu várias críticas de Roma, mas com a qual os bispos alemães querem avançar na mesma.
A jornalista refere ainda que o próprio Papa já disse que antes de ser eleito não dava entrevistas, “por ser muito impulsivo e depois arrepender-se do que tinha dito. Tudo isto continua a acontecer. Cada vez que ele fala connosco no avião gera uma dor de cabeça para os seus conselheiros”.
Aura Miguel diz que gostaria de ver o Papa mais aberto a dialogar com os seus críticos e avisa que com o sínodo sobre a Amazónia, que começa em outubro, “a tensão vai extremar-se”.