Portugal recebe quatro Prémios Europa Nostra 2023
13-06-2023 - 11:00
 • Maria João Costa

Trinta projetos de 21 países foram distinguidos este ano com os Prémios Europeus do Património Cultural Europa Nostra. Quatro são portugueses. Entre os vencedores estão os tetos Mudéjares da Sé Catedral do Funchal e o arqueólogo Cláudio Torres, considerado um "Campeão do Património".

Nunca Portugal venceu tantos Prémios Europa Nostra como agora. Entre os 30 projetos premiados, quatro são portugueses. É a primeira vez que tal acontece naqueles que são os Prémios Europeus do Património Cultural atribuídos pela organização Europa Nostra, a voz do património a nível europeu.

Em comunicado divulgado esta terça-feira, a Comissão Europeia e a Europa Nostra, representada em Portugal pelo Centro Nacional de Cultura anunciam que entre os vencedores portugueses está, na categoria Conservação e Adaptação a novos Usos, o teto Mudéjares da Sé Catedral do Funchal, na Madeira.

“O restauro destes raros tetos de estilo mudéjar, com 1500 m2, foi realizado com base nas melhores práticas de conservação da madeira e envolveu uma equipa interdisciplinar de profissionais de topo de várias nacionalidades”, pode ler-se no comunicado.

A recuperação deste teto já tinha sido distinguida, em 2022, com o 14.º Prémio Gulbenkian Património – Maria Teresa e Vasco Vivalva. A Diocese do Funchal que recebeu pelo galardão 50 mil euros resolveu investir o prémio em obras de conservação e restauro do restante edifício da Sé do Funchal.

Entre os “quatro extraordinários projetos portugueses”, como refere a Europa Nostra está, na categoria Pesquisa, a salvaguarda da técnica de Pesca Artesanal “Arte-Xávega”. Segundo a organização, “através da transferência de conhecimento e saber-fazer, este projeto de investigação dá a conhecer práticas exemplares de salvaguarda da “Arte-Xávega”, um dos últimos exemplos de pesca artesanal e sustentável na União Europeia”.

Outro premiado, na categoria Envolvimento e Sensibilização dos Cidadãos, é o projeto multidisciplinar ALMADA que “utiliza a investigação científica para apresentar a arte mural” de pintor e artista Almada Negreiros, “numa nova perspetiva”, refere a Europa Nostra que saliente o “seu alcance junto de diversas comunidades”, como “exemplar”.

Na categoria Campeões do Património, a Europa Nostra distinguiu o arqueólogo Cláudio Torres pelos seus “mais de 40 anos” dedicados à arqueologia, e ao “centro de investigação que criou em Mértola” que na opinião da voz do património europeu “desempenham um papel fundamental na valorização e conservação do património islâmico em Portugal”.

Escolhidos por um júri composto por peritos em património de toda a Europa, os premiados são distinguidos “após uma avaliação feita por Comités de Seleção responsáveis pela análise das candidaturas submetidas, tanto por organizações como por pessoas a título individual, de 35 países europeus”.

Cantora lírica e presidente da Europa Nostra Cecilia Bartoli felicita premiados

“São exemplos inspiradores que contribuem verdadeiramente para a construção de uma Europa mais bonita, sustentável e inclusiva” aponta Cecilia Bartoli. A cantora lírica que é também a presidente da Europa Nostra felicita desta forma os vencedores deste ano.

Segundo a sucessora de Plácido Domingo no cargo, as “histórias de sucesso demonstram como a adversidade pode ser superada através do conhecimento, da dedicação, da criatividade e da inovação”. A cerimónia de entrega dos Prémios Europa Nostra está marcada para 28 de setembro no Palazzo del Cinema, em Veneza, cidade classificada pela UNESCO como Património Mundial.

O evento que contará com a presença de Cecilia Bartoli e de Margaritis Schinas, a vice-presidente da Comissão Europeia será ocasião para o anúncio dos vencedores do Grande Prémio e do Prémio “Escolha do Público”, eleito entre os premiados deste ano e que receberão, cada um, o montante de 10 mil euros.

“A cerimónia será um dos pontos altos da Cimeira Europeia do Património Cultural 2023, organizada pela Europa Nostra com o apoio da Comissão Europeia, que irá decorrer entre 27 e 30 de setembro em Veneza”, refere o comunicado.

Dois projetos ucranianos distinguidos com Prémio Europa Nostra

A guerra na Ucrânia levantou as vozes de preocupação pela conservação do património cultural daquele país sobre ofensiva russa. A Europa Nostra tem sido uma das organizações que tem colocado o foco no problema e os seus prémios não o esqueceram.

Entre os premiados deste ano estão dois projetos de salvaguarda da herança cultural ucraniana. Na categoria Envolvimento e Sensibilização dos Cidadãos, Europa Nostra distinguiu o projeto de arquivo do legado industrial ucraniano. “Este inteligente e multifacetado projeto, preserva digitalmente coleções de património industrial ameaçadas no leste da Ucrânia. O projeto promove o envolvimento nesse património entre as comunidades locais na Ucrânia e no Reino Unido”, refere o comunicado.

Na categoria Campeões do Património, a Europa Nostra distinguiu ainda o projeto internacional Salvar o Património Cultural Ukrainiano Online que nos primeiros meses da guerra na Ucrânia, juntou uma “rede de voluntários a nível mundial” que arquivou mais de 50 terabytes de dados de instituições culturais ucranianas”. De acordo com a Europa Nostra “a rápida resposta é um exemplo impressionante do poder da ação coletiva numa situação de crise”.

Carpinteiros da Notre Dame premiados

Entre vários projetos distinguidos este ano, a Europa Nostra premiou também o grupo “Carpinteiros sem Fronteiras” criado em 1992 em Paris e que promove “um movimento de profissionais de carpintaria de madeira que oferece os seus conhecimentos e saber-fazer à escala internacional”.

Nos últimos tempos, este grupo ajudou na reconstrução da Catedral de Nôtre-Dame consumida por um grande incêndio, recorrendo a “materiais e técnicas que remontam ao século XIII”, explica o Europa Nostra em comunicado.

Espanha também, dois projetos a serem distinguidos. Um deles é a Ponte sobre o rio Deba, em Guipúscoa. Trata-se de uma “notável reabilitação desta ponte de pedra do século XIX, um exemplo requintado de engenharia civil”, refere o Europa Nostra que explica que o projeto “exigiu uma extensa pesquisa histórica de materiais e técnicas esquecidas e beneficiou de uma cooperação técnica interdisciplinar”.

Outro dos projetos espanhóis distinguidos foram as Ruínas do Mosteiro de São Pedro de Eslonza, em Gradefes. “As ruínas deste mosteiro do século XVI sofreram uma intervenção que incluiu investigação arqueológica, consolidação e reabilitação para visitas turísticas. A sua sustentabilidade técnica, económica e social é louvável”, aponta a Europa Nostra.

Entre os 30 projetos premiados na categoria Envolvimento e Sensibilização dos Cidadãos foram ainda distinguidos um projeto em Antuérpia, a Village Square Meer, desenvolvido por um grupo de cidadãos que deu uma “nova vida a um convento histórico” da aldeia de Meer, “criando um novo centro de atividades culturais”.

Já em Dublin, na Irlanda foi premiado o Museu de Literatura da Irlanda que “celebra o património literário do país e inspira as gerações futuras a envolverem-se com a arte de escrever e ler. A sua abordagem participativa tem como objetivo desconstruir as perceções elitistas da literatura”, indica a Europa Nostra.

Uma rede de mais de dois mil voluntários em Itália foi também premiada. O projeto “Open for You” “abriu mais de 80 sítios em 34 cidades de toda a Itália que, de outra forma, estariam fechados ao público”, recorrendo ao trabalho dos voluntários.

Mesmo com Brexit, o Reino Unido foi premiado

Embora não faça parte do programa Europa Criativa da União Europeia, o Reino Unido viu dois projetos a serem premiados pela Europa Nostra. As Piscinas de Cleveland, em Bath e o projeto Miniare: Arte e Ciência do Património Manuscrito, de Cambridge mereceram apreciação positiva do júri.

O exemplo da Piscinas de Cleveland são segundo explica a Europa Nostra, um caso em que a comunidade local se juntou no projeto de restauro deste património ao ar livre do século XIX. Foi usada “energia verde e uma abordagem holística para restabelecer a função original do local, adaptando-o aos padrões do século XXI”, destaca a instituição.

Já o caso do projeto de pesquisa Miniare que foi desenvolvido ao longo de 10 anos, entre 2012 e 2022 “revolucionou a compreensão da iluminura dos manuscritos na Europa da Idade Média. Ao utilizar tecnologias de ponta não invasivas, o projeto MINIARE identificou materiais e técnicas de artistas, oferecendo perceções dos contextos culturais, políticos e socioeconómicos como nunca antes”, refere o comunicado.