05 jun, 2023 • Francisco Sarsfield Cabral
Há dias os trabalhadores das instituições particulares de solidariedade social e das misericórdias fizeram greve, reclamando melhores salários. Nas pessoas com poucos ou nenhuns contactos com estas instituições poderá ter surpreendido que haja greves no setor social. Talvez pensem que os trabalhadores do setor social são voluntários.
De facto, há muitos voluntários nessa área. Ainda bem. Mas cada vez mais são indispensáveis trabalhadores profissionais, com direito a salário. E, para quem lida diariamente com crianças, com idosos e com pessoas com deficiências, são exigidas qualidades e qualificações que um bom salário deveria recompensar. Infelizmente, tal não é possível na grande maioria dos casos.
É conhecido o papel crescente destas instituições na luta contra uma pobreza que tem vindo a crescer entre nós. As receitas próprias das instituições não chegam, em muitas delas, para cobrir as despesas. Seria lamentável que, para pagarem mais aos seus trabalhadores, essas instituições reduzissem o que fazem em favor dos mais carenciados, agravando uma situação de pobreza que já é alarmante.
O padre Lino Maia, presidente da Confederação Nacional das Instituições Particulares de Solidariedade (CNIS), disse à Renascença compreender as reivindicações dos trabalhadores do setor, mas não é possível pagar melhor. Porquê? Porque “a comparticipação pública (isto é, do Estado) não tem acompanhado a evolução dos preços”.
Um maior apoio do Estado, com o dinheiro de todos nós, contribuintes, torna-se assim urgente para que o setor social consiga cumprir o seu indispensável papel no combate à pobreza. É um imperativo ético.
Decerto que o Estado está a braços com múltiplas solicitações de ajuda. Mas também é certo que a inflação, que tantos problemas causa às famílias, beneficia a situação financeira do Estado.
Nos primeiros quatro meses do ano corrente, as receitas do Estado (impostos, sobretudo) subiram 9,5%, enquanto as despesas se quedaram por um aumento de 3,6%. Daí resultou um excedente nas contas do Estado de 962 milhões de euros.
Esperemos, por isso, que – correspondendo ao anseio do presidente da CNIS – o Governo olhe mais para o setor social e para as centenas de milhares de pessoas carenciadas que ele ajuda.
Se o Governo não for sensível a obrigações morais, talvez seja recetivo a considerações de conveniência política. Como se sabe, o Governo acabou com a série E dos Certificados de Aforro, substituindo-a por uma nova série, com piores condições de juros e de prémios de permanência. Transmitiu, assim, uma imagem de um Governo às ordens da banca. Ao apoiar mais o setor social o Governo poderá atenuar essa imagem negativa.