O líder do PSD e da coligação PAF, Passos Coelho, tem uma noção muito irónica sobre o momento certo para esfolar coelhos. Em 2014, lembrava-nos que “não devemos esfolar um coelho antes de o caçar”, disse agora mais o menos o mesmo durante a campanha, a propósito da hipotética composição de um futuro Governo.
Registem-se duas coisas. A primeira é a de que tem sentido de humor, e isso é sempre uma qualidade apreciável. A segunda é que foi um gesto generoso, porque o conselho de não gritar vitória antes de tempo é dos mais avisados, até para os seus adversários. E tanto mais avisado quanto já só faltam dias, e não meses ou sequer semanas, para chegarmos ao dia das eleições.
Naturalmente, as “coisas” começam a sedimentar e as placas tectónicas vão estabilizando. As sondagens e essa coisa nova das tracking polls saem agora diariamente, ou várias por dia. Todas dizem algo, embora “dizer” seja uma forma de “dizer”: as sondagens são mudas e só dizem aquilo que as fazemos dizer.
Mas “dizem”, nisso todos concordam, que continua o empate técnico entre coligação e PS. E não deixam além disso de “dizer” que, como tendência, o PAF está à frente.
O PS tem, agora, duas hipóteses.
A primeira é não alterar nada, considerar que a estratégia de campanha até agora seguida é a suficiente para, mais dia, menos dia, inverter a tendência negativa, passar de vez para a frente e ganhar no dia 4 de Outubro.
A segunda é achar que nem tudo está a ser eficaz, justificando-se afinar a estratégia e reforçar a conquista de votos ao centro (porque, aí, cada voto retirado ao adversário vale por dois). E, é claro, deixar o apelo ao voto útil para o lavar dos cestos.
Para evitar isto, o PP e o PSD são, nesta fase final de campanha, os maiores fãs do Bloco de Catarina Martins e da CDU de Jerónimo de Sousa. Catarina, dizem eles, você é grande, tem sido fantástica, mas que maravilha de campanha! Jerónimo, você é de facto admirável! O Bloco e a CDU estáveis são, de facto, o seguro de vida do PAF, sobretudo se o PS não se mostrar mais combativo a convencer o eleitorado da esquerda mais pragmática.
É a lei do mercado do eleitor. O BE e a CDU são as boutiques que lutam para impedir o hipermercado PS de lhes roubar a clientela. Detestam-no, por isso, mais do que ao outro hipermercado, da direita e do PAF, porque esse se destina a uma clientela demasiado diferente.
O PS não tem vida fácil: além de lutar com estas boutiques aguerridas, tem ainda pela frente o outro hipermercado PAF. Duas frentes, duas estratégias distintas que é preciso conciliar num discurso uniforme e coerente. É uma empreitada difícil e exigente. Até porque o PAF só tem uma frente de batalha, e não haveria pior erro do que continuar a subestimá-lo. Subestimá-lo, dirão? Sim, é tal e qual como disse Passos Coelho: esfolar o coelho antes de o caçar. E poder, afinal, acabar esfolado por ele.