10 mar, 2023 • Pedro Mesquita
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Esta semana ficou a saber-se que a Comissão Europeia pede aos Estados-membros para eliminarem, gradualmente, a partir de 2024, os apoios que assumiram para mitigar junto das famílias, e das empresas, a subida dos preços da energia. Bruxelas justifica-se com o impacto negativo dessas medidas nas finanças públicas e alerta, também, que constituem um recuo nos objetivos da transição energética calendarizados pela União Europeia.
Na leitura de José Manuel Fernandes, não há motivo para qualquer drama, neste pedido da Comissão Europeia. O eurodeputado do PSD atribui grande importância à expressão "gradual", e sublinha que a ideia é direcionar os apoios para as famílias e empresas em maiores dificuldades.
O social-democrata lembra, por outro lado, que é impossível manter as medidas anti-inflação indefinidamente, sobretudo quando a economia já está a crescer.
Qual é o verdadeiro plano da União Europeia?
Aquilo que a União Europeia pretende é que as medidas sejam direcionadas para as famílias que têm menos recursos, para as empresas que podem estar em maiores dificuldades e que consumam mais energia e, em simultâneo, é necessário que se faça a transição energética e que não se deixe de apostar nas renováveis.
Portanto, não há nenhum drama neste pedido. Está em linha com todos os objetivos da União Europeia e, também, com os compromissos que os governos assumiram. E, portanto, o gradualismo é essencial neste objetivo, como também é importante o apoio para aqueles que consomem mais energia, para as famílias que têm mais dificuldades e deve tratar-se com diferenciação, aqueles que mais precisam e apoiá-los mais com uma proporcionalidade que deve existir.
Este “gradual” é um gradual até 2024, ou a partir daí?
É um gradual a partir de 2024. Estamos a falar do próximo Plano de Estabilidade e Crescimento. A Comissão Europeia tem sido muitíssimo amiga de todos os Estados-membros, independentemente das suas cores partidárias e da sua formação.
João Duque
Economista João Duque olha para o apelo feito pela(...)
Mas onde é que vê aqui a tal amizade, por exemplo, em relação ao Governo português?
Vejo uma amizade muito forte, não só no dinheiro que tem sido distribuído, muito dele sem fiscalização - Portugal tem 50 mil milhões de euros até 2027, é metade do que recebeu desde 1986 até 2021 - e, para além disso, a União Europeia assume sempre o odioso, e as dificuldades, para que depois os governos possam dizer: “Bem, nós temos que atuar porque a Comissão Europeia pediu, mas não era bem aquilo que queríamos”, quando, muitas vezes, na própria negociação, são os governos que solicitam, que pedem ajuda à Comissão Europeia para não ficarem eles com o ónus daquilo que não é bom, para ficarem só com aquilo que é mais favorável.
Há sempre uma nacionalização dos sucessos e uma europeização daquilo que serão dificuldades. Até mesmo no PRR, em que muitas das reformas que já estavam incluídas, e propostas, por parte dos governos, estão no PRR e, agora, o Governo vem dizer: “Nós agora temos que executar esta reforma, caso contrário, não recebemos o dinheiro do PRR. Portanto, há sempre aqui uma grande ajuda que tem existido da Comissão Europeia, que tem as costas largas, e que vai ajudando a os governos a implementarem as políticas que eles próprios querem implementar, podendo dizer que a Comissão Europeia até queria mais, mas eles vão negociar e garantir medidas com menos impacto do que aquelas que eram pedidas.
Uma dúvida, aliás, duas: Porque é que Bruxelas aceita assumir - estou a utilizar a sua expressão - “o odioso” - e porque é que os governos pretenderão diminuir as medidas anti-inflação, ainda que de uma forma gradual em 2024?
É impossível manter durante todo o tempo esses apoios, e economia já está a crescer. É importantíssimo que os fundos que existem sejam bem utilizados. Muitas vezes confunde-se gastar com gastar bem. Não falta dinheiro para pôr a economia a crescer. Para além disso, já se sabia, muitas destas medidas têm um carácter transitório. Os próprios governos assim o assumiram.
Isto dá jeito ao Governo português? Não renovar este tipo de medidas a partir de 2024, ou seja, serem só até 2023, como estão previstas.
Claro que dá jeito ao Governo português. E a prova é que a Comissão Europeia vem falar em gradualismo, e vem dizer que os apoios devem ser direcionados para aqueles que mais precisam, e já se está a procurar passar uma ideia errada, que não corresponde àquilo que a Comissão Europeia pediu, que é para acabar com todos os apoios. Não é isso que a Comissão Europeia pede. A Comissão Europeia pede gradualismo, pede que não se deixe de apostar nas energias renováveis e nos objetivos do combate às alterações climáticas e diz que os apoios devem ser preferencialmente destinados àqueles que estão em maiores dificuldades.
E porque é que a Comissão Europeia, nas suas palavras, assume a parte odiosa?
Bem, a Comissão Europeia tem feito sempre isso. Esta presidência tem sido muitíssimo amiga e dos vários governos, nomeadamente do Governo português.
Mas porquê? Qual é a vantagem da Comissão Europeia em assumir esse “odioso”?
Reside no facto da Comissão Europeia não ser eleita diretamente e também ela pretender que as medidas sejam implementadas com sucesso e ajuda, no fundo, que a ausência de coragem possa ser colmatada com o tal, odioso, que muitas vezes recebe.