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Os lesados do papel comercial do Grupo Espírito Santo (GES) disponibilizaram-se para receber até 286 milhões de euros dos produtos adquiridos, cerca de 50 a 75% do capital investido. Os créditos ascendem a 485 milhões de euros, afirmou Diogo Lacerda Machado, negociador em nome do Governo, numa comunicação a partir da residência oficial do primeiro-ministro, em Lisboa.
Lacerda Machado anunciou a criação de uma entidade que "se incumba de recuperar todo o valor que seja devido, para que sejam aqueles que são responsabilizáveis pelo incumprimento deste crédito", disse. Nesta apresentação pública não houve direito a perguntas dos jornalistas nem foram apresentados os pormenores da solução em causa.
"Foi possível, dentro do propósito de buscar uma solução para minorar as perdas dos lesados, conceber e desenhar uma possível solução que venha a ser apresentada aos lesados, para que cada um por si, individualmente, venha a ponderar aceitar ou não", afirmou o advogado.
Machado quis "transmitir a mensagem inequívoca de concertação de posições entre entidades envolvidas", da "concertação de mecanismos expeditos para resolver problemas consequentes de situações em que bancos deixam de ter condições", juntando "à volta da mesa" BES, CMVM, a associação de lesados, o BdP e ainda o Governo, como mediador.
Caso se venha a "recuperar algo mais de quem porventura deva,
será obviamente repartido entre os lesados", sublinhou o advogado.
O representante da Associação de Lesados do BES, o médico dentista Ricardo Ângelo, referiu que "o sofrimento tangível é facilmente explicável, como as perdas monetárias; o intangível... o sofrimento de milhares de famílias, os suicídios... Pôr termo a esse processo é um sucesso, e, perto do Natal, é uma autêntica bênção para quem lida com esta situação diariamente", afirmou.
"Mais do que direitos morais, os lesados tinham direitos jurídicos, e esta solução o comprova", declarou Ricardo Ângelo, que elogiou António Costa por, "de forma inteligente", perceber que "este problema" não era dos lesados, "mas sim do país".
Já o primeiro-ministro, que falou por último, sublinhou que existem "outros modos de fazer" no que toca à negociação entre as partes: "Não era só a questão de satisfazer necessidades, era uma questão de credibilidade dos nossos produtos financeiros e da confiança que todos os cidadãos têm de ter no sistema financeiro".
António Costa garante que os contribuintes não terão que assumir o custo de uma situação "que os ultrapassa", sem avançar, no entanto, como é que será financiado este fundo de compensações anunciado esta segunda-feira por Lacerda Machado.
Solução visa dar prioridade aos lesados "mais vulneráveis"
Lacerda Machado acrescentou que foi cumprido o memorando subscrito pelo Banco de Portugal, CMVM e BES, com o Governo como "facilitador", cumprindo também a recomendação específica do relatório da comissão parlamentar de inquérito à gestão do BES e do GES - sugestão que fazia especial referência aos clientes em situação "mais vulnerável" e com "particular urgência em termos de liquidez".
Falando de seguida, o representante dos lesados referiu que esta solução, que "demorou meses a montar, com o auxílio de todos, aos lesados permite antecipar as poupanças que foram confiadas ao sistema financeiro português".
O representante da associação de lesados admitiu ainda que "houve procedimentos errados contra o doutor Carlos Costa", governador do Banco de Portugal, e agradeceu ao banco a "capacidade de trabalho". Ângelo elogiou ainda o "Homem com H grande, Carlos Tavares", a sua "capacidade de manter a mesma posição, sempre atrás da justiça". "O senhor ficará na memória de muitos dos lesados", disse. Por fim os lesados agradeceram ainda a Manuel Magalhães, do BES, o "altruísmo tremendo".
"O varrer para debaixo do tapete alterou-se" depois da alteração do Governo, sublinhou ainda Ricardo Ângelo. O representante aproveitou para agradecer a António Costa a "capacidade de negociação" que diz estar a levar o país "para o bom caminho", salientando "o papel do seu melhor amigo, o doutor Lacerda Machado".
No último ano, Costa diz ter testemunhado "pessoalmente" a recuperação do sistema financeiro nacional, enumerando a aprovação em Bruxelas do plano de recapitalização da Caixa Geral de Depósitos, os vários problemas no sistema que foram resolvidos com a aprovação das instituições europeias e ainda a recuperação do investimento directo estrangeiro, segundo o Governo.
Diz o chefe do Governo que os portugueses tinham de recuperar a confiança no sistema, nos reguladores e nos produtos colocados no mercado.
Citando a impossibilidade de "endireitar a sombra de uma vara torta", o primeiro-ministro disse ainda: "Não conseguimos esse milagre, mas conseguimos uma solução que não isenta de pagar quem tem obrigação de pagar, permite quem tem a receber que antecipe aquilo que tem a receber e garante que os contribuintes não terão que assumir aquilo que os ultrapassa".
"Podemos chegar a este momento com o sentimento de dever cumprido", finalizou, agradecendo por fim "aos lesados capacidade de se sentarem à mesa, de sacrificar parte daquilo que entendiam que tinham direito a receber" e ainda a Carlos Costa e a Lacerda de Machado.
[Notícia actualizada às 18h36]