26 mar, 2021
Era inevitável. A enorme trapalhada em que se envolveu a Comissão Europeia (e que, em consequência nos envolveu a todos) relativamente às vacinas fez levantar as vozes do costume relativamente aos poderes das instituições da União. São vozes que apostam numa Europa centralista, jacobina ou napoleónica, como se queira, com poderes sonegados aos Estados-membros, desejavelmente reduzidos a uma total insignificância.
As instituições europeias funcionam mal? A explicação para estas vozes é óbvia – é que a Comissão Europeia não tem poderes suficientes, precisa de mais ainda.
Que tais vozes venham da Alemanha ou da França é até certo ponto compreensível – embora devessem ter aprendido com a História que as tentativas de eliminar Estados e centralizar poderes no nosso continente dão sempre péssimo resultado. Mas que oiçamos destas vozes em Portugal, vozes que aparentemente não conseguem perceber que quanto mais poder a Comissão Europeia detiver, mais nos considerará como a última das suas preocupações, é algo que não consigo entender e que para o qual considero difícil de encontrar uma explicação para além do tradicional provincianismo subserviente das elites portuguesas.
Nada disto tem a ver com necessidade de reforçar a cooperação europeia e mundial para fazer face à atual pandemia e a outras que no futuro certamente surgirão. Mas para tal não devemos reforçar a burocracia de que emerge a Comissão. O que necessitamos é de uma espécie de Organização Europeia da Saúde fora do âmbito dos tratados da União Europeia, com poderes em certos aspetos porventura mais efetivos que a OMS e que reúna países europeus voluntariamente, façam parte ou não da União Europeia.
Um dos erros dramáticos do processo de integração europeia, que atravessa um período de indisfarçável decadência, foi copiar o modelo americano, tentando criar um estado europeu que reunisse poderes em todos os sectores.
A saúde não pode ficar refém desta destruidora perspetiva ideológica: por isso, poderes para a Comissão Europeia na área da saúde, não. Uma Organização Europeia da Saúde fora da União, sim. De outra forma, a Saúde entrará na permanente confusão das negociações europeias em que tudo está sempre em cima (ou abaixo) da mesa e quando mal nos precatamos estamos a trocar vidas humanas por importação de parafusos.