Artur Santos Silva defende que “partidos políticos, Parlamento, Governo e Presidente da República” devem convergir “para uma reforma da Justiça”. Quarenta e oito anos depois do 25 de abril de 1974, o antigo banqueiro considera que “a função do Estado que está por cumprir é a da Justiça”.
Em entrevista ao podcast Avenida da Liberdade, da Renascença, Santos Silva aponta o descrédito do setor como “um problema sério”.
“Há 30 anos, a opinião pública era extremamente favorável à independência e lisura da magistratura e hoje, pela maneira como o sistema funciona, há um grande descrédito em relação à Justiça”, aponta.
O atual presidente honorário do BPI considera que o descrédito se estende também ao sistema bancário: a credibilidade "foi abalada por uma série de circunstâncias que os portugueses estão a pagar”, diz Artur Santos Silva.
“O esforço que tem sido feito tem conseguido reforçar a credibilidade no sistema bancário, mas essa credibilidade foi muito afetada por situações de clara violação, não apenas da ética, mas frontal violação da lei, com consequências seríssimas para todos nós”, critica.
Em casa de Sá Carneiro, ao telefone com Balsemão e Marcelo
Ao percorrer a memória do dia 25 de abril de 1974, nesta conversa com o podcast Avenida da Liberdade, Artur Santos Silva recorda que a notícia de que estava em marcha uma revolução lhe chegou pela diplomacia norte-americana.
“Eram 6h30 da manhã e recebi um telefonema da minha irmã mais velha que trabalhava no consulado americano no Porto, que se tinha apercebido, pelos comunicados que estavam a sair, que havia um movimento militar contra o regime”, lembra dessa madrugada o então diretor do Banco Português do Atlântico.
Às primeiras horas do dia, Santos Silva resolveu ir de imediato para o banco, tentando precaver o que poderia acontecer. “Ia haver naturalmente alguma pressão de levantamentos”, recorda o banqueiro. Diz que foi “com propósito cautelar” que pôs a equipa a trabalhar para preparar as “primeiras horas a seguir à reabertura”.
Da memória de 25 de abril de 1974 fica também a tarde que partilhou com o amigo Francisco Sá Carneiro. Depois de deixar o banco, ao dirigir-se para casa, resolveu “encher o depósito de gasolina do carro”.
“Mesmo em frente à bomba era a casa de Francisco Sá Carneiro, meu amigo, com quem tinha convivido muito e refletido muito sobre a situação política e social do país. Toda essa tarde estivemos a conversar e a seguir os acontecimentos ligando para o 'Expresso'. Era o Dr. Balsemão ou o Prof. Rebelo de Sousa que nos iam dando notícias e todas elas no sentido de que era irreversível”, conta Artur Santos Silva.
Nesse mesmo dia 25 de abril, Sá Carneiro desafiou Santos Silva a criar o então PPD. O banqueiro deu o seu contributo, mas manteve-se sempre longe da política, até assumir funções no VI Governo Provisório de Pinheiro de Azevedo, um executivo cheio de percalços.
Artur Santos Silva era então secretário de Estado do Tesouro e, a rir, recorda o dia em que quando ia para o seu gabinete no Terreiro do Paço, percebeu pela rádio que o executivo estava em greve.
“O Governo decidiu que despacharia só assuntos de gestão corrente, enquanto a região de Lisboa fosse comandada por Otelo Saraiva de Carvalho”, explica Santos Silva, que lembra que tinha “havido já incidentes sérios”, entre eles o cerco à Assembleia da República.
“Eu soube que o Governo estava em greve quando ia para o meu lugar de trabalho no Terreiro do Paço. Soube pelo noticiário das 9h00 que estávamos em greve, isto é, que o Governo, como atitude de contestação a essa atuação política e militar na região de Lisboa, quis assim contrariá-la”.
Na memória de Artur Santos Silva estão também outros dias, muitos anos antes da Revolução dos Cravos, aquando da campanha de Humberto Delgado, no Porto. Tinha então jovens 16 anos, mas não lhe sai da memória a enchente que tomou as ruas do Porto e o papel que o seu avô teve então.
“Foi o meu avô que o recebeu [Humberto Delgado] na sede de candidatura na praça Carlos Alberto e depois o comício à noite, no Coliseu, onde eu estive, foi um momento extraordinário com a entrada dele na sala, em ombros de três ou quatro pessoas, uma delas, eu reconheci, era o meu professor de alemão!”.
Artur Santos recorda também os saneamentos na banca no período a seguir à Revolução, o episódio em que viu o seu pai deputado fechado dentro do Parlamento durante o cerco à Assembleia e muitas outras memórias para ouvir no podcast Avenida da Liberdade, nas plataformas digitais, como a Popcasts.