No Café Joyeux contrata-se para formar jovens com trissomia ou autismo
28-11-2021 - 15:00
 • Ana Catarina André

Fica na Calçada da Estrela, em Lisboa, e promove a inclusão de jovens com condições como trissomia 21 ou perturbações do espectro do autismo. O conceito, nascido em França, chegou agora a Portugal.

Está a ser uma hora de almoço concorrida no Café Joyeux, em Lisboa. As mesas estão quase todas ocupadas e, ao balcão, vão-se juntando clientes para fazer o seu pedido. Pedro, de 22 anos, é um dos funcionários. Com agilidade, move-se pelo café, ora recebendo, ao balcão, os pedidos já prontos, ora servindo à mesa e respondendo às perguntas dos clientes. “É como se estivéssemos a trabalhar. Estamos a receber uma bolsa de estudo”, conta o jovem, sublinhando a importância de ter "a sua independência”.

Inaugurado a 20 de novembro, o Café Joyeux, situado na Calçada da Estrela, em Lisboa, é um espaço de restauração inclusiva que emprega e dá formação a jovens com dificuldades intelectuais e do desenvolvimento. “Através do sucesso deste conceito em França, conseguimos comprovar que podemos contratar para formar, em vez de fazer o contrário, que normalmente acontece”, afirma Filipa Pinto Coelho, presidente da associação VilacomVida, promotora do projeto em Portugal.

Contratar para formar, uma prática pouco comum

Ao longo de dois anos, os funcionários (contratados por tempo indeterminado) podem aprofundar as suas competências como cozinheiros, empregados de mesa, empregados de balcão ou baristas. “Estes jovens passam por muitos estágios, que depois não têm seguimento para contrato. Ao poder contratar uma pessoa com este perfil, dar-lhes o seu salário, mostrar-lhes que são capazes, dar-lhes essa responsabilidade, estes jovens vão investir mais na sua formação e mais facilmente vão conseguir ser profissionais de sucesso”, afirma a responsável, acrescentando que nove dos 12 empregados têm algum tipo de dificuldade intelectual e do desenvolvimento, inerente a condições como a trissomia 21 ou perturbações do espectro do autismo. Concluído o período de formação, cabe a cada jovem decidir se quer permanecer no café ou procurar outros desafios.

Nestes primeiros dias após a abertura, há muitos amigos da associação entre os clientes. Rita Oliveira já fez voluntariado em outras iniciativas da VilacomVida e convidou três amigas para conhecer o novo espaço. “Se eles aparecerem em todo o lado, nos cafés, nos restaurantes, nos concertos, na rua, cada vez começa a ser mais normal percebermos que somos todos diferentes”, afirma.

Um negócio em expansão

O objetivo é que o negócio, que resulta de um acordo entre a associação VilacomVida e a Fundação Émeraude Solidaire, seja sustentável, explica Filipa Pinto Coelho, “empregando estas pessoas, convidando muitos clientes a vir porque se come bem, porque se sentem acolhidos, mas também porque estão a contribuir para uma causa”. Todos os lucros – garante – serão investidos na abertura de mais cafés Joyeux.

O segundo deverá abrir em Cascais, em 2022, graças ao contributo de um investidor, e até 2026, estão planeados mais cinco a sete. Aliás, o projeto só é possível, assegura Filipa Pinto Coelho, graças à angariação de fundos que está a ser feita pela associação, uma IPSS criada em 2016 com o objetivo de promover a vida autónoma dos jovens com dificuldades Intelectuais de desenvolvimento.

Um projeto que começou por acaso

Há muito tempo que a presidente da Associação VilacomVida procurava “um projeto que aproximasse a sociedade da diferença”. Em Março de 2018, quando uma amiga a apresentou a um dos membros da equipa do Café Joyeux – um projeto acabado de nascer em França que procurava promover a empregabilidade de jovens com dificuldades intelectuais ou de desenvolvimento –, conseguiu marcar uma reunião com o fundador da marca, em Paris. “Houve uma empatia muito grande entre nós. Temos a mesma visão sobre as extraordinárias capacidades destas pessoas”, conta a responsável que iniciou, então, um processo de conversações com a empresa para trazer o conceito para Portugal. Antes, testou o a ideia através do projeto-piloto Café ComVida, um espaço que a associação VilacomVida manteve aberto 18 meses em Santos, em Lisboa, mas que teve de fechar devido à pandemia da Covid-19.