22 jan, 2022 • Marina Pimentel
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O presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) não acredita que haja empenho do Estado em fazer decidir em tempo útil os Tribunais Administrativos e Fiscais, onde há decisões que demoram mais de uma década, e diz que o PSD quer colocar um "cabresto" ao Ministério Público. A uma semana das eleições legislativas, as propostas dos partidos para a Justiça estiveram em análise no programa Em Nome da Lei, da Renascença.
Embora seja uma promessa eleitoral dos dois maiores partidos, PS e PSD, Adão Carvalho sublinha que estão em causa tribunais onde os cidadãos lutam contra o arbítrio do Estado e daí “ter muitas dúvidas” de que um problema que se arrasta há anos seja agora resolvido.
O magistrado fala numa outra ameaça à independência destes tribunais: os juízes são apoiados por peritos que fazem parte da máquina do Estado. “Esta dependência”, diz, “faz com que os processos não andem com a celeridade devida”.
Mas a morosidade das decisões nos tribunais onde os cidadãos podem litigar contra o Estado não resulta só da penúria de meios, diz o bastonário da Ordem dos Advogados.
"A preocupação é colocar no Ministério Público um cabresto"
Menezes Leitão fala de “uma plataforma informática completamente obsoleta”. E recorda que “há uma semana, o SITAF [Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais] esteve bloqueado durante três dias”.
O bastonário diz que “todos os advogados se queixam” e defende que “o mau funcionamento da plataforma informática é também uma razão para o descrédito dos Tribunais Administrativos e Fiscais”.
Menezes Leitão afirma que a maior parte das propostas eleitorais não está focada no que é decisivo, nomeadamente as dos dois principais partidos políticos.
O bastonário considera que, além do problema da morosidade, a prioridade deve ser baixar as custas judiciais que, na prática, impedem a maioria dos portugueses de beneficiar de um direito que a Constituição lhes garante.
"O principal problema da Justiça neste momento, além da morosidade e ineficiência, é os elevados custos que tem. Temos uma Justiça cuja esmagadora maioria dos cidadãos está arredada, ou porque não é indigente e não beneficia dos apoios judiciários ou nem tem dinheiro para pagar as elevadas custas judiciais."
A Ordem dos Advogados considera "especialmente preocupante" a posição do PS, "que vem dizer que a redução das custas judiciais só ocorrerá nos casos em que não há alternativa ao litígio".
A ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, tinha prometido uma redução das custas judiciais em função da complexidade do processo e da condição económica do autor da ação. Mas o programa eleitoral do PS faz tábua rasa dessa promessa e compromete-se agora apenas a baixar as custas quando tenham valor excessivo e quando não haja forma alternativa de resolução de litígios.
"Essa alternativa existe sempre, pelos menos, em relação aos foros civis, no direito civil, e isso significa que não vai haver redução das custas judiciais e a resposta que é dada é empurrar os particulares para meios alternativos, como a arbitragem e os julgados de paz", afirma Menezes Leitão.
"O principal problema da Justiça neste momento, além da morosidade e ineficiência, é os elevados custos que tem"
O presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais está muito preocupado com essa ideia. António Marçal alerta para a intenção do PS de querer resolver o problema da morosidade retirando os litígios dos tribunais, nomeadamente em matéria laboral e de regulação das responsabilidades parentais.
António Marçal considera que a solução “não é aceitável num Estado de Direito no século XXI. São áreas muito importantes para a construção da cidadania e as respostas têm de ser diferentes. Nós não podemos criar uma ideia de que o sistema está bom e há celeridade, porque não há processos.”
Também o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) é crítico em relação às propostas eleitorais dos partidos. Adão Carvalho acha que muitas das soluções são ditadas por casos mediáticos e outras são as que constam sistematicamente de todos os programas eleitorais, por serem consensuais. Entende ainda que os programas revelam muita falta de informação da parte dos partidos políticos.
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Adão Carvalho pede mais meios e defende que o Ministério Público, embora mande no inquérito, manda pouco. Tem o poder formal de dirigir a investigação criminal mas não tem o poder efetivo porque os meios estão nas polícias.
O presidente do SMMP admite que a opção de colocar os meios nas polícias, em vez de estarem centralizados no Ministério Público não é ingénua ,acontece porque os “órgãos de polícia criminal estão na dependência direta do poder executivo”.
Adão Carvalho repudia o projeto do PSD de pretender alterar a composição dos Conselhos Superiores do Ministério Público e da Magistratura, de forma a que passem a ter uma maioria de não magistrados.
"Parece que é mais uma ameaça do que outra coisa. A preocupação é colocar no Ministério Público um cabresto. É no fundo dizer: ‘cuidado, que nós vamos ter lá mais pessoas nomeadas pelo poder político que é para vos castigar. A justiça não está a andar com o ritmo que nós achamos que devia andar mas vamos estar lá para vos castigar'. Não sei como é que isto pode contribuir para a melhoria da qualidade da Justiça", conclui o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público .
Esta é uma posição acompanhada pelo bastonário da Ordem dos Advogados, para quem a proposta do PSD de querer mudar a composição dos órgãos de governo da Justiça “não faz qualquer sentido”.
São declarações ao programa” Em Nome da Lei” da Renascença, onde foram analisadas as propostas eleitorais dos partidos políticos para a área da Justiça.