18 nov, 2022 • José Pedro Frazão
Varsóvia, 2013 . Foi aí, nessa COP ( Conferência das Partes do Convenção-Quadro das Alterações Climáticas) que, de forma simplificada e sem incluir debates mais antigos, começou a batalha das “perdas e danos” causadas pelo clima por via do nascimento de um “Mecanismo” nessa COP19 que permitia abrir uma plataforma de diálogo neste domínio. O máximo que se conseguiu foi uma rede de assistência técnica , chamada “Rede de Santiago”, conquistada na COP 25 em Madrid.
Os países menos desenvolvidos sempre fizeram pressão para que ao diálogo se juntasse uma componente de financiamento para lidar com os custos das alterações climáticas. No Acordo de Paris , fechado na COP21, ficou estabelecido um artigo específico ( o artigo 8º) para este tema mas a declaração aprovada nessa COP21, acompanhando o Acordo, contém um parágrafo ( parágrafo 51) que estabelece que esse artigo não pode ser usado para reclamar qualquer compensação ou pedido de indemnização por via jurídica.
Para muitos observadores, invocar o parágrafo 51 nada vale por contrariar os princípios da Convenção-Quadro, sendo uma espécie de "inconstitucionalidade". Os países mais ricos temem desde sempre que este mecanismo, e sobretudo o seu financiamento, abra caminho a uma reparação financeira pelos desastres climáticos cuja causa se associa às emissões dos maiores países.
A questão do financiamento por perdas e danos chega ao Egito sem ter sido acordada, mas não tem saído da mesa , sobretudo desde que na COP 26,em Glasgow, a proposta de um fundo foi de novo apresentada pelos países menos desenvolvidos. Para travar o fundo, foi criada uma nova plataforma - os Diálogos de Glasgow - para até 2024 discutir formas de financiamento para as perdas e danos. A pressão levou a que o tema tivesse ponto próprio da agenda de Sharm-El-Sheikh, mas o desacordo continua apesar de uma forte pressão de vários países e organizações da sociedade civil.
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A proposta da União Europeia (UE) surgiu para tentar uma terceira via face à exigência imediata ou diferida para 2023 de um fundo, apresentada pelos países menos desenvolvidos ( o G77) em sentido contrário à oposição clara e frontal dos países mais ricos e poluidores, onde avulta a posição dos Estados Unidos.
Franz Timmermans, comissário responsável pelo Pacto Ecológico Europeu, apresentou na madrugada de sexta-feira uma proposta de fundo para responder às necessidades dos “países mais vulneráveis” aos efeitos adversos das alterações climáticas.
A expressão “países vulneráveis” é um dos pontos que pretende resolver algumas questões pendentes. A questão central do Fundo é o universo de países beneficiários e contribuintes para o fundo, o que tem implicações na forma como se quer desenhar as fundações deste instrumento.
Ao ser erigido no quadro da Convenção-Quadro, remeteria os países para a arrumação de 1992, data da sua fundação, onde a China ainda figurava como país em desenvolvimento e poderia, em tese, até ser beneficiária. Se o Fundo for baseado na realidade actual, como pretende a União Europeia, a China seria contribuinte do Fundo, por ser o segundo país com mais emissões em todo o mundo.
Este é o grande elefante que está sempre na sala das Conferências do Clima, condicionando severamente o posicionamento estratégico dos Estados Unidos e também o alinhamento de outros países que em 1992 estavam menos desenvolvidos e hoje estão na lista dos principais emissores como a Índia, a Indonésia ou a Rússia.
Esse grupo de países tem estado agregado no chamado G77 + China, que se apresenta como o bloco negocial dos países menos desenvolvidos e que tem sido historicamente defensor do Fundo, ao contrário dos Estados Unidos, frontais opositores ao Fundo. As ONG da sociedade civil alertam que a classificação proposta pela União Europeia pode excluir países severamente afetados como, por exemplo, o Paquistão onde as recentes cheias fizeram milhares de mortos. Tudo isto significa que a proposta da União Europeia pode ser lida pelo grupo G77 + China como uma forma de dividir este bloco negocial.
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“ Ter um fundo não era a nossa ideia” , reconheceu Timmermans esta sexta-feira numa conferência de imprensa improvisada nos corredores da COP27. O comissário argumentava que um fundo demora a ser constituído ao passo que já existiam instrumentos financeiros constituídos na área climática. Por isso a UE aceitou a ideia de um fundo com a condição de que venha associado a um “mosaico de soluções” que passa pela análise da questão das dívidas públicas ou a reforma dos “bancos de desenvolvimento “.
Mas, mais importante , a UE propõe um fundo que seja parte de um “pacote de acordos” que inclua mais ambição na redução de emissões ( “mitigação “ no jargão climático) no sentido de cumprir a limitação do aumento da temperatura média global a 1,5 graus face ao período pré-industrial. Na perspectiva de Bruxelas, é essencial alinhar as contribuições de redução de emissões a este objectivo. O fundo é também condicional a decisões claras sobre um pico de emissões antes de 2025, a redução de emissões de metano até 2023, reforçar as metas de mitigação para 2030 e acelerar o fim da produção de carvão.
Ao propor uma ligação entre o Fundo e os compromissos de mitigação das emissões, em plena véspera do fim da cimeira, a União Europeia amarrou o Fundo a uma decisão mais alargada, tradicionalmente exposta na Declaração final, já de si muito contenciosa, o que complica o desfecho positivo da Cimeira.