14 dez, 2018
Há dias, uma professora contou-me um episódio que ilustra na perfeição o ar do tempo. Na escola onde dá aulas, esta e outras professoras organizaram uma viagem de estudo a um lar de idosos.
O objectivo era meritório: confrontar os adolescentes com a velhice, a doença e a morte, normalizando-as; criar laços de empatia entre gerações; perceber que todos nós acabamos nas rugas e nas cinzas; exercer a caridade junto de quem mais precisa – os velhos. Sucede que muitos pais recusaram a ideia, alegando que essa visita de estudo era demasiado pesada para os adolescentes.
A infantilização da sociedade chegou a este ponto: levar jovens de 15 anos a um lar de idosos é uma acção considerada violenta ou traumatizante. Esta negação da realidade é tão contrária ao meu esquema de valores que nem sei bem o que pensar ou dizer. Jovens ao lado de velhos é um quadro que me invoca ternura, afagos, abraços, conversas e lendas à lareira; não penso de certeza em alegados traumas.
Aliás, assumir que o cheiro a velho é violento para um jovem é o caminho mais rápido para o colapso da empatia enquanto enquanto valor social.
O que pretendem estes pais? Impermeabilizar os seus filhos em relação à finitude até aos vinte anos? Evitar que eles se confrontem com o pior da vida até aos trinta? Neste sentido, um velório ou funeral também é demasiado pesado para um jovem? Os jovens podem passar a vida na net a ver as imbecilidades dos youtubers, mas não podem passar uma tarde junto de arrastadeiras e muletas? Como é que passar uma tarde a assoar o nariz de uma senhora pode ser visto como um trauma? Confesso-me desarmado.
Como só tenho sangue, suor e muco para oferecer, sei que estou desarmado perante esta visão higienizada do ser humano. É uma visão sem a fralda suja dos bebés e sem a fralda molhada da velhice, é um presente perpétuo, sem passado e sem futuro, sem nascimentos e sem mortes, é a visão de uma geração que recusa ter filhos e que tem vergonha dos velhos.