05 out, 2016 - 18:00
Católico, engenheiro, aluno brilhante, empenhado nas causas sociais. Eis algumas das características do homem que deverá liderar, a partir de Janeiro, uma casa que conhece bem: as Nações Unidas. O antigo primeiro-ministro português foi indicado esta quarta-feira como secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) pelo Conselho de Segurança à Assembleia-geral, que deverá aprovar o seu nome dentro de alguns dias.
O Conselho de Segurança anunciou esta quarta-feira que o português é o “vencedor claro” da votação, recebendo 13 votos de encorajamento (em 15 votos), sem qualquer veto.
Este órgão, com poder de veto, deverá aprovar na quinta-feira uma resolução a indicar o nome de António Guterres para a Assembleia-Geral das Nações Unidas, formalizando assim a eleição do sucessor de Ban Ki-moon.
O reformador do ACNUR
Guterres chega à chefia da ONU depois de ter chefiado o Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), entre Junho de 2005 e Dezembro de 2015, uma organização com cerca de 10 mil funcionários em 125 países.
Em 2007, ainda longe do pico da crise de refugiados, dizia aos microfones da Renascença que o século XXI seria "o século do povo em movimento".
De acordo com a sua biografia oficial, promoveu “uma profunda
reforma estrutural” no ACNUR, reduzindo o número de funcionários em 20% na
sede, em Genebra, enquanto triplicou o volume de actividades do organismo, num
mandato marcado por algumas das maiores crises de refugiados e deslocados das
últimas décadas, nomeadamente devido aos conflitos na Síria, Iraque, Sudão do
Sul, República Centro-Africana e Iémen.
Na corrida à liderança da ONU, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, apelidou-o como “o melhor de todos nós”, enquanto o Governo português considerou que a apresentação da sua candidatura era “um imperativo, num tempo em que, mais do que nunca, é urgente mobilizar o mundo em prol da paz e da segurança, dos direitos humanos e do desenvolvimento sustentável”.
António Guterres chega ao cargo depois de uma campanha que se iniciou em Fevereiro, numa corrida em que foram introduzidas algumas novidades para procurar garantir maior transparência do processo. Todos os candidatos participaram em debates e audições públicas promovidas pela Assembleia-Geral das Nações Unidas, à excepção da búlgara Kristalina Georgieva, que só se juntou à corrida na semana passada e foi ouvida publicamente na segunda-feira.
Católico, aluno brilhante
António Manuel de Oliveira Guterres, 67 anos, nasceu a 30 de Abril de 1949 na freguesia de Santos-o-Velho, em Lisboa. Passou a infância entre a capital e a terra-natal da mãe, Donas, na Beira Baixa.
Aluno brilhante, em 1965, entra para o curso de Engenharia Electrotécnica no Instituto Superior Técnico, licenciando-se em 1971, com a classificação final de 19 valores.
Profundamente católico, envolve-se, nessa altura, nas discussões religiosas e sociais do “Grupo da Luz”, que integrava, entre outros, Helena Roseta e Marcelo Rebelo de Sousa. Nesse grupo, conhece também o padre Vítor Melícias que, em 1972, celebra o seu casamento com Luísa Melo, um ano depois de terminar o curso. Tiveram dois filhos, Mariana e Pedro. Luísa Melo morreu a 28 de Janeiro de 1998, vítima de cancro.
Nesse mesmo ano, pela mão de António Reis, filia-se no Partido Socialista, abandona a carreira universitária e inicia uma longa carreira política. Chega ao parlamento português em 1976 e é deputado ao longo de 17 anos, chegando a líder da bancada socialista.
O primeiro-ministro que quis evitar o "pântano"
Em 1992, disputa a liderança do PS com Jorge Sampaio, ganhando as eleições ao agora Presidente da República, então “a braços” com uma pesada derrota nas legislativas de 1991.
Depois de assumir a liderança do PS, consegue cativar uma franja importante da sociedade civil naquilo que ficou conhecido como os Estados Gerais da Nova Maioria e gerou uma forte expectativa no País.
Contudo, só em 1995 consegue a sua grande vitória eleitoral, pondo fim a 10 anos de governação de Cavaco Silva, e chegando ao poder numa eleição em que teve como principal adversário Fernando Nogueira.
Começa aqui a sua caminhada de seis anos à frente do Governo, que irá terminar na noite de 16 de Dezembro de 2001, ao demitir-se após a derrota eleitoral do PS nas eleições autárquicas, decisão que justificou com a necessidade de evitar que o país, “num momento de crise internacional” caísse num “pântano político”. “É meu dever, perante Portugal, evitar esse pântano político”, afirmou na altura.
Foi presidente da Internacional Socialista entre 1999 e 2005, de onde saiu para o ACNUR.
Ao longo da sua vida, manteve sempre iniciativas no campo da solidariedade: fundou o Conselho Português para os Refugiados e a Associação para a Defesa do Consumidor (Deco), tendo ainda presidido ao Centro de Acção Social Universitário, uma associação responsável por projectos de desenvolvimento social em bairros desfavorecidos em Lisboa.
Guterres voltou a casar em 2001, com Catarina Vaz Pinto.