30 mai, 2020
O presidente Trump, que tinha lamentado a morte pela polícia de Minneapolis de um negro que estava a ser aprisionado, reagiu às violentas manifestações naquela cidade, chamando “bandidos” aos manifestantes e ameaçando-os com tiros da Guarda Nacional (que foi depois para ali enviada). O Twitter colocou uma nota junta a essa declaração na sua plataforma, acusando Trump de violar as regras do Twitter ao glorificar a violência. Poucos dias antes o mesmo Twitter chamava a atenção para a possível falsidade de uma outra afirmação num tweet de Trump.
O presidente americano quer, agora, impor às plataformas da internet que censurem o que publicam. Há uma certa ironia nesta ameaça, pois se as plataformas da net fizessem o que o presidente quer um alvo habitual da censura seriam muitos dos seus diários tweets.
Numerosos regimes autoritários ou ditatoriais censuram o que se diz na internet. O caso extremo é a China, porque domina a tecnologia electrónica e não admite vozes discordantes no espaço público. Mas até a Índia já suprimiu mais de 50 vezes afirmações na internet sobre Caxemira.
É um facto que, em vez de reforçarem a liberdade de expressão, a maioria das redes sociais difunde, sem qualquer responsabilidade legal, as mais mirabolantes fantasias e os mais agressivos insultos, além de apelos ao ódio. A questão agrava-se porque muitos dos seus seguidores apenas acreditam na rede social de que gostam – na prática, não há assim contraditório. Paralelamente, decorre uma violenta campanha contra os jornalistas, visando descrebilizá-los; não é por acaso que Trump e Bolsonaro os detestam e os insultam com frequência.
Esta questão é extremamente complexa. A censura é um perigo para a liberdade de expressão. Restringir esta promove o iliberalismo. O despotismo iluminado impedia certas críticas para defender as boas causas. Mas todos os ditadores o fizeram e fazem para calar a voz dos opositores. A intolerância para com os intolerantes costuma acabar mal.
Aliás, sobre este assunto há divergência de opiniões entre o Twitter e o Facebook. O Twitter admite intervir, alertando para o que considera poder ser falso. O Facebook, pelo contrário, não exerce qualquer censura sobre os conteúdos que difunde.
Como poderá o público defender-se das “fake news” (notícias falsas) de que estão cheias as redes sociais? Uma boa ideia é analisar as possíveis falsidades e depois denunciá-las publicamente.
É o que faz o Polígrafo, um projeto jornalístico que tem como principal objetivo apurar a verdade e a mentira no espaço público – e que o Jornal da Noite da SIC transmite semanalmente. Só que o Polígrafo apenas pode investigar um número limitado de eventuais falsidades na internet. Haverá centenas, diariamente, que escapam a essa investigação.
Seria preciso encontrar uma entidade, possivelmente financiada pelo Estado e por particulares, que fosse credível, independente e capaz de investigar permanentemente um grande número de possíveis “fake news”, insultos e apelos ao ódio na internet. O que reconheço ser extremamente difícil de criar. Ou seja, também eu não tenho no bolso uma boa resposta para este preocupante problema.