O secretário-geral da ONU, António Guterres, espera que a evacuação do complexo industrial de Azovstal, na cidade ucraniana de Mariupol, possa acontecer na sexta-feira.
António Guterres, em declarações aos jornalistas portugueses à chegada a Kiev, fala numa situação dramática na fábrica cercada há várias semanas pelas tropas russas, onde se encontram centenas de civis e militares ucranianos.
"Neste momento estão a decorrer negociações entre as Nações Unidas, a Cruz Vermelha, a Rússia e a Ucrânia no sentido de ver as modalidades concretas para a evacuação. A evacuação é muito complexa, houve um acordo de princípio do Presidente Putin e ficou acordado que os detalhes seriam discutidos nas reuniões que estão a decorrer", declarou o secretário-geral da ONU.
"Esta operação é em relação ao complexo industrial de Azovstal e nós esperamos que se encontre uma solução de acordo entre todos para que se possa realizar uma operação humanitária que tem um valor extraordinário. Imaginem o que é um conjunto de mulheres e crianças em bunkers no escuro, desprovidos de tudo e no meio de uma guerra. É a prioridade das prioridades. É assim entendido pelo governo ucraniano e por nós e esperamos que os contactos tenham êxito. O nosso objetivo era fazer esta operação na sexta-feira, mas é preciso que as condições estejam criadas para assim fazermos.”
Mediação política da ONU?
Questionado pela Renascença, se Rússia está disponível para aceitar esforços de mediação política da ONU, António Guterres responde que "não houve aceitação".
“A mediação política do conflito é uma mediação na qual a ONU não está integrada e desde o início não houve aceitação das Nações Unidas nessa mediação política. É uma posição muito clara que vem dos Acordos de Minsk, que vem do formato Normandia, em que as Nações Unidas nunca foram convidadas a participar. Essa não é uma questão que me preocupe excessivamente. Temos acompanhado essas negociações", declarou o secretário-geral.
António Guterres admite que, neste momento, as negociações entre Rússia e Ucrânia estão num impasse, mas espera "que um dia a paz regresse a estas terras".
Nuclear "impensável"
Sobre as alusões da Rússia a uma guerra nuclear, feitas esta semana pelo ministro dos Negócios Estrangeiros Sergei Lavrov, Guterres não quer acreditar nesse cenário extremo.
“Eu creio que ele não fez uma ameaça. Todos nós temos que trabalhar para que uma hipótese dessas seja completamente impensável”, declarou.
O secretário-geral da ONU esteve ontem reunido com o Presidente russo, Vladimir Putin, e faz um balanço do encontro ao mais alto nível.
“Nunca são conseguidos todos os objetivos. Este é um processo em que… Quantas e quantas pessoas visitaram o Presidente Putin. Eu tenho a humildade de entender que posso dar um contributo, mas também tenha a humildade de perceber que não consigo chegar a uma sala e convencer o Presidente Putin de tudo aquilo que não corresponde, de todo, à posição que a Rússia tem nesta questão. O meu contributo é ser um mensageiro de paz e tentar ajudar a resolver alguns dos mais difíceis problemas pendentes", afirmou.
“Intervenção da ONU tem sido permanente"
Questionado se reuniões em Moscovo e Kiev podem marcar uma mudança no sentido de uma maior intervenção da ONU no conflito, António Guterres aproveitou para responder aos críticos.
“A intervenção da ONU tem sido permanente. Nós temos 1.400 pessoas a trabalhar na Ucrânia, mais de 3 milhões de ucranianos já receberam apoio humanitário das Nações Unidas. Eu, desde a primeira hora, tenho expressado com clareza as posições das Nações Unidas. E tenho mantido contactos regulares com todos aqueles que estão envolvidos nas negociações."
"Entendi que este era o momento em que, na minha apreciação das dificuldades que se estão a atravessar com uma batalha tremenda no Leste da Ucrânia, falhado o apelo a um cessar-fogo na Páscoa, entendi que este era o momento de fazer um esforço ainda mais visível e por isso escrevi aos presidentes da Ucrânia e da Rússia", sublinhou o antigo primeiro-ministro português.
Sobre a reunião de quinta-feira com o Presidente ucranianos, Volodymyr Zelenskiy, António Guterres não abriu o jogo nestas declarações aos jornalistas portugueses em Kiev.
"Se não se importa, não vou dizer a si o que vou dizer amanhã ao Presidente Zelenskiy, porque eu não quero que o Presidente me diga quando eu chegar: 'já sei o que me vai dizer' e como ele vê a RTP todos os dias isso seria prejudicial para o resultado do encontro”, conclui o secretário-geral da ONU.