10 mai, 2023 • Pedro Mesquita
É já olhada como uma espécie de GPS espacial. A Neuraspace, com sede em Coimbra, recorre à inteligência artificial para ajudar a organizar o trânsito de satélites, evitando possíveis colisões com o chamado “lixo espacial”.
Como explica à Renascença Carlos Cerqueira, diretor de desenvolvimento de negócios da Neuraspace, há milhões de peças à solta no espaço. São pedaços abandonados de antigos foguetões ou satélites, que se deslocam, em alguns casos, a 25 mil quilómetros por hora. E atenção: Basta uma pequena peça de um centímetro, um pequeno parafuso, para destruir um satélite.
É fácil, portanto, perceber a relevância que esta empresa inovadora, de bandeira portuguesa – dinamizada com dinheiros do PRR - está a conquistar no mercado internacional, entre os operadores de satélites.
O que faz a Neuraspace?
A Neuraspace é uma empresa do espaço que trabalha para um mercado muito específico, e que é um mercado global, que são os operadores de satélite. Portanto, há um conjunto de empresas que mantêm satélites no espaço e fazem serviços que, sem os quais, hoje já não conseguimos viver. Basta lembrar a Internet, as telecomunicações, observação da Terra, mapas, enfim. Tudo isso é hoje essencial para nós, e esses operadores de satélites precisam de serviços como os que o Neuraspace fornece. Porquê? Porque se ter satélites no espaço é uma coisa muito boa, mas tem também tido um efeito lateral de poluição no espaço, o chamado lixo especial. Estamos a falar de pedaços abandonados de foguetões ou satélites, que estão no espaço e tem uma particularidade muito específica: Eles não estão parados. Sobretudo em orbitas baixas viajam a 25 mil quilómetros por hora.
Ou seja, podem provocar grandes acidentes com satélites que estejam em atividade.
Grandes acidentes provocados por pequenas peças. Essa é que é, digamos, parte do drama. Não é preciso ser uma peça enorme para destruir um satélite. Uma peça de um centímetro pode destruir qualquer satélite. E atenção: Há mais de um milhão de peças dessas – de dimensões muito reduzidas - à solta no espaço. É preciso avisar onde estas peças estão aos operadores de satélites.
A Neuraspace funciona como uma espécie de GPS?
Podemos usar essa essa comparação. Portanto, o operador de satélite, em princípio, sabe onde está o seu satélite. O que nós temos que fazer é avisar onde estão os restantes objetos, sejam eles pedaços de lixo ou satélites ativos...avisá-los da sua localização e prever o que é que vai acontecer, e dar essa informação da forma mais precisa possível. É aí que entra a nossa vantagem competitiva com recurso à inteligência artificial e ao “machine learning”.
Como é que vocês chegam lá? Como é que vocês sabem que existe lixo espacial em rota de colisão com um qualquer satélite de uma empresa que é vossa cliente?
Por um lado, é preciso ter acesso a dados. Estamos a falar de ter, chamemos-lhe assim, um mapa do espaço...um catálogo com a posição conhecida dos objetos, não é? E nós fazemos isto através de várias fontes: através de infraestrutura própria, mas também de parcerias com fornecedores desses dados. Depois, e aí é que entra a inteligência artificial e o “machine learning”, é pegar nessa informação e, com ela, fazermos melhor do que os outros. O objetivo é que o operador tenha, não só, a melhor informação possível, mas também sugestões sobre o que fazer a seguir: Se vira para a direita ou vira para a esquerda, em função dos dados que lhes transmitimos.
Há outras empresas, como a vossa? São uma entre muitas ou é um projeto inovador?
Somos uma entre poucas e, gostamos de acreditar, uma das mais inovadora de todas, se não a mais inovadora, pelo uso único que fazemos da inteligência artificial.
Ou seja, tem um enorme campo de crescimento é um enorme campo de negócio. Mas são financiados por quem? Recebem, por exemplo, apoios do PRR?
Nós temos financiamento privado e vimos, também, aprovado, em Abril de 2022, um projeto do PRR relativo às chamadas Agendas Mobilizadoras, com cerca de 25 milhões de euros. É um projeto em consórcio com universidades portuguesas: O técnico, a Universidade de Coimbra, Universidade Nova...também um utilizador final, que é uma empresa portuguesa associada - a GMV – e, depois, o Instituto Pedro Nunes, a incubadora onde estamos alojados. Este projeto vai permitir-nos, exatamente, fazer estas duas coisas que eu estava a dizer: Adquirir, por um lado, infraestruturas para ter acesso a melhor informação, a melhores dados e, por outro lado, trabalhar com universidades, e com conhecimento do mais atualizado, para produzir esses algoritmos que vão dar, digamos, a melhor informação possível ao operador.
Por aquilo que li, vocês têm sede em Coimbra, mas os vossos operadores de software estão a trabalhar remotamente, podem estar a trabalhar em casa. Li, também, que poderá vir a haver uma mais-valia, por exemplo, para a Pampilhosa da Serra. De que é que estamos a falar?
Bom, a Neuraspace, tendo nascido em 2020, nasceu em plena pandemia. Não tinha, portanto, outra opção que não fosse nascer remota. E fomos evoluindo dessa forma. Nascemos em Coimbra, temos escritórios em Coimbra e em Lisboa, e achamos que era interessante - e esse é um dos objetivos do do PRR – completá-los com outros espaços não-urbanos, chamemos-lhes assim. Fizemos uma parceria com a Câmara Municipal da Pampilhosa da Serra, que se mostrou totalmente aberta a este desígnio - que está, aliás, incorporado no PRR – que é a possibilidade de termos, também, um espaço na Pampilhosa da Serra.
E, quem sabe, promover também empregos ligados à alta tecnologia em zonas onde seria pouco provável.
Totalmente. É importante criar empregos em Portugal, empregos de qualidade. Mas também é importante, de certa forma, que eles não estejam apenas localizados nos grandes centros urbanos.