10 jul, 2023 • Paulo Cardoso do Amaral
O ChatGPT está na ordem do dia, e nada nos preparou para o que estamos agora a começar a viver com os LLM (Large Language Models), uma tecnologia verdadeiramente extraordinária e agora ao alcance de todos.
A World Wide Web já tinha incrementado significativamente o nosso acesso à informação, criando um mundo onde os motores de busca foram a tábua de salvação para não nos afogarmos na sua extrema abundância.
Serviços de pesquisa gratuitos como o Google tornaram a Web mais próxima de todos nós, enquanto encheram os seus próprios bolsos. É que esses serviços são especialistas em apresentar os links certos para ampliar as suas audiências, multiplicando assim as suas receitas de publicidade. Não obstante, os consumidores têm demonstrado a sua satisfação ao usar gratuitamente serviços de pesquisa que se tornaram indispensáveis.
A própria Google já andava há anos a pesquisar sobre a forma de fornecer conhecimento adicional ao consumidor interpretando as suas necessidades, mas sempre sem colocar em causa o tal ciclo abundante de links.
Uma das ajudas tem passado por tentar adivinhar o que o consumidor vai escrever a seguir, não só para lhe poupar tempo, mas sobretudo para enriquecer a sua pesquisa. Outra das ajudas tem passado por utilizar os célebres cookies de forma a caracterizar os consumidores para lhes fornecer os conteúdos mais adequados, numa estratégia nada inocente para aumentar a fidelização, e, portanto, a dimensão das audiências, e com ela o lucro.
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Porém, com o ChatGPT, tudo vai agora mudar. Uma das primeiras grandes consequências desta nova tecnologia é a quebra do ciclo de pesquisa e da abundância de links. É que o ChatGPT consegue representar matematicamente o conhecimento, incluindo a linguagem, pelo que é capaz de responder a perguntas através da destilação dos conteúdos de uma miríade de links, muitos mais do que seria possível para nós aceder atempadamente de outra forma. E com a quebra deste ciclo, os motores de busca começam a ver vacilar o seu modelo de negócios. Além disso, por ser uma disrupção, nenhum incumbente se atreveria a desenvolver este novo tipo de oferta destruindo assim a sua atual proposta de valor.
Para começar, serão os consumidores os primeiros a ganhar imenso com a manipulação direta do conhecimento. É que, mais do que responder a perguntas, o ChatGPT também é capaz de autênticos atos de criação, como é, por exemplo, o caso incrível dos poemas, ou das imagens.
Se a utilização inicial do ChatGPT é a do deslumbramento pelas novas capacidades ao serviço dos consumidores, o passo seguinte será a descoberta das novas propostas de valor possíveis com recurso a esta tecnologia.
O mesmo processo já tinha ocorrido com a Web, e o resultado está à vista. No entanto, desta vez, o impacto no tecido económico vai ser substancialmente maior, uma vez que estamos a falar de facilitar o acesso ao conhecimento e não apenas aos dados e à informação.
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É importante também referir que uma das funcionalidades que o ChatGPT disponibiliza desde o seu início é a sua interface para integração em aplicações informáticas. Consequentemente, começaremos agora a ver o conhecimento crescer em flecha nas aplicações que puderem beneficiar disso. A importância estratégica do conhecimento continuado a crescer, como podemos constatar no exemplo significativo das Big Tech.
Há mais de 20 anos, as bases de dados dessas empresas têm sustentado a criação de efeitos de rede subjacentes aos monopólios naturais, permitindo-lhes obter rentabilidades sem precedentes. Esse tipo de conhecimento específico é construído de forma interativa em colaboração com os utilizadores e não pode ser copiado, o que o torna de imenso valor estratégico. No mundo do conhecimento com efeitos de rede, quem começa esse ciclo primeiro tem a vantagem competitiva (em inglês, first mover’s advantage).
Assim como as "Big Tech" se transformaram em plataformas, permitindo o florescimento de ecossistemas com uma miríade de outras entidades ao seu redor, o mesmo acontecerá com os LLM. É por isso que a transformação digital dependerá das empresas e setores mais empenhados.
O primeiro passo para uma transformação digital bem-sucedida será descobrir como incrementar a proposta de valor com base nas plataformas já disponíveis para todos, e isso terá impacto nos processos de negócio. Além disso, a alteração dos custos de acesso ao conhecimento também criará novos actores na cadeia de valor.
Portanto, talvez seja hora de revisar as propostas de valor e as estratégias de negócio de cada empresa que possa se beneficiar do ChatGPT e do seu conhecimento, sempre considerando a evolução do seu próprio ecossistema.