03 jun, 2023 • Ana Catarina André
Trabalhar num dos principais centros tecnológicos do mundo é encontrar “sempre alguém interessado em fazer mais e melhor”, afirma a portuguesa Joana Carrasqueira que, aos 33 anos, integra os quadros da Google, em Silicon Valley, nos Estados Unidos.
Em entrevista ao podcast Bolsa de Futuro, esta responsável pela introdução de novos produtos de "machine learning" destaca o “pragmatismo” da cultura empresarial em que está inserida. Com reuniões de trabalho normalmente com 30 minutos, diz que há “pouco espaço para opiniões que não sejam fundadas em dados concretos”.
“Quantas vezes em Portugal e noutros países agendamos uma reunião para tomar uma decisão relativamente à reunião anterior? Isso é algo que aqui não vejo. Aqui, tomamos decisões. Se foi a correta, ótimo. Se foi a errada, para a próxima vamos melhorar.” E sublinha: “Errar está no DNA de Silicon Valley”.
Depois de se licenciar em Portugal, em Ciências Farmacêuticas, Joana Carrasqueira emigrou para a Holanda, onde trabalhou quatro anos na Federação Internacional dos Farmacêuticos. Passou depois por Espanha, onde fez o MBA, e daí seguiu para os Estados Unidos. A curiosidade para “resolver problemas em grande escala” levou-a a interessar-se pela inteligência artificial e a mudar o rumo da carreira.
Hoje, e já na área tecnológica, tem especial interesse pelas questões associadas à produtividade, “por causa do impacto que podem ter na vida das pessoas”. E deixa alguns exemplos: “[Podemos] ter novos sistemas que nos ajudem a tirar notas durante uma reunião, que façam a transcrição do que se diz, em tempo real, e que, no fim, enviem um email para as pessoas com o follow-up”.
Desde que chegou à Google, Joana Carrasqueira já esteve envolvida em vários projetos de preservação ambiental. Num deles, foi possível fazer, com recurso à tecnologia, o mapeamento da barreira de coral da Austrália que estava, então, a morrer. “Existe uma grande variedade de fauna e flora que, para um cientista identificar manualmente, demora muito tempo”, diz, explicando que o sistema de "machine learning" conseguiu perceber quais eram os animais que estavam a ter um papel negativo naquele ecossistema. Com esses dados, os cientistas conseguiram direcioná-los para outros habitats, permitindo que o coral voltasse a ficar saudável.
"São lições aplicáveis a todos os tipos de coral do mundo e com isso conseguimos resolver grandes problemas a uma escala mundial”, sublinha a especialista.
Joana Carrasqueira destaca também outro projeto da Google, que permitiu saber quantos coalas restaram após os incêndios de 2020 e 2021, na Austrália. “Detetámos onde estavam os animais e quantos eram. Toda esta informação foi depois dada aos especialistas, o que é realmente uma ajuda para fazer grandes trabalhos de conservação natural.”
Diante do perigo que as novas gerações enfrentam por “só conhecerem o digital”, a especialista defende que “o sistema educativo tem de se transformar”.
“Os alunos têm de aprender a utilizar a informação e não só a memorizá-la”, considera. “Precisamos de perceber como utilizar a tecnologia e ensinar competências”, refere.
Assumindo-se como “embaixadora da tecnologia”, a responsável da Google não acredita que nos vamos desumanizar com o crescimento das redes e do mundo virtual. “Penso que temos oportunidade de sermos mais empáticos com o próximo e é isso que gosto de pensar que a tecnologia nos vai trazer", conclui Joana Carrasqueira.