Portugal registou, na segunda-feira, um tráfego máximo de 122 Gigabits por segundo, o maior no último ano. O pico coincide com o dia de encerramento de todas as escolas básicas e secundárias do país e a adoção por milhares de empresas de medidas de contenção, com recurso ao teletrabalho.
Em entrevista à Renascença, o coordenador da Unidade de Computação Científica Nacional (FCCN) da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), João Nuno Ferreira, adianta que o tráfego registou um crescimento de 27% desde o aparecimento do primeiro caso confirmado de coronavírus em Portugal.
Um valor que aumenta para 34,6%, se considerarmos o dia em que foi declarado o estado de pandemia, pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
Estes números têm por base as estatísticas de tráfego do Gigapix, "um ponto neutro de ligação" por onde passa o tráfego de todas as operadoras nacionais, como explica o especialista da FCCN, responsável pela primeira rede de internet em Portugal.
De acordo com João Nuno Ferreira, o Gigapix representa uma forma prática e barata de interligar redes, mantendo local o tráfego local e evitando o recurso a estruturas internacionais. "No limite, podemos dizer que dois vizinhos que troquem e-mails já não precisam de esperar que a mensagem dê a volta o mundo, porque asseguramos que a ligação é feita a nível nacional".
A confirmar-se o estado de emergência, que deverá ser decretado esta quarta-feira pelo Presidente da República, e perante o atual cenário de contenção e isolamento social, o coordenador da FCCN é assertivo - "A tendência é que o tráfego continue a aumentar nos próximos dias".
Uma inversão do tipo de tráfego
O primeiro caso confirmado de coronavírus em Portugal foi registado no dia 2 de março. No final da mesma semana várias
universidades da região norte do país começaram a suspender as
atividades letivas presenciais e vários espaços de estudo foram
encerrados.
Esta quarta-feira, dia 18, as medidas estenderam-se a
quase todas as universidades e institutos politécnicos do país. Com
milhares de estudantes e docentes a desenvolverem as atividades letivas
online, a partir de casa, o consumo de tráfego registou uma inversão. A
rede académica passou a exportar mais tráfego para o Gigapix do que a
importar.
"Neste momento estamos a exportar mais tráfego a partir das universidades do que a consumir. Enquanto antes tínhamos os docentes e alunos dentro dos campus universitários a consumir tráfego da internet dentro da rede, agora saíram dos campus e estão a puxar tráfego dos servidores das suas universidades através das operadoras, no domicílio", explica João Nuno Ferreira.
"Geralmente a nossa comunidade científica vai buscar mais volume de informação aos operadores do gigapix do que exporta para si. Agora as pessoas estão a aceder aos servidores das universidades através das operadoras nacionais, com os seus acesso pessoais domiciliários", acrescenta.
As operadoras têm capacidade para suportar este aumento?
De acordo com os dados da Unidade de Computação Cientifica Nacional da FCT, quatro membros do Gigapix fizeram "upgrades" nas últimas semanas. São eles a ONI, a Vodafone, a AR Telecom e a própria Rede de Ciência, Tecnologia e Sociedade (RCTS).
A RCTS, a rede académica nacional gerida pela FCCN, foi aquela que registou um maior reforço, aumentado em cinco vezes a capacidade anterior (20G para 100G).
Em comunicado à agência Lusa, as três maiores operadoras de telecomunicações em Portugal, Vodafone, Nos e Altice garantem, também, ter reforçado a capacidade das redes.
A Vodafone Portugal avança que a rede da operadora “está, “por defeito”, dimensionada para suportar picos de utilização”. Ainda assim, a operadora “reforçou a monitorização das suas redes, adoptando medidas excepcionais de optimização das mesmas consoante a evolução da situação, de forma a garantir a melhor performance possível do seu serviço”.
A Altice Portugal, dona da Meo, “impôs um conjunto de medidas de isolamento e teletrabalho”, e tem “vindo a registar um aumento muito significativo de tráfego na rede fixa de Internet e em especial na utilização de OTT [over the top, que inclui serviços como as mensagens instantâneas e audiovisuais]”.
No caso da Nos, estão já “implementadas várias medidas, entre as quais se inclui reforço de capacidade de rede, com o objectivo de assegurar a continuidade do seu negócio e consequentemente de todos aqueles que dela dependem”.
À Renascença, João Nuno Ferreira adianta que a estrutura deve evitar medidas de contenção que possam resultar em perda de informação e atraso na comunicação.
"Temos um acordo em que nos comprometemos em manter a capacidade de ligação ao Gigapix sem contenção, isto porque se um operador tem uma ligação de baixa capacidade muito saturada para o Gigapix, essa ligação continua a ter capacidade de atrair tráfego mas já não tem capacidade de ter bom desempenho", esclarece.
"No fundo atrai tráfego e depois presta um mau serviço. Se umaligação está muito saturada às vezes é melhor não a ter sequer, porque aí o tráfego é encaminhado para redes de ligação internacionais e mesmo que dê a volta ao mundo pode encontrar um caminho com mais capacidade que essa referida linha saturada", acrescenta.
A partir de 17 de março e até ao final do mês, as operadoras Nos, Meo e Vodafone estão a dar aos clientes a possibilidade de subscrever, através da app de cliente ou do site uma oferta de 10 GB de dados, válida por 30 dias partir da data de subscrição.