O Presidente da República insiste na necessidade de reforço e modernização dos meios militares e na valorização das carreiras, reiterando também o apelo a que o novo Conceito Estratégico de Defesa reúna consenso político alargado.
O chefe de Estado e Comandante Supremo das Forças Armadas falava esta terça-feira no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, no encerramento de um seminário sobre "Desafios para a segurança e defesa nacional", promovido pelo Grupo de Reflexão Estratégica Independente (GREI).
Na sua intervenção, Marcelo Rebelo de Sousa argumentou que a invasão da Ucrânia pela Federação Russa mostrou "a falta de resiliência europeia no setor da Defesa" e que "esta é uma oportunidade única para repensar as prioridades da defesa nacional de Portugal e as linhas de ação estratégicas nacionais", invocando a máxima "se queres a paz, prepara-te para a guerra".
"Não é possível a concretização de um Conceito Estratégico de Defesa Nacional sem os recursos adequados, sob pena de ser inviável a sua operacionalização. Falo das capacidades em geral, matéria em que a Lei de Programação Militar deverá ir bem mais longe do que o ensaio frustrado da última lei. Mas falo também dos recursos humanos. Importa mais do que nunca valorizar e reconhecer aqueles que diariamente defendem a nossa bandeira em Portugal e no estrangeiro", afirmou.
Quanto aos recursos materiais, considerou que "no curtíssimo prazo deve ser dada especial atenção e urgência à eliminação dos défices de manutenção, à modernização das capacidades existentes, à reposição dos "stocks" de guerra decorrentes de tempos demasiado longos de desinvestimento, alimentados pela paz que se julgava duradoura vivida nos últimos 30 anos".
Segundo o Presidente da República, além disso, "deve ser ponderado o investimento em projetos verdadeiramente estruturantes e tecnologicamente avançados".
"Projetos que permitam a edificação de capacidades de combate modernas nos diversos ambientes operacionais, possibilitando fazer face às ameaças contemporâneas, em domínios tão variados como o espaço, o ciberespaço, a guerra híbrida, a segurança marítima, incluindo a proteção dos recursos do leito e subsolo marinho ou os cabos submarinos, não esquecendo as tradicionais capacidades de combate", especificou.
Marcelo Rebelo de Sousa defendeu que "a despesa pública com defesa nacional deverá caminhar para estar pelo menos em linha com o acordado com os parceiros da NATO, de 2% do Produto Interno Bruto (PIB), meta definida há quase uma década e que poderá ser alvo de reanálise na próxima cimeira da NATO em Vílnius".
"Importa também avaliar a fórmula de cálculo dessa grandeza, garantindo que o valor veiculado não fragilize a capacidade de Portugal enquanto aliado", observou.
Quanto aos recursos humanos, o chefe de Estado referiu que os militares "auferem dos rendimentos mensais médios mais baixos de toda a Administração Pública" e elegeu a valorização das suas carreiras como "um desígnio imprescindível para atrair e reter talento".
"Tenho recordado ao longo dos tempos que houve atualização quanto a outras funções de soberania, nomeadamente a magistratura. Não houve no domínio das Forças Armadas de forma equivalente. Este desiderato vital deverá ser acompanhado de outras medidas, algumas já em curso, de reforço do sistema de formação e qualificação militar, de melhoria das condições de trabalho, de reconhecimento social e profissional da condição militar, ou dos incentivos à prestação de serviço", acrescentou.
Na assistência estavam o antigo Presidente da República general António Ramalho Eanes e o chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, general Nunes da Fonseca, e representantes dos três ramos militares.
Marcaram também presença no encerramento deste seminário os secretários-gerais do Sistema de Segurança Interna e do Sistema de Informações da República Portuguesa, o comandante-geral da Guarda Nacional Republicana e o diretor nacional da Polícia Judiciária.
Marcelo Rebelo de Sousa aproveitou a ocasião para reiterar o apelo a que o novo Conceito Estratégico de Defesa que vier a ser aprovado seja "objeto de um consenso político alargado, cujo conteúdo, na sua matriz fundamental, perdure através de ciclos eleitorais diversos, ainda que necessariamente aberto à revisão de periodicidade adequada".
Para o chefe de Estado, é igualmente importante neste processo a "aceitação popular" do documento a aprovar, que deve ter "ampla divulgação e legitimação pelos portugueses".
"Estão também já em vigor o novo Conceito Estratégico da NATO e a Bússola Estratégica da União Europeia -- referências inevitáveis para o enquadramento estratégico nacional, obrigando também por essa via a tal revisão", apontou.
No seu entender, Portugal deve "definir os eixos de atuação nacionais sintonizados com a NATO e a União Europeia", mas "nunca esquecendo a individualidade nacional e as esferas de atuação independente do país", com a sua "singular posição geográfica" e múltiplas esferas de relações multilaterais e bilaterais.
O Presidente da República frisou a ideia de que "não pode ser menosprezada a importância do incremento da autonomia estratégica e da resiliência nacional no que diz respeito à defesa militar do território nacional e dos portugueses", e neste ponto chamou à atenção para a "vasta área marítima" de Portugal.
"Este espaço tem vindo a ser palco de crescente importância económica e disputa estratégica, e a sua ocupação efetiva é um imperativo nacional, garantindo a segurança e soberania nacional nesse espaço, a proteção dos seus recursos e a segurança das atividades ali desenvolvidas", disse.
O GREI é uma associação sem fins lucrativos constituída em 2015 que segundo os seus estatutos "tem por fins a realização de estudos de caráter estratégico económico e social, sobre Portugal e a sociedade portuguesa, numa perspetiva do seu desenvolvimento, sobre a sua defesa e segurança e sobre os valores da cidadania".