16 jun, 2016
Se fosse necessário provar como a luta partidária se pode sobrepor ao interesse nacional, a criação da comissão de inquérito à gestão da CGD seria um caso exemplar. Porque não se justifica? Não. Porque, não havendo nada de verdadeiramente novo, ocorre no pior momento.
Colocar debaixo dos holofotes mediáticos, e da atenção de Frankfurt e Bruxelas, o banco que se pretende capitalizar criando a ideia errada da súbita descoberta de um enorme “buraco escondido” fruto de uma gestão “ruinosa” é, no mínimo, irresponsável, senão mesmo perigoso.
Não se trata apenas de patrocinar uma “devassa” às contas da caixa, oferecendo à concorrência um maná de informação interna. Trata-se sobretudo de oferecer às agências de rating e aos supervisores internacionais (O BCE, o Mecanismo Único de Supervisão, a Direcção Geral de Concorrência e a Direcção Geral de Economia), com as quais Portugal está neste momento a negociar, a ideia exactamente oposta à pretendida. Não é isso que melhor defende o dinheiro dos accionistas (todos os contribuintes) e a confiança dos depositantes.
Num momento em que é preciso provar que a caixa é rentável, preparada para agir em concorrência, com uma rede capaz de fazer chegar o dinheiro que falta à economia, importa demonstrar que um aumento de capital se justifica para fazer face ao cumprimento de novos rácios, enfrentar as dificuldades de crédito malparado geradas pela crise (que bateu forte no mercado habitacional), e permitir investir de novo na economia. Não é ocasião para trazer para a praça pública um debate que gira em torno da ideia de contas disfarçadas e instrumentalização politica recorrente.
Mesmo que pareça evidente o interesse político da investigação, a questão que se coloca é a do porquê agora? Antes do Verão, com carácter de urgência e enquanto decorre a negociação em Bruxelas. Para cúmulo, tudo acontece a uma semana de ser conhecido um dado decisivo para a estabilidade dos mercados e quando as ondas de choque da simples ameaça do “Brexit” já se fazem sentir com um aumento substancial do prémio de risco da nossa divida pública, em plena queda das bolsas e perante a desvalorização de boa parte da banca. Até há quinze dias as desvantagens do inquérito seriam ainda bem menores.
Porquê agora? Quando o anterior Governo não promoveu um inquérito em 2012, quando os negócios de Santos Ferreira e Vara já eram conhecidos e estavam ainda abundantes e disponíveis os dinheiros da Troika para uma recapitalização superior eventualmente necessária?
Ou porque não o desencadeou o PSD mais tarde, na sequência do caso BES quando se reforçaram novas parcelas de crédito malparado? Ou, no máximo, em Agosto de 2015 quando a auditoria que Luís Montenegro trouxe para o debate quinzenal (e que tinha feito manchete do Correio da Manhã) chegou às mãos de Maria Luís? A resposta provável é a de que em nenhum desses momentos uma comissão de inquérito se mostrou oportuna. Sempre os inconvenientes superaram as vantagens. O interesse nacional sobrepôs-se à quezília política.
Contudo, o sistema bancário está hoje muito mais fragilizado. A confiança é mais ténue. Ao colapso do Banif, somam-se os problemas do Montepio, a perda de valor do BCP (hoje é possível comprar 25 acções pelo preço de uma bica!) e as alterações do BPI com novos accionistas e uma nova estratégia.
Acrescentar a este caldeirão uma maior desconfiança sobre a gestão e solidez da Caixa era no mínimo dispensável. É caso para dizer que “não havia necessidade”. Se é urgente fazer alguma coisa que se opte, como sugere Bagão Félix, por constituir uma discreta comissão independente em que “reguladores, Ministério Público e Tribunal de Contas “reanalisem sem ruído mediático a gestão passada (sem esquecer o apuramento do destino dado aos mais de mil milhões de euros conseguidos recentemente com a venda da Caixa Seguros!).
Se pararmos e reflectirmos um pouco, ainda se vai a tempo de evitar desvalorizar mais um banco de todos nós.