06 jul, 2022 • Beatriz Lopes
"Mãe, comprei uma casa". São poucos os jovens de hoje que conseguem dar este passo para a independência sem que a vida lhes vá pregando rasteiras. Primeiro, uma pandemia. Depois, uma guerra... e vão vivendo em constantes adiamentos: o de conseguir um emprego estável, o de formar uma família e o de ter uma casa própria.
Portugal é o quinto país da União Europeia em que os jovens saem mais tarde de casa. Em média, só o fazem aos 30 anos. Mas que reformas legislativas é que deveriam ser implementadas de forma a reverter este cenário? Quais as consequências demográficas desta tendência? O que está a falhar nos programas de apoio que já existem ao arrendamento por jovens?
No Geração Z desta semana, falamos sobre precariedade habitacional com Alda Botelho Azevedo, demógrafa e investigadora do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, começando por quebrar o mito - ouvido sobretudo entre as gerações mais velhas - de que os jovens são hoje mais comodistas, preguiçosos e não se importam de viver em casa dos pais.
"Muitos deles nem sequer conseguem ter a estabilidade económica para assumir um contrato de arrendamento por um ano, quanto mais pensar num empréstimo que durará 30 anos a cumprir. Não os acho de todo preguiçosos. Acho-os, pelo contrário, extremamente resilientes e que começam a acusar sinais de cansaço por todas as provas a que têm sido submetidos".
Os números não deixam dúvidas: quase três em cada quatro jovens (72%) recebem menos de 950 euros líquidos por mês e, por isso, sublinha Alda Botelho Azevedo, pagar uma renda torna-se insuportável.
"Ainda há pouco fui ver qual era a renda mais barata na cidade de Lisboa à data de hoje. A mais barata custa 585 euros e refere-se a um T1 em Benfica. Por 600 euros temos um T0 no Campo Grande. Ambos a necessitar de intervenção. E, portanto, é mais do que óbvio que é impossível pagar uma renda com estes salários. E pensando no risco que há em poder estar a receber hoje, mas daqui a seis meses poder ficar sem emprego, a situação torna-se ainda mais grave".
A investigadora do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa reconhece que os problemas relacionados com a precariedade habitacional "não se resolvem numa legislatura", mas identifica desde já algumas falhas nos programas de apoio ao arrendamento.
"Poderia ser criada uma reforma por nível de rendimento, como um subsídio à renda para quem procura habitação. Nós até temos o 'Porta 65 Jovem', mas é um programa com vários problemas desde logo a dotação orçamental que é baixa e o programa exclui todos os candidatos que sejam proprietários de uma habitação com fins habitacionais. Isto significa que se eu encontrar um emprego em Lisboa e tiver uma casa num lugar despovoado que não consigo arrendar a ninguém, eu deixo de ser elegível para este programa".
Também do lado da oferta, Alda Botelho Azevedo defende uma maior disponibilidade da habitação pública destinada a jovens, como algumas câmaras municipais já o fazem, sublinhando que "por se tratar de uma oferta pública, os preços são imunes às dinâmicas do mercado".