08 fev, 2020
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Eu sei que uma boa parte dos defensores da eutanásia e do suicídio assistido é movida por sentimentos respeitáveis. O objetivo é eliminar sofrimentos considerados insuportáveis, promovendo a morte da pessoa em causa.
Respeito, mas não partilho dessa posição, por dois motivos principais. Primeiro porque, como cristão, não me considero dono da minha vida e muito menos da vida de outros. A vida é, nessa perspetiva, um dom de Deus, que não me é lícito desprezar. Daí, também, não aceitar a pena de morte nem o suicídio, assistido ou não. Aliás, quem não procura evitar um suicídio a que esteja a assistir, se o poder fazer, contrariando a aparente vontade do suicida?
Naturalmente, esta argumentação não tem sentido para não crentes. Mas espero que respeitem o princípio da responsabilidade, alheio à fé religiosa, mas não contraditório com ela. A ética da responsabilidade foi analisada por Max Weber, no início do século XX, contrapondo-a à ética de convicção.
Este princípio ético impõe a obrigação de avaliar as consequências previsíveis de uma ação ou de uma omissão. Ora a experiência que já existe em países que legalizaram a eutanásia, Holanda e Bélgica, nomeadamente, aponta para que, por muitos cuidados e restrições que de início legalmente se imponham à eutanásia, ela em pouco tempo descamba numa banalização da morte a pedido. Ou até da morte sem pedido claro e fundamentado de quem vai ser eliminado.
Graça Franco, que vivia em Bruxelas quando ali houve um intenso debate público sobre a eutanásia, expôs claramente aqui como tudo, ou quase tudo, o que então os defensores da eutanásia garantiam que não iria acontecer, aconteceu mesmo. É a chamada “rampa deslizante”: começa-se com boas intenções e rapidamente se acaba numa “cultura do descarte” da vida dita inútil.
Sugiro que consultem aquele artigo da Graça Franco, porque nele encontram, não teorias, mas factos e números impressionantes, que devem alertar qualquer pessoa de boa vontade sobre o que significa, na prática, autorizar a eutanásia.
E nada garante, pelo contrário, que a tal “rampa deslizante” não se acentue ainda mais. Por que não eliminar sistematicamente crianças deficientes à nascença, ou antes, abortando? E não será considerado razoável matar suavemente velhos inúteis e infelizes? Ou pessoas dementes?
O movimento eugenista esteve em voga nas primeiras décadas do séc. XX, pretendendo “melhorar a raça”. Por exemplo, entre 1909 e 1963 foram feitas cerca de vinte mil esterilizações forçadas na Califórnia. E noutros Estados americanos aconteceram coisas semelhantes.
Na Alemanha, os nazis (em parte inspirados nos EUA) levaram a extremos de horror o eugenismo. Por isso ele desapareceu do horizonte. Mas pode voltar – e a “normalização” da eutanásia facilitará o caminho dessa sinistra teoria.