12 out, 2023 • Beatriz Lopes
Não fosse "o risco de todos os dias poder perder alguém" e Tania Oliynyk poderia estar entre aqueles que já olham para ofensiva russa na Ucrânia como "mais um dia de bombardeamentos e mortes". Com 22 anos, e a viver em Portugal desde os sete, acompanha quase ao minuto as notícias da Ucrânia, onde vivem o pai, a madrasta, os irmãos e a avó.
Mas por que razão é que a guerra na Ucrânia parece já não estar no centro das preocupações de todos? O reacender do conflito Israel-Hamas apaga as atenções de outro? Ou já estamos apáticos e emocionalmente adormecidos ao assistir a tantos mortos, destruição e famílias em fuga?
Para tantas perguntas, Tania acredita que haverá várias respostas, desde logo, a ligação emocional e a proximidade geográfica.
"É natural que uma pessoa que não tem familiares nem amigos na Ucrânia vá acabando por deixar a questão da guerra um bocado de lado (...) Também é natural que países que estão muito perto da zona de conflito estejam mais preocupados por causa dos riscos que correm, seja a queda de um projétil, como já aconteceu na Moldávia e na Roménia. Ou a Polónia, por exemplo, que também está constantemente a receber refugiados e mantém negócios com a Ucrânia. Já países como Portugal, Espanha ou França olham para a Ucrânia como se estivesse na outra ponta da Europa".
A somar a isto, a jovem ucraniana acredita que são cada vez mais aqueles que procuram fugir "ao bombardeamento de notícias" que afetam a saúde mental.
"Muitas pessoas dizem-me "ai, eu já estou um bocadinho cansado de ver as notícias todos os dias, de notícias tão pesadas, prefiro ver outras coisas'" (...) Os jovens tentam abstrair-se muito nas redes sociais. Outro problema também é o facto de diariamente existirem notícias com novos impactos, e as pessoas acabam por desviar a atenção em vez de acompanhar uma guerra que já está em curso há mais de um ano e meio. No entanto, quando surge uma informação diferente, como quando o Grupo Wagner quis invadir Moscovo, obviamente que a atenção volta à guerra na Ucrânia".
Nas viagens que faz com frequência à terra natal, Tania Oliynyk encontra agora jovens que, apesar dos impactos traumáticos, "querem movimentar-se", continuam a ir à escola "porque acreditam no futuro", "querem construir família, ter carreiras", mas a guerra poderá hipotecar-lhes os planos.
"No caso dos rapazes, se esta guerra continuar a longo prazo, provavelmente eles vão chegar a uma idade em que terão de ser recrutados e não vão poder continuar as carreiras profissionais que planearam desde crianças. Depois temos também a questão dos jovens deslocados e refugiados, que foram para países estrangeiros para ter uma vida com normalidade e tudo isso terá consequências futuras a todos os níveis", lamenta.
E será que tudo isto pode turvar a forma como os jovens ucranianos vão olhar para o povo russo? Não estarão eles a confundir os protagonistas desta guerra com uma nação? Tania Oliynyk acredita que se possa estar a tomar a parte pelo todo. "Os ucranianos, desde crianças, vão odiar os russos. Isto vai acabar por ser um ódio de geração em geração que, provavelmente, demorará décadas a passar."
Para a jovem ucraniana, uma coisa é certa: não fosse a solidariedade da União Europeia "desde apoios económicos, a mais armamento, ao acolhimento de refugiados" e, provavelmente, a Ucrânia "não teria lutado tanto nem já teria motivação". Ainda assim, Tania admite que poderá haver ucranianos "a ficar de pé atrás", com países como a Eslováquia que elegeu um primeiro-ministro pró-russo.
"Os ucranianos têm noção que existem países e certos indivíduos que, por questões históricas, vão trazer discussões que podem causar algum tipo de atrito dentro da União Europeia. Claramente que ficamos de pé atrás quando algum estado-membro pode discordar das ações da própria União Europeia. "
Quando faz entrevistas no terreno, na Ucrânia, "qualquer militar responde": "A chave para a vitória é o armamento e a adesão à NATO". Mas, para Tania, o fim da guerra "é ainda irrealista" devido a um braço de ferro: "os ucranianos não desistem do território e Putin também é uma pessoa que não gosta de desistir".
Para já, a jovem ucraniana vai confiar em Volodymyr Zelensky, o humorista que via "desde pequenina" e que hoje "todos os ucranianos veem como herói".
"Todos os dias ele mostra ser capaz. Aquela instabilidade e insegurança que se tinha sobre ele, antes da guerra, desapareceu completamente quando a guerra começou", remata.