19 fev, 2018
Marcelo encontrou-se esta segunda-feira pela primeira vez com o novo líder da oposição. Rui Rio não levou com ele nem Sebastião Malheiro nem Elina Fraga nem David Justino.
A ausência de Justino não tem especial leitura política (Marcelo conhece-lhe bem o trabalho recente sobre o estado e o futuro da Educação). Já a ausência da ex-bastonária da Ordem dos Advogados e do autarca de Ovar só podem significar prudência por parte do novo líder do PSD.
Elina Fraga, além de apupada pelo Congresso, significa uma deriva populista que Rio só pode querer disfarçar e Malheiro, depois do caso dos relvados sintéticos adjudicados a uma única empresa e da autoponte camarária para levar os correligionários a votar nas primárias, não é para já um vice-presidente que se apresente quando se proclama como primeiro objetivo “um banho de ética na política”.
O Presidente da República tinha, aliás, sinalizado a vantagem de algumas ausências quando anunciou que o encontro com Rio no pós-congresso visava permitir não só “conhecer algumas das propostas apresentadas, como qual o calendário dessas propostas e os respetivos interlocutores”.
Será que em matéria de Justiça Rui Rio pretende apresentar como interlocutora Elina Fraga? A mesma que colocou em tribunal uma queixa-crime “por atentado ao Estado de direito” a todos os ministros presentes no Conselho de Ministros de Passos Coelho que validou a extinção de uns quantos tribunais. Não se vê Marcelo a ratificar tal escolha.
Paula Teixeira da Cruz, então ministra da Justiça, considerou a sua nomeação para a vice-presidência uma “traição”, mas o congresso que apupou de pé a sua subida ao palco não deve ter achado coisa muito diferente. Delfim de Marinho Pinto e sua sucessora na Ordem, Elina Fraga é vista como uma espécie de “defensora dos advogados descamisados”, mas soma a esta fama vários processos que ainda tramitam na justiça por má gestão. Não parece ser este o perfil consentâneo com a liderança de um Pacto de Reforma para a Justiça que Marcelo tanto apadrinhou até aqui.
Já Morais Sarmento, que é o primeiro vice-presidente da nova comissão política, terá ocasião para expor, olhos nos olhos, a ideia expressa no Congresso sobre a vantagem de ser o Presidente a conceder o seu alto patrocínio e a desafiar as várias forças partidárias a sentarem-se à mesa para prosseguir uma espécie de pactos de regime numa série de áreas consideradas fulcrais.
O novo PSD - assumidamente social-democrata - foi enunciando algumas, embora em traços gerais: da natalidade que falta e é preciso incentivar com políticas sustentadas de médio e longo prazo ao apoio à terceira idade com o que isso significa de promoção de uma cultura de envelhecimento ativo e a criação de uma nova cultura e uma verdadeira reforma da Segurança Social. Resta saber se Marcelo está disposto a caucionar a liderança de Rio dando o pontapé de saída para o que será sempre visto como uma tentativa de “bloco central informal”.
Sobretudo em áreas tão sensíveis como a do Estado Social quer no que respeita à saúde, “com um Serviço Nacional de Saúde que se pretende manter e melhorar” a coabitar com um serviço privado “competentemente regulado e fiscalizado onde o lucro pode ser legítimo desde que adequado na resposta”, como afirmou Rio no Congresso. A linguagem não pode ser mais diferente da de Passos Coelho. Nem ponta de liberalismo, apenas a firme aposta na social-democracia. E por último a Educação onde defendeu que não se regresse ao “eduquês”, mas se dignifiquem os professores da escola pública sem os transformar em “animadores de sala de aula”.
Marcelo defende um modelo bem diferente, mais próximo de Nuno Crato, mais assumidamente profissionalizado.
Entre as propostas do novo líder da oposição resta enfrentar a questão de um envelhecimento ativo. Nada de muito novo no discurso partidário transversal e que alguns comentadores não tivessem já sugerido por altura das comemorações do primeiro ano de Presidência de Marcelo como uma ótima área para o Presidente da Republica dar o tiro de partida na discussão alargada à sociedade civil.
Rui Rio foi secretário-geral de Marcelo, mas dessa convivência não se terá guardado grande sintonia, ver-se-á, a partir de hoje, se entre os dois homens há agora maior proximidade ou ainda maior diferença. O gelo de Rio talvez derreta perante o sempre afetuoso professor, mas pode também despertar nele um certo cinismo que foi a marca de água de Marcelo ex-líder. Do ex-militante de que Morais Sarmento se “orgulha” e estranha que os restantes companheiros pareçam ser-lhe indiferentes. De facto, o partido parece só se lembrar dele quando é preciso. E agora Marcelo poder-lhe-ia ser precioso. Tarde demais. O mais expectável é que não será.