18 jan, 2016 - 18:38 • Marília Freitas
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“Abram alas para o Tino”, ouve-se no meio do reboliço. O Mercado do Bolhão, no Porto, entra em alvoroço. Vitorino Silva, ou Tino de Rans, vem ao volante da “Vito-rino”, a sua carrinha de campanha. A comitiva é composta pela filha, a assessora, os dois fotógrafos e pouco mais. Mas rapidamente fica rodeado de gente. Chegou o “soldado Silva”, cognome dos tempos da tropa que Tino recuperou nesta campanha.
Tino não descura ninguém. Pára em todas as bancas, cumprimenta toda a gente, distribui beijinhos e “santinos” (os panfletos de campanha), até pelos turistas.
Em 1999, Tino de Rans saltou para a ribalta com uma intervenção no congresso do PS, era então primeiro-ministro António Guterres. O discurso apaixonado - "Pelo amor de Deus, não durmam à sombra da laranjeira!" - deixou muitas bocas abertas e arrancou sonoras gargalhadas e aplausos no Coliseu dos Recreios, em Lisboa.
Tino utiliza esta sua memória política como arma e recupera o momento nas suas redes sociais de campanha.
- Tino, vais ter de terminar o teu discurso, o tempo já acabou.
- Desculpe lá, doutor Almeida Santos mas metade do meu tempo foram em palmas.
Mais tarde, foi estrela de "reality shows". Uma imagem da qual não se consegue desvincular, nem quer. “Foi uma coisa que aconteceu, não posso apagar”, diz-nos durante a acção de campanha.
Com 50 mil euros, o orçamento mais baixo de todos os candidatos à Presidência da República, Vitorino Silva “conta os trocos”. “Vou ficando em casa de amigos por esse país fora, almoçando em casa de amigos. Mas vamos conseguir ir a todo o lado”.
E até já foi a Bruxelas. Só não poupa em beijinhos e no apelo ao voto.
O "ladrão de histórias"
Jorge Sequeira não é tão popular como Tino, mas também já há quem o reconheça. Acontece que, uma vez por outra, o psicólogo de óculos coloridos ainda tem que se apresentar. “Não me conhece? É compreensível, eu não sou nenhum artista de novela, não sou nenhum cantor conhecido, como o Tony Carreira”, explica a uma das utentes do Centro Social e Paroquial Padre Ângelo Ferreira Pinto, em Matosinhos.
Intitula-se um “ladrão de histórias”. Deste centro social, conta que “roubou”, pelo menos, duas. A de um senhor de 100 anos cheio de vontade de ir votar e a de um beijinho especial. “Foi a primeira vez que pediram um beijinho na campanha”.
O psicólogo distribui elogios e cumprimentos. Uma cozinha cheia de tachos inspira mais um momento de boa disposição: “Sabe o que é que é isso da política? É o tacho!” Jorge Sequeira recusa chamar-lhe piada ou graçola, prefere “optimismo”, transmissão de “ânimo e de sorrisos”. E garante que não é truque de psicologia.
Uma campanha sem "aparelho"
Cândido Ferreira não tem o mesmo aparato. Sem máquina de campanha, sem carrinha e até sem panfletos, por vezes aparece apenas acompanhado pelo assessor. É o caso de uma acção de campanha na Universidade de Aveiro, onde se reuniu com o reitor. Aqui não há bancas de fruta, nem cozinhas, nem povo para distribuir beijinhos. Além do reitor, apenas jornalistas que esperam por uma declaração.
Em tom de brincadeira, diz que é um “soldado desconhecido”. Admite que ainda não conseguiu “criar uma onda capaz de ser vencedora”. Porém, como bom coleccionador, garante que a campanha tem servido para coleccionar “muita energia, muitos amigos e muitos apoios”.
Tempo é dinheiro?
Apesar de ser o candidato com mais rendimentos - quase 3 milhões de euros, de acordo com a declaração entregue ao Tribunal Constitucional -, Cândido Ferreira tem um dos orçamentos de campanha mais baixos: 60 mil euros.
“É uma campanha pobre”, afirma. Em duas semanas há oportunidade apenas para três jantares com apoiantes, apesar de o candidato ser um confesso amante da gastronomia.
A agenda deste médico-candidato não é, aliás, muito preenchida. O dia-a-dia de campanha de Cândido Ferreira começa a meio da manhã e termina por volta das 16h00. Campanha em "part-time", mas preenchida em ataques aos adversários: lançou dúvidas sobre o percurso académico de Sampaio da Nóvoa e sugeriu que Maria de Belém desistisse da corrida, por ter "acumulado" o ordenado de deputada com "avenças de privados".
Recusa, porém, que esta seja “uma candidatura de terceira” e critica quem “divide os candidatos” por categorias. Foi por isso que abandonou o primeiro debate televisivo e recusou participar nos outros. “Tinha menos de um décimo do tempo de antena da maior parte dos candidatos e nem podia debater com quatro ou cinco deles”, afirma.
Também Jorge Sequeira não se dedica a tempo inteiro à campanha. Calculou os custos em 123,5 mil euros e, apesar de ter um orçamento superior ao de Cândido Ferreira e de Vitorino Silva (e até ao de Paulo Morais), continua a trabalhar e a dar palestras, mesmo em período de campanha. “Não me posso dar ao luxo de não trabalhar durante um mês. Eu vivia de quê?”
O que move estes candidatos?
Os três garantem ser homens de causas. Querem um país diferente e melhor. Os três garantem que não vão desistir. E cada um deles está convicto de que é o melhor adversário de Marcelo Rebelo de Sousa.
Jorge Sequeira diz-se militante do “partido da honestidade e do trabalho”. Adepto do Sporting de Braga, psicológo de formação, acha que “é mais importante perceber do comportamento humano do que perceber de PIB”. Na vida profissional, divide-se entre o ensino universitário e cursos de motivação pessoal e adaptou a linguagem do "coaching" à campanha presidencial.
Desafiado pela Renascença, o psicólogo Jorge Sequeira analisou o candidato Jorge Sequeira. "Se o sentasse no divã, dizia-lhe assim: 'Oh pá, tu não achas que é muita areia para a tua camioneta?'" E o que responderia o candidato?
Já reconheceu, mais do que uma vez – inclusive no debate com Marcelo Rebelo de Sousa – que há pessoas muito mais capazes do que ele para Presidente da República.
Ainda assim, Jorge Sequeira recorre a uma citação de Stéphane Charbonnier, antigo director do "Charlie Hebdo", que morreu no ataque ao jornal, em Janeiro de 2015: “Prefiro morrer de pé, do que viver de joelhos”.
Calceteiro de profissão, Vitorino Silva afirma-se como o “candidato mais próximo do povo” e as acções de rua comprovam essa proximidade, desde o início. Cerca de metade das assinaturas foram recolhidas nas praias do Algarve, durante as férias. Agora, já em plena campanha, promete um “tinosunami” para “não desiludir as pessoas”.
Considera que a presidência da Junta de Freguesia de Rans, em Penafiel, lhe deu “experiência política” para se candidatar ao mais alto cargo da nação. Quer, por isso, voltar a “estar ao lado dos peixinhos”, porque, afirma, “se os peixinhos conseguirem deixar de ser comida para os tubarões, os tubarões morrem à fome”.
Em entrevista à Renascença, defendeu alterações nas regras democráticas para que “os cidadãos normais” se possam candidatar a deputados da Assembleia da República. “Posso candidatar-me a Presidente da República e não posso candidatar-me a deputado. Porquê?”
Cândido Ferreira apresenta-se como independente. Filiou-se no PS em 1974 e, dois anos depois, foi mandatário para a juventude de Ramalho Eanes, então candidato à Presidência da República. Desvinculou-se do partido, mas voltou em 1982. Em 2011, contestou a liderança de José Sócrates e acabou por demitir-se de todas as funções no PS.
Agora, o médico quer “devolver a alegria de viver ao povo português”. "A minha principal fonte de inspiração é Manuel de Arriaga, um Presidente que marcou a implantação da República pelo seu humanismo, sensatez e singeleza", escreve na página oficial.
Durante a apresentação da candidatura, prometeu uma reforma dos serviços da presidência, nomeadamente uma "redução drástica" dos custos de funcionamento. Defende ainda uma Presidência da República “mais austera e, ao mesmo tempo, mais afectiva”, garantindo que não está disposto a desistir de uma “luta por princípios e por causas”.
Os três candidatos vão diferindo mais na forma como se apresentam do que no posicionamento ideológico. Garantem que é por cidadania que concorrem a Belém e não por valorização pessoal. Cândido Ferreira, Vitorino Silva e Jorge Ferreira acreditam que podem ser úteis ao país.
Sem apoios partidários, afirmam-se como candidatos independentes e não abdicam da convicção de que podem disputar uma segunda volta, mesmo que as sondagens apontem no sentido contrário.
De acordo com o último estudo da Eurosondagem para a SIC e o “Expresso”, Cândido Ferreira, Vitorino Silva e Jorge Ferreira serão os três candidatos menos votados. A projecção aponta para que cada um obtenha 0,2% dos votos.