Polónia. A geração que não conviveu com João Paulo II prepara-se para receber Francisco
25-05-2016 - 08:28
 • Marília Freitas , em Cracóvia

Em Cracóvia a expectativa é grande, sobretudo entre os jovens. A cidade será o palco da Jornada Mundial da Juventude e prepara-se para receber cerca de dois milhões de jovens. A segurança é a principal preocupação.

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Um relógio digital na fachada da Basílica de Santa Maria, na principal praça de Cracóvia, marca a contagem decrescente para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ). Faltam dois meses para o dia da abertura, a 26 de Julho, mas, nesta cidade polaca, ainda são poucos os sinais visíveis do evento. A excepção são as obras nas estradas do centro e arredores da cidade.

“Cracóvia está habituada a visitas de Papas”, lembra Paulina Guzik, voluntária do Comité Organizador da JMJ. “João Paulo II, na maior parte das vezes que esteve na Polónia, visitou Cracóvia e as pessoas adoraram. Por isso, quando foi anunciado que a Jornada Mundial da Juventude seria aqui, foi algo normal para as pessoas”.

Paulina é polaca, de Cracóvia. Tem como função acompanhar os jornalistas internacionais. Leva-nos às principais atracções da cidade, enquanto nos fala sobre as inúmeras iniciativas que têm decorrido na contagem decrescente para a JMJ: retiros, vigílias, orações, visitas a hospitais. “Têm sido cerimónias com muita gente, às vezes nem se consegue entrar na igreja. As pessoas em Cracóvia são muito espirituais”, conta

A expectativa é grande, sobretudo entre os jovens. “Esta é a primeira geração de jovens polacos que não conviveu directamente com João Paulo II”, lembra Paulina.

Continuamos a visita pela cidade. Em duas ou três horas, percorre-se a pé o centro de Cracóvia. “É bom para os peregrinos, mas tragam um bom calçado”, aconselha Paulina.

Tentamos visitar a catedral, localizada dentro das muralhas do castelo, mas não é possível. É hora de missa e está cheia. Mais à frente, uma outra igreja, novamente hora de missa e também está cheia. Dizem-nos que é assim um pouco por toda a Polónia, sobretudo aos domingos, mas a própria igreja polaca reconhece que está a perder força.

“Existem problemas, mas é exagerado dizer que a Igreja na Polónia está em crise. Há diferenças, entre o Norte e o Sul do país. Por exemplo, aqui no Sul, há uma diocese onde a assistência na missa de domingo ronda os 80%, mas a média do país é de 35%”, admite Stanislaw Dziwisz, arcebispo de Cracóvia. “Esperamos que a Jornada Mundial da Juventude seja um despertar para os jovens, para que regressem aos valores morais e religiosos”, acrescenta.

Do Rio para Cracóvia

“Maio é o único mês do ano em que os polacos não se queixam do tempo”, ouve-se nas ruas de Cracóvia. Daqui a dois meses, quando milhares de jovens invadirem a cidade, provavelmente ouvirão as queixas dos polacos. É demasiado frio no Inverno e demasiado quente no Verão, dizem os próprios.

O brasileiro Gustavo também está mais contente agora, com temperaturas mais amenas. Mas não se queixa do calor que aí vem. Há três anos, venceu o concurso para o logótipo da Jornada Mundial da Juventude do Rio. Trabalhou como voluntário no departamento de design e por lá conheceu Fabíola, com quem casou. Voluntariaram-se novamente e estão há oito meses em Cracóvia, numa espécie de “lua-de-mel em missão”, a ajudar na preparação da JMJ. Ela é jornalista, ele é responsável pelas redes sociais.

Dicas para os peregrinos

A organização espera que cerca de dois milhões de jovens estejam na JMJ. Para já, estão inscritos 600 mil, de 180 países. A Polónia, país anfitrião, lidera o "ranking", com 30%, seguida pela Itália e a Espanha. De Portugal, já se inscreveram mais de 7 mil jovens. A maioria fica alojada em escolas, praças e famílias de acolhimento.

A cidade prepara-se para a enchente. Paulina não tem receios: “Há muita gente que vai de férias nessa altura, já não há aulas, não vai ser assim tão difícil. Uns vão sair para férias e vamos receber outros que vêm cá passar as suas férias e ver o Papa”

A nível logístico, está tudo pensado para facilitar a vida aos peregrinos: a rede de transportes públicos vai ser reforçada, o centro de informações da cidade vai funcionar 24 horas por dia, água potável vai ser distribuída gratuitamente.

“Estamos a trabalhar para que os peregrinos se sintam seguros, confortáveis e alegres durante a JMJ. Estamos certos de que, ao voltarem a casa, vão dizer que Cracóvia é um lugar de pessoas amáveis, uma cidade acolhedora e que merece a pena ser visitada”, afirma Jozef Pilch, governador da região de Malopolska.

Como tal, as principais atracções turísticas da região vão ter horários especiais para os jovens: as famosas minas de sal de Wieliczka têm horário alargado, tal como a Casa-Museu São João Paulo II, em Wadowice.

O campo de concentração de Auschwitz tem dias exclusivamente para visitas dos peregrinos, entre 20 e 28 de Julho e de 1 a 3 de Agosto. É necessário uma reserva prévia, feita "online", e já são poucas as vagas para visita.

A entrada é grátis, mas, por questões de manutenção e segurança, apenas será possível visitar os espaços exteriores, onde será montada uma exposição com fotografias e informação sobre o que é possível ver no interior dos edifícios.

Segurança “no topo das prioridades”

A realização da JMJ em Cracóvia não é consensual. “Há um grupo de críticos que aponta o dedo às despesas com a organização das Jornada e outro que levanta preocupações de segurança”, reconhece Andrezy Kulig, vice-presidente da Câmara de Cracóvia. Só o município vai gastar 50 milhões de zlotis (11,3 milhões de euros) na organização do evento.

Mas é a segurança que mais questões tem levantado. Após os atentados em Paris e Bruxelas, várias notícias avançavam que a JMJ poderia ser cancelada. As autoridades locais garantem que essa hipótese “nunca esteve em cima da mesa” e o discurso oficial é de tranquilidade.

“A segurança está no topo das nossas prioridades”, garante o vice-presidente do município, que acrescenta: “Cracóvia já acolheu várias peregrinações e visitas dos papas João Paulo II e Bento XVI. Passámos o teste de segurança e esperamos fazê-lo novamente este ano." Para a semana da JMJ estão destacados 6.500 polícias e dois mil bombeiros, sem contar com voluntários.

Também o governador da região, Jozef Pilch, garante que está tudo sob controlo. “Estamos preparados para imprevisibilidade do Papa Francisco. O Papa João Paulo II também não seguia o protocolo e as regras preparadas pela segurança. Estamos conscientes disso e preparados.”

As fronteiras polacas serão controladas durante um mês. De 2 de Julho a 2 de Agosto será pedida identificação a quem entrar e sair do país. As autoridades admitem que “pode ser problemático”, devido ao grande fluxo de autocarros com grupos de jovens, que são esperados nessa altura. O aconselhável é ir com tempo e estar preparado para controlo de segurança em vários locais.

Cracóvia recebe mais de 10 milhões de turistas por ano, a maioria durante o Verão. Só na semana da JMJ são esperados quase 1,5 milhões de jovens.