22 set, 2022 • Beatriz Lopes
A ideia até pode estar enviesada: decoramos o quarto das meninas de rosa e o dos meninos de azul; as engenharias são para os rapazes e a Educação Infantil para as meninas; enquanto o pai vai ao futebol, a mãe é quem cozinha lá em casa. Mas as gerações mais jovens já começam a ser imunes a estes estereótipos, considera Diana Pinto, da Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres.
A ativista "desconfia bastante" de quem acha que os jovens só falam de Desigualdades de Género "por estar na moda ou ser trendy" e até deixa um convite aos menos interessados: "Venham para este lado da barricada".
De acordo com o Fórum Económico Mundial, serão precisos mais 132 anos para eliminar de forma definitiva a desigualdade entre géneros.
Diana Pinto tem 25 anos - o que significa que nem ela, nem os seus filhos, nem talvez os netos, vão saber o que é viver "num mundo com igualdade". Mas a escolher um lado da barricada, a jovem ativista feminista quer contribuir para os avanços e não para os recuos.
"A ideia de que estamos sempre numa direção de progresso é falsa. Nós vimos muitos retrocessos a acontecerem durante a pandemia como, por exemplo, tudo o que tem a ver com direitos laborais. Ficou ainda mais claro que as mulheres estão sobre representadas nas áreas laborais mais precárias. No que toca à conciliação entre a vida profissional e a vida familiar, a pandemia veio também provar que as mulheres estão a sofrer terrivelmente com o peso da dupla jornada de trabalho: as oito horas cá fora (oito sendo generosa) e as quatro horas em casa ao final do dia onde ainda se adicionam os filhos".
Mas se há problemas que se prolongam e que já atingiam "os pais e as mães dos jovens da Geração Z", há outros que parecem ser novos. Nas redes sociais, as gerações mais novas são bombardeadas com modelos de sucesso baseados nos seus atributos físicos, em detrimento das qualidades pessoais e profissionais. Uma tendência, diz Diana Pinto, que não só está longe de ser corrigida: aliás, até tem vindo a crescer.
"Sabemos que plataformas como o Instagram, Facebook ou Twitter têm vindo a promover cada vez mais a hipersexualização precoce dos corpos femininos. E faz todo o sentido que estejamos preocupados com estas questões, quando elas ocupam um espaço tão grande nas nossas vidas."
Os sinais de mudança vão surgindo. Atualmente, as mulheres portuguesas ocupam quase um terço dos cargos dos Conselhos de Administração das empresas, seis vezes mais do que em meados dos anos 70. Mas a disparidade salarial mantém-se. Elas ganham, em média, menos 220 euros/mês do que os homens em Portugal e, se falarmos de quadros superiores, a diferença chega aos 700 euros. Como é que se justifica que pessoas que desempenham a mesma função não recebam o mesmo?
"É uma pergunta complexa", admite Diana Pinto. "Como nos cargos mais altos, temos muito menos mulheres, as poucas que lá estão, estão muito sozinhas e têm muito pouca força para fazer qualquer mudança significativa." Mas não só: "As mulheres jovens não são ensinadas a pensar em si próprias como líderes, não se reveem nas posições de liderança, são sim ensinadas para a posição de subalternidade. Além disso, e mais importante ainda, é que não lhes são dadas condições materiais (desde a educação à saúde, à disponibilidade económica e financeira) para sequer poderem ambicionar esse tipo de trabalho quando estão muito ocupadas a tentar sobreviver".
Também na política as mulheres têm vindo a ganhar terreno. Entre 2003 e 2021, o número de mulheres no parlamento duplicou. Portugal foi o sétimo país da União Europeia com maior peso das mulheres no Parlamento. No entanto, alerta Diana Pinto, "nas últimas eleições legislativas essa tendência regrediu ligeiramente", o que pode significar que precisamos "de rever a lei que temos neste momento".
Mas será que só estamos a conseguir eleger mulheres no parlamento porque o Estado tem que cumprir quotas relativas à paridade? "Na prática, sim", admite Diana - que gostaria que, um dia, este processo se tornasse "natural".
"As quotas são úteis e devem servir como medida positiva no sentido de aliviar uma discriminação que existe, mas nós caminhamos para o momento em que elas deixam de ser precisas e que já não há necessidade de fazer uma medida extraordinária".
A crise da Covid-19 veio provar que as mulheres foram mais prejudicadas a vários níveis: desde o afastamento do local de trabalho, ao desemprego e à perda de rendimentos. Passada a pior fase da pandemia, Diana Pinto, diz temer que o cenário venha agora a repetir-se.
"Quando falamos em instabilidade económica, não falamos apenas destas mulheres perderem os empregos. Também falamos daquelas que estão em situações de violência doméstica, presas com os seus agressores em casa. Se calhar, se tivessem mais rendimentos até poderiam sair, assim não."
E este é apenas um dos motivos que leva a jovem ativista a defender que "a aposta tem de ser na educação". "Acredito que é aí que começa muito do trabalho que pode ser feito. E, portanto, precisamos de uma mudança para combater o sistema patriarcal que é muito mais velho que todos nós. Se calhar, vai demorar esses 132 anos, mas cá estaremos."