13 mar, 2023 • José Pedro Frazão
13,4 milhões de ucranianos foram obrigados a sair de suas casas dirigindo-se para a União Europeia ou para a região ocidental do país. A Organização Internacional das Migrações estima que 5.5 milhões de ucranianos tenham já regressado ao país.
Anh Nguyen dirige as operações da OIM na Ucrânia desde 2019. No início da guerra, teve que sair com toda a sua equipa de Kiev voltando dois meses depois para ajudar a montar a operação humanitária das Nações Unidas. Um ano depois, reconhece que os que regressaram não são suficientes para reconstruir o país ao ritmo desejado pelo governo ucraniano.
Temos vindo a fazer estudos muito regulares que nos permite ter uma melhor compreensão das intenções e necessidades destas pessoas. Concluímos pelos estudos que os ucranianos são muito mais resilientes do que pensávamos . Mesmo ao longo do Inverno, esperávamos um ponto muito crítico antes de haver qualquer movimento de massas. Vimos isso mas penso que tivemos também sorte durante o Inverno, que foi menos frio do que esperávamos e com ataques à infraestruturas menos intensos do que vinha acontecendo no ano de 2022.
Estamos a tentar antecipar o cenário com os estudos que temos. Acabámos de lançar um relatório sobre o regresso de pessoas , que aborda as suas intenções nesse sentido. A 23 de Janeiro, tínhamos 5.5 milhões de regressados e 80% disseram querer ficar nas suas casas. É um número muito elevado. Temos que começar a ver as condições em que eles estão, para garantir que têm abrigos adequados, oportunidades de emprego e acessibilidade de serviços.
Essa é não apenas a nossa prioridade como também é a do Governo. Faço parte de um grupo de trabalho sectorial que junta diferentes plataformas ligadas à recuperação geral. Nesse grupo que trata dos regressos, identificamos que o emprego são a maioria preocupação da população . Temos estado a trabalhar com o banco de desenvolvimento alemão e outros doadores para vermos como podemos aumentar o número de empregos. Estamos mesmo a falar de criação de emprego. Ajudamos a restabelecer lojas que foram destruídas e negocios deslocalizados.
Ajudámos por exemplo uma empresa que produzia materiais para telhados. Começámos por tratar da maquinaria que foi destruída. Mas reparámos que era também um ponto de fornecimento de materiais de que precisamos para os nossos trabalhos de reconstrução. Não se trata apenas de criação de emprego mas de olhar de forma mais alargada para as cadeias de fornecimentos e de valor de que precisamos para começar os nossos esforços de recuperação. Começámos pela construção e pela agricultura, que são áreas chave que nos conduzem aos estudos relacionados com o mercado laboral que estamos a fazer com a Organização Internacional do Trabalho. Vão permitir perceber quais os sectores que têm lacunas que têm que ser preenchidas e isso permitirá desenhar uma resposta mais refinada no processo de recuperação.
São os sectores da agricultura e construção. Na agricultura não se trata apenas dos cereais mas também de processamento de carnes .
Sim. Vamos saber mais num estudo que vamos fazer sobre perspectivas económicas. Tendo por base as projeções do Governo ucraniano, em termos de recuperação do seu PIB e da estimativa de regressos, penso que haverá falta de mão de obra. Tivemos um debate ainda antes da guerra, quando ainda não tínhamos 5.5 milhões de deslocados e onde já se reconhecia falta de mão de obra. É algo que tem de ser abordado na perspectiva de políticas, de legislação e muito na prática . Tem que se avaliar como se gerem os potenciais fluxos de migrantes económicos que venham a ser necessários para a reconstrução e para a recuperação.
Podemos esperar esse espaco de tempo em termos de reconstrução. Quanto aos migrantes laborais teremos que esperar para ver. Quando vêm grandes empresas de construção trazem muitas vezes os seus trabalhadores e eles são também migrantes. Antecipo que esta seja uma das componentes da recuperação.
É difícil de responder porque com a pandemia observámos uma modalidade híbrida a funcionar. É importante notar a forma como a Ucrânia manteve as ligações com os seus migrantes no estrangeiro. Sei que existe um esforço concertado e planos para a criação de “jardins tecnológicos “ para atrair o sector de tecnologia da informação incluindo os que possam regressar. Temos que ver como será essa ligação em termos sociais. A questão da habitação e dos serviços disponíveis será também decisiva.
A pressão têm vindo a diminuir face há um ano. Vemos cada vez mais pessoas a regressar para regiões do leste e isso alivia a pressão que vimos. Se olhar para cidades como Lviv ou Uzourhorad , a densidade populacional está a cair e a regressar quase ao normal. Os quartos de hotel em Lviv já são quase acessíveis…
É uma parte muito importante do nosso trabalho, na perspectiva humanitária. Fico feliz por observar o sentido de colaboração que têm existido internamente no sistema da ONU. Fazemos colunas conjuntas de distribuição de ajuda. Podem ter o símbolo da OIM mas são gente do programa alimentar mundial, o Alto Comissariado para os refugiados e no dia seguinte pode ser ao contrário. É por isto que a ONU tem um sistema de agências e é no terreno que ele trabalha melhor. A necessidade aguça o engenho mas também nos ajuda a sermos muito mais colaborativos para podermos servir a população da Ucrânia. Têm sido um processo muito bom em termos de logística necessária para entregar ajuda às aldeias.
Sim. Temos mais de 700 equipas móveis pelo país a tentar perceber onde estão os estragos e de forma a podermos fazer pequenas reparações. No Inverno foi uma ação muito importante para conservar o calor o mais possível mas casas. E vamos continuar a fazê-lo, em especial nas zonas mais afectadas pelos bombardeamentos.
Quando o Inverno termina , começamos a planear o próximo. Quero que estejamos prontos para apoiar o processo e ainda mais bem preparados para o próximo Inverno. O nosso trabalho começa agora. Temos que ver onde devermos colocar os geradores onde são mais necessários, como arranjar os combustíveis de que precisamos , como mobilizar os fundos necessários para apoiar os mais vulneráveis.