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Henrique Raposo
Opinião de Henrique Raposo
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Fechar as escolas: destruir uma geração de crianças (e de mães)

22 jan, 2021 • Opinião de Henrique Raposo


E este novo #ficaremcasa não representa só a destruição do futuro de uma geração de alunos pobres; também representa a destruição dos sonhos profissionais de muitas mulheres de todas as classes, porque são elas (e não eles) que se sacrificam em casa pelos filhos.

Já vamos num ano de pandemia e de cultura do medo. Passado todo este tempo, uma coisa é clara: o pós-verdade é muito democrático na sua distribuição. Não é só o extremo trumpista que não respeita a ciência; o extremo dominante, o extremo hipocondríaco que se julga moralmente superior, também não respeita as evidências. Fechar as escolas é uma decisão errada e irracional; é uma cedência ao medo difuso sem base científica; é uma cedência a uma opinião pública que não lê, uma opinião viciada em imagens de tv emotivas; é um acto de desespero de uma sociedade que falhou na protecção dos mais velhos e que agora desprotege os mais novos.

Na SIC, Francisco Abecassis, pediatra intensivista, foi claro: fechar as escolas é um erro que destruirá a vida de muitas crianças, sobretudo das mais pobres. Este pediatra foi claríssimo e corajoso: “eu e muitos dos meus colegas somos contra o fecho das escolas”. Porquê? Volto à minha coluna da semana passada: as crianças não são afetadas e não há qualquer evidência que mostre que a expansão do vírus está relacionada com as escolas, sobretudo se pensarmos na pré e na primária. Recorde-se, de resto, que esta vaga começou quando as crianças estavam em casa de férias. Portanto, é absolutamente escandalosa a narrativa que se quis impor esta semana. Não, a culpa desta vaga não é das crianças, não é das escolas, encontrem por favor outro bode expiatório. Falem por exemplo da absurda incapacidade do governo para proteger os lares de idosos. Já passou quase um ano e continuamos a ter surtos nos lares. Como é que isto é possível? Não é aceitável, tal como não é aceitável a psicose colectiva que tem as prioridades trocadas. O vírus mata sobretudo pessoas acima dos 70/80 anos, mas toda a paranóia colectiva fica concentrada nas escolas, como se este fosse um vírus de incidência pediátrica. Se metade da psicose gerada pelas escolas fosse desviada para os lares, estaríamos numa situação muito mais favorável e racional desde Março.

Estamos a destruir a infância e a adolescência de uma geração. Estes miúdos vão ficar para trás na instrução escolar. Vão ficar para trás na educação moral da empatia e da cidadania. Vão desenvolver patologias psiquiátricas. Vão ficar ainda mais obesos. Qual é a comorbidade mais aproveitada pela covid-19? A obesidade, que será uma inevitabilidade numa geração tão fechada em casa.

Claro que as classes mais altas encontrarão maneiras de apoiar as suas crianças e adolescentes. Como sempre, serão as crianças mais pobres que pagarão esta fatura. Vamos perder uma geração de crianças pobres. Depois de dois anos lectivos interrompidos, nunca mais o sistema conseguirá agarrar e salvar milhares de jovens da pobreza material e cultural em que vivem. Vamos perdê-los para o desespero, para a miséria, para a delinquência, para a inércia nem-nem. As assimetrias sociais e educativas ficarão ainda mais marcadas (um mal em si mesmo) e ficarão ainda mais à mercê de aproveitamentos populistas.

E este novo #ficaremcasa não representa só a destruição do futuro de uma geração de alunos pobres; também representa a destruição dos sonhos profissionais de muitas mulheres de todas as classes, porque são elas (e não eles) que se sacrificam em casa pelos filhos. Estou à vontade nesta matéria, mas sei bem que a minha casa é uma excepção. Quando acordarmos do torpor coletivo, vamos descobrir um país ainda mais desigual entre ricos e pobres e entre homens e mulheres.

Comentários
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  • António Rodrigues-Lopes
    25 jan, 2021 Viseu 20:06
    Caro Henrique Raposo Ao os seus argumentos, parece-me que faz uma distorção do sentido (ou diferente ou possivel) que parece querer dar-lhes. As questões que levanta e a sua problemática maus fundante parece-me que merecia alguns reparos. Deixe-me por-lhe a questão seguinte: o desenvolvimento integral de uma criança obedece a uma qualquer "metafísica", ou é dialéctico!? Sendo relevantíssima a frequência escolar, não será "desconfiar" ou "sub-estimar demais as potencialidades de uma criança!? Repare que me refiro à criança em geral! O que é mais importante é o tempo (no sentido de duração) ou o "setting" de aprendizagem proporcionado à criança!? Será a aprendizagem um processo linear!? Deixe-me referir agora às crianças pobres (desfavorecidas): ficando naturalmente mais "prejudicadas", não será de lhes proporcionar condições de aprendizagem mais enriquecidas!? Tudo isto e muito mais, se isto pudesse ser uma exposição e discussão científica, não permite ver de outro modo a situação da gravidade da pandemia na sua relação com a situação da escola e da sociedade!? Devo dizer-lhe que a protecção das crianças vai muito mais além da sua argumentação. Há lugares comuns da moda das opiniões que merecem algum reparo, ...Talvez seja de responsabilizar as consequências das opiniões pseudo-científicas, por ventura! Sendo facto que a ciência não é nenhum dogma!
  • Maria Correia
    23 jan, 2021 Lisboa 22:25
    Tanto disparate! Estes Srs. que são pagos para influenciarem a opinião pública deviam pelo menos ter o cuidado de fundamentar as suas opiniões, mas optam por o não fazer. O mais estranho é que continuam a ser pagos para vomitarem disparates. Se está mesmo convencido de que as crianças não ficam doentes, talvez possa fazer um levantamento do nº de crianças infetadas só este mês em Lisboa. Sabe quantas foram infetadas ou não lhe interessa saber? E por falar em fomentar a cultura do medo o título do seu artigo é bem exemplo disso. Desde quando uma geração de mães ou pais fica condenada por durante uns meses terem a seu cargo os filhos? Quanto às crianças o seu futuro será certamente mais posto em causa por serem cada vez mais negligenciados por pais que cada vez lhes prestam menos atenção. Fazem-no às vezes por necessidade, mas muitas vezes por egoísmo. Isso sim coloca em causa o futuro e a saúde mental das crianças. As queixas constantes dos pais por numa situação extraordinária como esta se verem na necessidade de dar alguma atenção aos filhos em vez de os despacharem para as escolas, ATls, CAFs e até campos de férias devem ser entendidas pelos seus filhos como um sinal de amor?
  • Ivo Pestana
    22 jan, 2021 Funchal 16:57
    O Sr. Henrique acha que o vírus escolhe pessoas, para contaminar? O mais importante é a vida, logo deixem trabalhar quem tem a responsabilidade de zelar, pela mesma. O Sr. Henrique se estivesse à frente da DGS, não faria igual? É porque estar a ver por fora, é mais fácil e sem responsabilidade ainda mais. Ajudem e não falem de "cór e salteado", opiniões existem aos milhões. Força DGS, força Portugal.
  • Cidadao
    22 jan, 2021 Lisboa 10:00
    O senhor gosta muito de dramatizar, não gosta? De onde vem a sua formação de epidemiologista? De uma faculdade de medicina ou "leu umas coisas"? Não estou a ver como um fecho de escolas por 2 semanas pode "destruir o futuro de uma geração de alunos pobres e de caminho representar a destruição dos sonhos profissionais de muitas mulheres". Não faça drama, vá antes ao Teatro! O tempo fechado agora, será compensado ocupando as férias de Carnaval, Páscoa, e mais uma semana no final do ano. Feitas as contas, ainda ficam mais dias na Escola que se não houvesse esta pausa. E se os "sonhos profissionais de muitas mulheres" se despedaçam por 2 semanas é porque esses "sonhos" não passam disso mesmo, e têm a consistência de bolhas de sabão. E esse "especialista" que cita, já foi desmentido por dezenas de outros também "especialistas" que seguem em sinal completamente contrário ao que ele diz. A escolha aqui é parar e recuperar, ou persistir na teimosia até se perderem mais vidas. Você escolheu o 2º caminho. Nós, não.
  • Petervlg
    22 jan, 2021 Trofa 08:59
    Todos os seres humanos, são "veículos" de propagação do covid, sejam novos ou menos novos. O seu raciocino é errada e o Sr. sabe que é errado, por pessoas como o Sr. é que estamos como estamos!
  • Maria Oliveira
    22 jan, 2021 Lisboa 08:33
    Concordo habitualmente com as ideias de Henrique Raposo, que respeito e admiro. Não estou de acordo com ele relativamente ao fecho das escolas. É certo que tem um elevado custo, sobretudo para as crianças mais desfavorecidas. Há que solucionar esse problema com apoio escolar extra, encurtamento das férias, etc. Cabe ao Governo resolver. Mas é certo que há maior contaminação com as escolas abertas. Tenho conhecimento de famílias inteiras (pais, avós e irmãos) contagiados por criança em idade escolar. É preciso não esquecer que na escola convivem alunos, professores, auxiliares de educação. E que as escolas abertas implicam a deslocação diária de mais de 2 milhões de pessoas, muitas das quais em transportes públicos apinhados. Não me parece, por isso, muito útil continuar a insistir nas escolas abertas. A preocupação deve dirigir-se ao modo como se vai recuperar este tempo de paragem.
  • Bruno
    22 jan, 2021 aqui 07:25
    Qual é a fonte que utiliza para afirmar que são as mulheres que ficam em casa em vez dos homens? Eu conheço imensos casos onde é o oposto que acontece (ex. Mulher profissional de saúde e marido em teletrabalho). Será essa afirmação apenas uma frase retórica sem sustentação que tenta tirar partido do facto de se ter estabelecimento na sociedade uma ideologia feminista radical? Quanto ao resto do conteúdo, não vejo um problema geracional que as crianças fiquem em casa durante 15 dias. Creio que se trata de uma tentativa do autor se mostrar intelectualmente superior só porque pensa de maneira diferente relativamente à evidência científica.