12 mai, 2023 • Francisco Sarsfield Cabral Lusa
Nós, portugueses, somos brilhantes a resolver emergências, mas fracos a prever e a antecipar problemas. É o que acontece com a falta de água, provocada por anos sucessivos de seca.
Há décadas que ouvimos dizer que as alterações climáticas iriam trazer fenómenos extremos, nomeadamente secas repetidas e prolongadas. Mas não demos grande importância a esses alertas. Durante um certo tempo, alguns declararam não acreditar em tais previsões. Depois, a sucessão de secas, bem como de chuvas demasiado intensas provocando inundações e outras perturbações tornaram absurda a crença em que o clima não havia mudado. Mas nem assim surgiram estratégias consequentes para enfrentar os problemas decorrentes das alterações climáticas, nomeadamente a falta de água.
Há mais de dois meses que praticamente não chove no território continental. Daí que quase 90% desse território se encontre já em seca, com 34% em seca extrema ou severa. E ainda estamos longe do Verão.
Em abril o Governo suspendeu a instalação de novas estufas no sudoeste alentejano. E interditou algumas culturas permanentes em certas zonas. Vários municípios tomaram medidas de emergência.
Como a seca e a decorrente falta de água afetam sobretudo a Alentejo e o Algarve, a SEDES veio dizer que não existe em Portugal um défice hídrico, mas um problema de distribuição; por isso propõe que se desvie água dos rios a Norte, transportando-a para o Sul, de forma a não a perder para o mar. Uma solução deste género teria de avaliar muito bem os custos e benefícios, económicos e sociais, desses transvases, que existem em partes de Espanha.
Algumas Câmaras municipais, como a Câmara de Lagos, já avançaram com campanhas de sensibilização dos consumidores de água para o seu uso racional e para a limitação de desperdícios. Mas falta uma campanha séria a nível nacional, que atinja nomeadamente os consumidores de água nas zonas urbanas, onde basta abrir uma torneira para vir a água.
Para poupar água importa introduzir incentivos positivos e negativos nos consumos domésticos, fabris e sobretudo agrícolas, no transporte de água canalizada (onde se perde boa parte dela) e na reutilização de águas residuais. Também o fisco deve favorecer culturas agrícolas viáveis com pouca água e penalizar as que consomem grandes quantidades desse bem agora escasso. E é imperativo impor alguma disciplina no recurso aos furos que captam águas subterrâneas, ameaçando os lençóis freáticos já diminuídos pela falta de chuva.
Numa palavra, é indispensável uma estratégia com pés e cabeça. Parece que um Programa para o Uso Eficiente da Água, que deveria ter vigorado entre 2012 e 2020, foi abandonado a partir de 2015. É a tal alergia nacional a prever, antecipar e planear.