09 fev, 2023 • Liliana Monteiro
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A quatro dias da divulgação das conclusões da comissão independente que investigou suspeitas de abusos na Igreja Católica em Portugal, neste
Explicador Renascença olhamos para o
que diz a lei civil e a canónica relativamente a casos de abuso sexual de
crianças ou adolescentes.
O Código Penal define dois tipos de crimes: o de abuso sexual de criança (leia-se, até aos 14 anos) é um crime público e para o qual basta uma denúncia. Este crime prevê punições a penas de prisão que podem chegar aos dez anos.
O Codigo Penal contempla também o crime de ato sexual com adolescente , que abrange menores entre os 14 e os 16 anos. Este é um crime semipúblico, ou seja, o procedimento criminal depende da apresentação de queixa do ofendido. Neste caso, a pena de prisão pode chegar aos três anos ou ser ainda mais agravada conforme o ascendente do arguido sobre a vítima.
A medida da pena depende sempre dos atos sexuais de relevo apurados jurídica e clinicamente; o principio é sempre o de que, quanto menor a idade da vítima, maior a punição ao agressor.
Se estivermos a falar do crime de ato sexual com adolescente, o prazo de prescrição é de 10 anos. Já relativamente ao crime de abuso sexual de menor são 15 anos.
Estes prazos podem ser sempre maiores tanto quanto a suspensão que pode acontecer, por exemplo, quando se constitui arguido, quando se abre instrução, entre outras situações.
O direito de queixa ou denúncia extinguia-se após os 18 anos da vítima, mas foi alargado até aos 23 anos.
A responsabilidade civil está sempre associada à prova dos factos ilícitos criminais feita em tribunal.
Não há uma tabela definida de forma rígida e universal. Por exemplo, no processo Casa Pia, aquele que foi até hoje o maior caso de abuso sexual de menores e adolescentes, as indemnizaçoes definidas pelo tribunal em 2010 rondaram os 25 mil euros a cada vitima. O valor foi definido sempre em função do abuso provado e das consequências fisicas e psicológicas.
É mais rígido do que a legislação civil. A Igreja tem regras claras para tratar dos casos de abuso sexual de menores, que têm vindo a ser melhoradas nos últimos anos.
O Código que rege a lei da Igreja para esta matéria está no "Vade Mecum", uma espécie de ‘manual’ de procedimentos criado em 2020 por iniciativa do Papa Francisco e revisto no ano passado, reforçando a obrigatoriedade de cada bispo diocesano atuar em primeira linha.
Para lá dos prazos da lei civil, a Igreja reserva-se ao direito de, quando existem factos sólidos que envolvam membros católicos, poder atuar e sancionar os que vierem a ser classificados como abusadores. No limite, podem ficar impedidos de exercer o sacerdócio, não deixando de ser padres porque esse é um sacramento para a vida. A decisão final é sempre tomada pelo Vaticano.
Se na lei civil são considerados menores todos os que têm idades inferiores a 16 anos, no direito canónico essa idade sobe para os 18 anos.
Em materia de prescrição, o prazo é também mais longo na lei da igreja, ou seja, 20 anos a partir da maioridade da vítima. Mesmo assim, é sempre possível alterar a regra da prescrição e atuar, mas a decisão depende sempre da Santa Sé.
O código da Igreja prevê que os casos suspeitos sejam comunicados às autoridades civis, não ficando apenas no núcleo religioso, a bem da proteção da vítima e para evitar a possibilidade da continuação da atividade criminosa.
De resto, tal como a legislação civil, o direito canónico prevê igualmente o sigilo do processo, aplicação de medidas cautelares e o direito à presunção da inocência do acusado.
De acordo com as estatísticas da Direcção Geral de Reinserção Social, até ao final de 2021 havia até 15 pessoas sujeitas a vigilância electrónica por crimes sexuais e 221 presos pelos mesmos crimes, reclusos com 21 ou mais anos de idade.
As estatísticas mostram que, desde 2019, tem vindo a aumentar o número de reclusos nas prisões por estes crimes; em três anos são mais uma dúzia de presos.