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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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Cresce a desertificação, até no litoral

02 ago, 2021 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


A desertificação do interior não apenas se acentuou na última década como alastrou ao próprio litoral. Agravou-se a concentração demográfica em torno das principais cidades, como Lisboa e Porto. Até hoje ainda não surgiu uma estratégia credível de combate à desertificação.

Portugal perdeu cerca de 2% da população residente no continente entre 2011 e o ano corrente, apesar da imigração. Metade da população do continente português reside em apenas 31 concelhos do litoral, num total de 278 municípios do continente. É o que ressalta dos dados, ainda preliminares, do censo de 2021 comparado com o de 2011. A única exceção é o concelho de Braga (subida de 6,5% dos residentes), que não se situa no litoral, mas nem fica longe do mar.

No próprio litoral registaram-se quebras demográficas. Foi o caso, nomeadamente, de Viana do Castelo (menos 3% em dez anos), Caminha (menos 5%), Cantanhede (menos 6,5%), Figueira da Foz (menos 5%), Pombal (menos 7,4%). Todos os concelhos do Alentejo, incluindo os do litoral, perderam população, excetuando Odemira, onde terá jogado o fator imigração para trabalhos agrícolas intensivos.

Nos concelhos com fronteira com Espanha a quebra de residentes foi geral, de Castro Marim, no Algarve, até Valença, no Minho. Será, então, que as cidades do interior compensaram as perdas das zonas rurais? As hipóteses de recuperar a população das aldeias há muito que são realisticamente nulas; mas parecia possível a aposta de concentrar nas cidades do interior a batalha contra a desertificação. Só que, pelo menos até hoje, nada se progrediu nesse sentido, pelo contrário.

Viseu logrou manter a população residente, mas é caso único. Cidades como Vila Real, Guarda, Covilhã e Évora perderam residentes, não obstante terem agora estabelecimentos de ensino superior.

Estes números tornam evidente a fantasia da luta contra a desertificação do interior que sucessivos governos nos têm tentado impingir. A desertificação do interior não apenas se acentuou na última década como alastrou ao próprio litoral. Agravou-se a concentração demográfica em torno das principais cidades, como Lisboa e Porto, afetando aí a qualidade de vida dos residentes, com mais poluição e mais engarrafamentos na circulação automóvel.

Nessas zonas sobrepovoadas faltam habitações acessíveis à maioria da população, enquanto nas aldeias do resto do país milhares de casas permanecem fechadas. Algumas abrirão para acolher o regresso, para férias, de emigrantes portugueses na Europa; mas no corrente ano e em 2020 em muitos casos nem isso, pois a pandemia travou esse regresso temporário.

A “bazuca” europeia oferece-nos uma enorme quantidade de dinheiro. Se, agora, uma parte desse dinheiro não vai para travar e inverter estas funestas tendências demográficas, melhor será os políticos deixarem de falar em combater a desertificação. O facto é que, até hoje, ainda não surgiu uma estratégia credível nesse sentido.

Comentários
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  • Bruno
    02 ago, 2021 aqui 21:42
    Estou muito satisfeito com o resultado dos Censos. Menos população naturalmente que significa uma sobrecarga sobre os mais jovens para pagar as pensões dos mais velhos, mas esse encargo irá durar apenas uma geração. Com o tempo, teremos um país com menos pessoas a consumir e a poluir e teremos refúgios no interior que irão demonstrar a força regeneradora da natureza. Tal como o coronavirus teve um período de crescimento exponencial e agora parece estar em decréscimo, também o mesmo irá acontecer com os seres humanos. A diferença é que os vírus reproduzem-se mais rápido e este efeito observa-se em poucas semanas. No caso dos humanos, o efeito irá demorar alguns séculos até se observar.
  • Ivo Pestana
    02 ago, 2021 Funchal 11:00
    Culpa da economia. Um país que viva apenas do turismo, é um pobre país. Faltam ideias a este país.
  • Cidadao
    02 ago, 2021 Lisboa 10:19
    As pessoas tendem a acumular-se nos lugares onde há Serviços e oportunidades de emprego que não signifiquem salário mínimo por 10/12 horas de trabalho pesado por dia. Depois de a Industria e Serviços ( Centros de Saúde, Escolas, CTT, Balcões bancários, Tribunais, etc) terem saído do Interior, o que é que resta às pessoas por lá? Silêncio dos cemitérios e bons ares? É óbvio que os que podem, saem de lá.