Em entrevista à Renascença e ao jornal 'Público', o líder parlamentar do PS revela que os socialistas colocarão na gaveta a lei de emergência sanitária, que, depois de serenada, precisa de “amadurecer”.
Têm dado entrada no Parlamento vários processos legislativos, entre os quais está um projecto do BE sobre a eutanásia. Já decidiu como irá votar?
O PS vai reapresentar um texto e vai seguramente querer convergir com os proponentes da proposta para a votação final global, eliminando ou dirimindo as questões de inconstitucionalidade que foram levantadas pelo Presidente da República para que volte a ser votado.
Ainda nesta sessão legislativa?
Procuraremos que seja o mais rapidamente possível. Estamos a falar de poder votar até 15 de Setembro de 2022. Anunciarei a forma como vou votar essa iniciativa quando for votada na generalidade. Votarei em consciência em função das minhas convicções nesse momento.
Podemos ver um líder parlamentar do PS a votar desalinhado com o resto da bancada?
Não há disciplina de voto. Há liberdade de voto e é um tema de consciência. Não vou satisfazer a sua curiosidade hoje.
Já disse que o PS teria disponibilidade para reavaliar a lei da nacionalidade e perceber se a regulamentação feita pelo Governo seria suficiente. Quando?
Esperamos muito rapidamente poder fazê-lo, mas temos uma condicionante de calendário evidente [o OE2022]. Temos outro dossiê importante: as ordens profissionais. É uma das nossas obrigações no quadro do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e é um tema que tem atravessado praticamente a última década.
A questão da nacionalidade é particularmente premente porque as questões em torno da utilização de uma parte da lei da nacionalidade (a herança histórica que temos e à relação que temos com a comunidade sefardita) têm suscitado algum alarme social e até alguma incompreensão pela forma como tem sido utilizada para atribuir a nacionalidade portuguesa.
O Governo já fez um bom trabalho ao criar regras mais claras de vinculação a Portugal do cidadão com herança sefardita. Avaliaremos se há algum passo em frente que tenha de ser dado e avançaremos. E há a questão da lei eleitoral, que preocupa todos os parlamentares. Há algum trabalho feito sobre a possibilidade de construir um Código Eleitoral que crie alguma uniformidade e simplificar alguns processos.
E acabe com a necessidade da fotocópia do Cartão de Cidadão nos círculos da emigração?
É uma situação que não pode deixar de despertar em nós uma certa incomodidade.
Mas o PS vai apresentar uma proposta?
Não temos urgência eleitoral.
Em 2019 também não havia e já havia críticas. Em 2021 e 2022 tivemos eleições e voltou o problema.
A expectativa é não ter eleições muito proximamente. E a questão da fotocópia do cartão de cidadão é posta nas legislativas, não teria acontecido o mesmo nas presidenciais. Tivemos um ato eleitoral em que os emigrantes foram votar e que não viram o seu voto validado por não terem cumprido escrupulosamente um procedimento administrativo. Não poderemos voltar a ter legislativas com a lei tal como está.
O PS também já se mostrou disponível para rever o modelo de debates quinzenais. Em que é que está a pensar para renovar este modelo e o tornar mais elástico?
Não perdemos elasticidade. Ficámos muito amarrados à frequência. É essencial garantir é que o Governo no seu conjunto é escrutinado na AR. O acordo celebrado entre o PSD e o PS foi celebrado com o PS como Governo e o PSD como partido da oposição, num quadro em que o PS não tinha maioria absoluta. Isso tinha uma legitimidade acrescida.
O que pode resultar dessa revisão?
É difícil fazer uma avaliação do modelo sem incluir o parceiro, o PSD, e esperaremos para ver qual será a sua posição e depois desenhar o modelo mais adequado para controlar a atividade governativa. Faremos esse debate quando forem objeto de análise as propostas que os partidos têm.
O PS vai apresentar alterações ao OE2022?
Naturalmente, pensámos nisso, mas a resposta é politicamente mais complexa do que dizer que vamos apresentar alterações. O cenário macroeconómico teve um ajustamento, mas este OE é uma obrigação do PS. Teremos um quadro e espaço na especialidade. O PS acompanhará o processo orçamental, mas a mensagem não é o conjunto de alterações que eventualmente pode introduzir.
É sobre a bondade do OE?
É sobre a questão peremptória que estamos a cumprir um compromisso com os eleitores. Este OE foi mostrado na televisão várias vezes como pronto a executar. Contará com propostas do PS em áreas muito diferentes. Aliás, começámos a nossa conversa falando de iniciativas muito concretas que não são aspectos menores.
O que acha acerca do imposto sobre os lucros inesperados que o ministro da Economia admitiu?
O que está em causa é a resposta ao processo inflacionista que tem dois pilares centrais: o custo da energia e das matérias-primas alimentares, em particular os cereais. Não quero excluir à partida nenhuma iniciativa que diz respeito ao Governo. Vivemos um quadro de incerteza, pode haver mais medidas.
E em relação a este imposto?
Não está no quadro orçamental. A discussão sobre instrumentos adicionais poderá ser falada mais para a frente.
O ministro das Finanças já disse que obviamente não haveria nenhum orçamento retificativo. Para si é assim tão óbvio? O OE2023 será o retificativo?
Olhando para o quadro macroeconómico e para a realidade orçamental hoje não se antevê esse cenário. Percebo a resposta do ministro das Finanças e acho que tem razão. Um Governo que apresenta rectificativos sucessivos e que falha as contas é um Governo em que os portugueses perdem confiança. Contas certas e orçamentos estáveis são um bom princípio.