20 jan, 2021 • Cristina Nascimento , André Peralta (sonorização)
O WhatsApp anunciou uma alteração da sua política de privacidade que foi mal recebida pelos seus utilizadores. Desde o anúncio feito pela plataforma de mensagens, no início de janeiro, os serviços similares mais populares – Signal e Telegram – ganharam milhares de novos utilizadores.
O impacto foi de tal forma significativo que o WhatsApp acabou por adiar de 8 de fevereiro para 15 de maio a entrada em vigor das novas regras e procurou esclarecer melhor o que estava em causa: alegadamente uma transferência automática de dados entre o WhatsApp e o Facebook.
Ouvido pela Renascença, Anselmo Costa Freitas, advogado especialista em proteção de dados, considera que a reação dos utilizadores foi “desproporcionada” e garante que, na União Europeia, a lei de proteção de dados impede uma “transferência automática” de dados.
A mudança de política de dados anunciada pelo WhatsApp é profunda?
Eu penso que não houve propriamente uma mudança significativa. Estão realmente previstas alterações aos termos de utilização do WhatsApp, mas essas alterações não me parece que vão ter o alcance que tem sido falado e que tem gerado todo esse movimento. Parece-me que ou as coisas não terão sido bem comunicadas ou houve aqui uma reação que me parece um pouco desproporcionada.
Mas vai alguma coisa mudar, de alguma forma?
Os receios prendem-se com a possibilidade de transferência de dados do WhatsApp para o Facebook. Isto dito com esta simplicidade é uma coisa que não me parece que irá suceder. Aquilo que está em causa tem a ver com a presença de empresas e de mensagens empresariais no WhatsApp, a possibilidade do armazenamento essas mensagens, por um lado, e, depois, a interação que essas mensagens de ditas empresariais poderá ter com a publicidade do Facebook. Simplesmente tudo isto é opcional, nunca será obrigatório. Um utilizador do WhatsApp terá sempre a opção de receber estas mensagens de caráter empresarial e, portanto, não ne parece que vá haver uma transferência de dados automática entre o WhatsApp e o Facebook, transferência essa que, de resto, também nunca seria permitida de forma automática à luz da legislação europeia de proteção de dados que temos em vigor.
Há diferenças entre a legislação dos EUA e da Europa?
De facto, os Estados Unidos têm uma legislação de proteção de dados menos restritiva do que nós e existe transferência de dados do WhatsApp para o Facebook para efeitos comerciais. Isto na Europa não é possível, não seria nunca possível sem o prévio consentimento do utilizador, o utilizador teria sempre que dar o seu Consentimento e teria sempre que ter a possibilidade de se opor a essa transmissão de dados.
Se recebermos a mensagem, a pedir autorização para a mudança de politica de dados, o que devemos fazer?
Essa mensagem tem que me dar ou opção de me opor à transmissão de dados do WhatsApp para o Facebook. Isso é uma transmissão que não pode ocorrer sem o meu consentimento.
E se não aceitar, fico impedida de usar o WhatsApp?
Espero que não, porque isso seria, em meu entender, ilegítimo. No espaço europeu, não posso condicionar a prestação de um serviço ao consentimento à transferência de dados pessoais para uma outra entidade. Não posso condicionar a prestação de um serviço a esse tratamento dados pessoais, a não ser que demonstrasse que esse tratamento de dados pessoais era essencial à continuação da prestação de serviço e que sem isso eu não consigo continuar a prestar o serviço, o que neste caso concreto tenho muita dificuldade em conceber que isso possa acontecer, Não vejo que a continuação da prestação do serviço do WhatsApp dependa da transmissão de dados para o Facebook não vejo que uma coisa esteja tecnicamente dependente da outra. Portanto eu diria que, se ao recusar, me for impossibilitada a continuação de utilizar o Whatsapp, eu julgo que estaríamos perante uma prática ilegítima que viola o regulamento geral da proteção de dados.