“É frequente sentir que os meus colegas homens são levados mais a sério”, denúncia a artista plástica Ângela Ferreira, uma das 40 artistas cuja obra está patente na nova exposição da Fundação Calouste Gulbenkian. “Tudo o que eu quero” é uma exposição organizada no âmbito do Programa Cultural da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia. Comissariada por Helena Freitas e Bruno Marchand, a mostra reúne duas centenas de obras de 40 mulheres artistas portuguesas.
A exposição traça um diálogo entre a obra das várias mulheres artistas expostas. A começar por um autorretrato de Aurélia de Souza pintado em 1900, a exposição chega ao trabalho das artistas contemporâneas com obras de 2020. Em entrevista ao programa Ensaio Geral da Renascença, Helena Freitas explica que esta “é uma exposição que tenta criar diálogos e que tenta ser uma exposição forte do ponto de vista artístico”.
Além de pintura, a exposição reúne também escultura, desenho, instalação, vídeo, filmes entre outros objetos. Helena Freitas detalha que tentaram apresentar “pequenos núcleos” do trabalho de cada uma das artistas. A ideia diz a curadora é “construir vários sentidos”.
As obras apresentadas provêm de várias coleções e do próprio espólio da fundação. No percurso o visitante encontra nomes incontornáveis da cena artística portuguesa. De Maria Helena Vieira da Silva, a Lourdes Castro, passando por Paula Rego, Ana Vieira, Helena Almeida ou Joana Vasconcelos, cuja obra Noiva está exposta no átrio central da Gulbenkian.
Presentes estão também nomes como Clara Menéres, Rosa Ramalho, Graça Morais ou Gabriela Albergaria. Mas há muitas mais mulheres. Duas delas são Fernanda Fragateiro e Ângela Ferreira que conversaram sobre esta exposição com a Renascença.
Reconhecimento e gratidão pela nova exposição
“É de facto importante tornar mais visível e mais compreensível aquilo que foi a produção do trabalho artístico das mulheres no campo das artes visuais”, diz Fernanda Fragateiro. A artista que está representada na nova exposição da Gulbenkian com diversas obras lembra que “durante praticamente todo o século XX foi dada visibilidade a uma produção quase exclusivamente masculina”.
Também em sintonia, outra artista representada na exposição, e da mesma geração, Ângela Ferreira afirma que “a questão de género que a exposição tenta corrigir, é uma questão real”. A artista, que já representou Portugal na Bienal de Veneza em 2007, sublinha que a “presença das mulheres no panorama artístico, nacional e internacional, é ainda abundantemente inferior ao dos homens”.
E mesmo Ângela Ferreira, que se diz “uma mulher artista que circula com algum conforto no panorama contemporâneo”, sente muitas vezes que os seus “colegas homens são levados mais a sério”. Também Fernanda Fragateiro que reconhece que, nos últimos 10 a 20 anos, se começou a dar maior visibilidade às mulheres artistas diz que é por isso “muito importante” que a Gulbenkian faça esta exposição.
“No fundo não é uma exposição de mulheres, mas sim, uma exposição de obras que foram criadas por mulheres ao longo do século XX e se calhar vamos descobrir coisas que não conhecíamos”, sublinha Fernanda Fragateiro à Renascença. Também Ângela Ferreira diz esperar que “ações como esta permitam que avancemos num trajeto constante em direção a uma igualdade de género na representação dos museus, das coleções, livros, antologias e histórias de arte escritas e apresentadas nas escolas”.
A exposição deve o seu título a uma mulher. “Tudo o que eu quero” é uma frase inspirada em Lou Andreas-Salomé, uma autora que desenvolveu diversas reflexões sobre o lugar das mulheres no espaço social, intelectual, sexual e amoroso dos últimos séculos.
A mostra vai estar patente até 23 de agosto das 10h00 às 18h00. Encerra às terças-feiras.